Moto na água e um retrato das enchentes em São Paulo

O porteiro Edilson José da Silva perdeu o dia de trabalho e teve de pagar o conserto da moto (Foto: Lucas Duarte Souza) Há 44 dias, São Paulo (SP) assiste […]

O porteiro Edilson José da Silva perdeu o dia de trabalho e teve de pagar o conserto da moto (Foto: Lucas Duarte Souza)

Há 44 dias, São Paulo (SP) assiste a cenas parecidas. Nesta quinta-feira (4), mais da metade dos 30 pontos de alagamentos constatados pelo Centro de Gerenciamento de Emergências (CGE) da prefeitura não permitia o tráfego de veículos.

A elevação das águas não escolhia bairros. No Ipiranga, na região do Aricanduva, nas zonas norte e oeste, no extremo leste ou sul. Sobretudo quem precisa se deslocar nas proximidades das marginais nunca sabe se vai conseguir honrar seus compromissos.

Na quarta-feira (3), a imprevisibilidade atingiu também as estações de metrô, lotadas e sem condições de operação. Carros e motos tentavam atravessar avenidas convertidas em rios.

Nas cenas flagradas na avenida Cruzeiro do Sul, zona norte, dois motoqueiros com água na altura dos joelhos tentavam em vão vencer a força das águas.

Edilson José da Silva saiu de casa na zona leste rumo ao prédio onde trabalha como porteiro na zona norte. De moto, conseguiu desviar de alguns pontos de alagamentos pelo caminho, mas parou na esquina das avenidas Cruzeiro do Sul e Zaki Narchi, no bairro de Santana.

“Ninguém passava daquele lugar, eu tentei e a água cobriu o motor da moto”, lamentou.

Edilson decidiu deixar o veículo quebrado em um estacionamento, até poder voltar para consertá-la. “Eu tinha R$ 8 para pegar o metrô e um ônibus para voltar para casa; demorei duas horas para chegar”, relata. “Ainda fiquei envergonhado de andar de metrô com a minha capa molhada, todo mundo olhando”, desabafa.

Foto: Lucas Duarte Souza

O porteiro ainda teve tempo para ser solidário: “Tinha uma mulher chorando desesperada com água entrando no carro. O carro estava ligado, mas ela não conseguia sair do lugar. Ajudei a moça a estacionar em um lugar seco”.

Também sobre duas rodas estava Wilfen Tony. Motorista de uma empresa de alarmes, ele usa a moto para ir ao trabalho. “Todos os dias eu enfrento alagamentos para voltar para casa”, resigna-se. Morador da zona leste, ele garante que, por fazer sempre o mesmo caminho e conhecer todos os bueiros e bocas-de-lobo, não tem medo de tanta água.

“Fico preocupado com a minha mulher que está grávida e trabalha em um lugar que também alaga”, diz Tony, que admite: quando está com o carro da empresa, não se arrisca a enfrentar os alagamentos.

Foto: Lucas Duarte SouzaFoto: Lucas Duarte Souza