Desenvolvimento em foco

Desafios dos novos empreendedores diante da crise e da pandemia

No empreendedorismo, a pressão pelo equilíbrio entre a vida cotidiana e a sobrevivência de uma empresa “recém-nascida” acaba sendo maior do que o normal

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No mundo do empreendedorismo, sempre há desafios, principalmente, no início de um negócio. Além disso, a situação econômica atual e os reflexos da pandemia resultaram em um cenário diferente do que se conhecia antes da covid-19. Tratei deste tema em nota técnica da 19ª Carta de Conjuntura do Observatório de Políticas Públicas, Empreendedorismo, Inovação e Conjuntura da Universidade Municipal de São Caetano do Sul (Conjuscs) – acesso aqui.

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O Brasil, que ocupava o quarto lugar em taxa total de empreendedorismo, caiu para a sétimo. Segundo o relatório da do Monitor Global de Empreendedorismo, o GEM 2020, em estudo realizado pelo Sebrae e o Instituto Brasileiro de Qualidade e Produtividade (IBPQ), com a crise gerada principalmente pela pandemia da covid-19, a taxa de empreendedorismo total no país caiu em mais de 18%, em relação ao ano de 2019.

A mesma pesquisa mostrou que a queda mais marcante foi a dos empreendedores estabelecidos (aqueles com mais de 3,5 anos de operação), passando de 16,2% para 8,7%, o que representa uma redução de quase 50%. Por outro lado, a taxa de empreendedorismo inicial (aqueles com até 3,5 anos de operação) apresentou um ligeiro aumento, passando de 23,3% para 23,4%. Entende-se que o resultado foi motivado pela queda dos empreendedores estabelecidos, que teriam fechado suas operações com a crise.

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Se, por um lado, com o avanço das tecnologias, as empresas e conexões estão muito mais on-line, por outro, a concorrência aumentou. Como mostra o estudo, são novos empreendedores buscando seu espaço, porém com uma queda significativa dos que já tinham seus negócios firmados há mais de três anos e meio (empreendedores estabelecidos).

Setor de serviços em transformação

Há um cenário de consumo em transformação. As entregas de supermercado e refeições cresceram. Por conta das restrições da pandemia, em 2020, passou-se a consumir muito mais esses serviços on-line, pelo site dos supermercados ou ainda por aplicativos de celular. Plataformas como Ifood e UberEats apresentaram um crescimento bastante significativo.

Segundo a Associação Brasileira da Indústria de Alimentos, o Ifood, maior foodtech do Brasil, teve seus pedidos quase triplicados em um ano. De 22 milhões, no começo do ano passado, chegaram a atingir 60 milhões de pedidos em março deste ano. A plataforma, inclusive, lançou uma fintech que já liberou mais 200 milhões em empréstimos a mais de 7 mil restaurantes parceiros, como forma de ajudar a minimizar a crise (ou manter a sobrevivência) vivida pelos restaurantes. Empresas como Rappi e Ebanx também têm atuado com iniciativas semelhantes.

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Apesar da comodidade do pedido on-line, as pessoas têm o desejo de voltar aos locais de forma presencial, restaurantes, comércios etc., mesmo que ainda haja dúvidas sobre o melhor momento para isso.

Essa volta já pode ser percebida, mesmo que de forma lenta. Com o aumento da vacinação, foi constatado um aumento no setor de serviços de 1,1% em julho deste ano, em comparação a junho, revelando alta de 17,8% se comparado ao mesmo mês de 2020.

Com diversas formas de atendimento e logística disponíveis, mas ainda incertezas nos rumos da economia, o empreendedor tem dúvidas sobre qual é o melhor caminho, se ter um comércio atuando de forma on-line ou com espaço físico, ou, ainda, que atenda das duas formas. São pontos que precisam ser analisados e decididos de forma criteriosa ainda mais do que antes da pandemia, tanto pela questão financeira, quanto pela instabilidade do mercado.

Empreendedorismo e o “novo normal”

Outra questão importante a destacar é que, com a pandemia e seus impactos em vários aspectos na vida de todos, esses empreendedores têm de se adaptar a um cenário diferente do que conheciam também em seu modo de vida. O sistema home office ampliou-se de forma rápida, pois as pessoas tiveram de adaptar seu trabalho, ou a falta dele, ao dia a dia em casa, com a família, com isolamento social, novas dinâmicas adotadas no trabalho, nas escolas dos filhos. Ao mesmo tempo, precisam se adaptar aos compromissos exigidos para o seu negócio, dos quais o empreendedor deve vários papéis (ou todos eles).

Ao empreendedor, a pressão pelo equilíbrio entre a vida cotidiana e a sobrevivência de uma empresa “recém-nascida” acaba sendo maior do que o normal, pois precisa administrar seus compromissos com clientes, o desenvolvimento de sua empresa em diversos aspectos, além de encarar vulnerabilidades antes não conhecidas.

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Para estes futuros empreendedores, uma contribuição muito importante é a do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), um dos principais órgãos que pode dar auxílio nesta fase, com cursos, plantões de atendimentos, consultorias entre outros serviços. Com a pandemia, além do serviço que o Sebrae já vinha oferecendo, em uma parceria com o Conselho do Varejo da Associação Comercial de São Paulo, ACSP, foram abertas, em julho deste ano, 700 vagas de consultoria para empreendedores. A oportunidade consiste na visita de um profissional de negócios e inovação para fazer um diagnóstico das empresas, mostrando os caminhos para melhorias, e os procedimentos a adotar para que atinjam melhores resultados. O projeto visa contribuir no faturamento das empresas, elevar os ganhos financeiros dos prestadores de serviços e tornar as empresas mais fortes para competir no mercado.


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Além disso, seja por necessidade ou ainda buscando atender à grande demanda de informações por pessoas que estão iniciando seus negócios, há um grande número de profissionais que “vende conhecimento”. Cursos, mentorias e palestras nas áreas de autoconhecimento, desenvolvimento humano, passando por equilíbrio emocional, corporal e espiritualidade, têm sido muito buscados.

Esses serviços, de forma paga ou não, ajudam o empreendedor a se desenvolver, unindo sua criatividade e talento a novas e importantes habilidades, para que se torne apto a promover seus negócios, divulgar, entender como cuidar das finanças, logística, divulgação, entre outros aspectos.

É importante que o novo empreendedor hoje busque profissionais que já atuam na sua área de interesse, vivenciaram experiências junto ao mercado e possam ajudá-lo, mostrando os melhores caminhos. Assim, a chance de sobreviver no mercado e ter sucesso tende a aumentar.

Os desafios para aqueles que buscam iniciar-se no empreendedorismo cresceram. Por outro lado, há programas de incentivo e de ajuda, além de conhecimento disponível para quem inicia este processo, motivado tanto pela demanda de empreendedores que necessitam dessa “ajuda”, quanto por profissionais de diversas áreas (vendas, logística, finanças, estratégias de divulgação) que buscam recolocação profissional atuando com estes serviços.

Sempre que este empreendedor buscar mentores ou conselhos, é importante que isso seja feito com pessoas que já tenham passado e vivido o problema e que, assim, possam passar conhecimento com valor agregado a ele.


Luiz Lopes Schimitd é administrador graduado pela Universidade Anhembi-Morumbi com MBA em Gestão de Processos pela FGV. Diretor do Grupo Schimitd Segurança e Serviços, presidente do Instituto de Tecnologia de São Caetano do Sul e Pesquisador Convidado do Observatório Conjuscs

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