Premiado drama multimídia sobre travesti reabre temporada em SP

Cena de ‘Luis Antonio – Gabriela’, de Nelson Baskerville: drama familiar e redenção em espetáculo emocionante (©Bob Sousa/divulgação) Quando o dramaturgo Nelson Baskerville teve a ideia de transformar a história […]

Cena de ‘Luis Antonio – Gabriela’, de Nelson Baskerville: drama familiar e redenção em espetáculo emocionante (©Bob Sousa/divulgação)

Quando o dramaturgo Nelson Baskerville teve a ideia de transformar a história de sua família e do irmão mais velho que abusou dele, iniciando-o na vida sexual e teve uma vida marcada pela violência e pela busca pela liberdade, em pleno regime militar, provavelmente não imaginava que essa história seria capaz de arrebatar tanto as pessoas. É justamente o que acontece com o belíssimo espetáculo multimídia “Luis Antonio – Gabriela”, agora em cartaz no Teatro João Caetano, em São Paulo, até 14 de outubro.

O espetáculo se vale de muita expressão corporal (fruto do trabalho da coreógrafa Ondina Castilho), de um elenco afinadíssimo e do uso de muitos recursos audiovisuais e sonoros, com destaque para os atores cantando, dançando e tocando vários instrumentos no palco. Ele acompanha as histórias de Nelson e Luis Antonio desde os respectivos nascimentos, entre os quais há uma distância de oito anos, passando pelas respectivas experiências sexuais, de violências domésticas praticadas pelo pai de ambos – numa das passagens mais tensas e belas do espetáculo –, até chegar ao encontro de Luis Antonio, já com o codinome Gabriela devidamente adotado na Espanha, país no qual acabou falecendo em decorrência da AIDS e do consumo de drogas.

Day Porto está deslumbrante como Luis Antonio, ou Gabriela, o travesti que passa a juventude em Santos (SP) até se mudar para a Espanha, aos 30 anos, levando muitos espectadores às lágrimas em vários momentos. O mesmo acontece com Marcos Felipe, Verônica Gentilin, Virginia Iglesias e Lucas Beda.

Num cenário extremamente funcional, com várias seringas e balões de oxigênio suspensos, acompanhado por monitores de televisão e um telão ao fundo, além de camas e mesas, encanta no espetáculo a grande variedade de recursos cênicos e audiovisuais utilizados para contar essa história. Há desde frases construídas com bexigas até vários detalhes das expressões dos atores sendo flagrados em tempo real por uma câmera digital, cujas imagens são projetadas no fundo do palco.

As surras tomadas por Nelson, por exemplo, são marcadas por gritos, mas também por uma música estridente e pelo corte abrupto de folhas de papel. Igualmente enriquecedores são os depoimentos de Nelson Baskerville projetados no telão e a quando as telas reproduzem o clima do museu Guggenheim, na Espanha.

Nenhuma dessas cenas teria o mesmo impacto sem o caprichado trabalho de iluminação, assinado pelo próprio Baskerville e por Marcos Felipe. Aliás, o dramaturgo também fica responsável pela direção, pelos cenários e adereços (assinados com o mesmo Marcos Felipe) e pelo projeto gráfico (com Sandro Debiazzi e Lucas Beda). No final da apresentação, há uma comovente interpretação coletiva do clássico “Your Song”, de Elton John, mais uma pérola da direção musical de Gustavo Sarzi.

“Luis Antonio – Gabriela” comprova como é possível ser criativo e original no teatro – mesmo remetendo a uma linguagem multimídia cara ao teatro brasileiro das décadas de 70 e 80, época em que a videoarte se tornava forte no país. E, com isso, emocionar os espectadores e, a partir de então, se tornar um referencial importante para quem admira a arte dramatúrgica nacional.

Por isso, são mais do que merecidos os prêmios de melhor espetáculo de 2011, pela APCA, e o de melhor direção no Prêmio Shell, entre outros.

Serviço
Peça “Luis Felipe – Gabriela” – Teatro João Caetano – quinta a sábado, às 21h; e domingo, às 19h. Até 14/1
Ingressos – R$20
Teatro João Caetano – Rua Borges Lagoa, 650. Vila Clementino. T: (11) 5573-3774

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