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Quem paga as pesquisas de opinião que influenciam os eleitores?

The Intercept expôs a fraude na edição de pesquisa do Datafolha; Folha de SP manipulou a edição para fazer parecer que Michel Temer detinha legitimidade no cargo

Reprodução/GGN

Pesquisa apontava que 60% da população queria novas eleições; Folha manipulou o resultado

Pela primeira vez, partidos e candidatos colocaram em prática as mudanças na legislação eleitoral que reduziram o tempo útil de campanha para 45 dias e deixou de fora o financiamento privado. O resultado disso, na avaliação da professora de opinião pública e pesquisadora eleitoral da pós-graduação da FESPSP, Jacqueline Quaresemin, foi uma disputa mais “empobrecida”, com “crescimento vertiginoso” do número de eleitores que não quiseram ou não conseguiram escolher um nome para ocupar as prefeituras espalhadas pelo país.

Só em São Paulo, o volume de eleitores que votou branco ou nulo ou simplesmente deixou de comparecer às urnas (abstenção) supera o montante angariado pelo prefeito eleito João Doria (PSDB) no primeiro turno. Foram 3,085 milhões de votos válidos no tucano, ante 3,96 milhões que não foram computados para nenhum candidato.

Para Quaresemin, o tempo curto de campanha e a escassez de recursos dificultaram a vida do eleitor na hora da escolha. O fator alterações na regra do jogo associado a campanha de desconstrução da política e criminalização de partidos pela velha mídia ajudam a explicar o salto de 28%, em 2012, para 34,84%, em 2016, na soma de brancos, nulos e abstenções na capital paulistana, avaliou.

Nesse cenário, três ingredientes ganham corpo e podem ser definitivos para a vitória de um candidato em detrimento de outro: as coligações que garantem tempo de propaganda na TV; o marketing eleitoral, que tenta romper com a rejeição e talhar o bom desempenho dos postulantes em debates televisivos e as pesquisas de opinião.

Em entrevista a GGN na última segunda (3), Quaresemin lembrou que, no caso de São Paulo, embora todas as pesquisas indicassem o crescimento de Doria, nenhum instituto conseguir antecipar sua vitória logo no primeiro turno.

Mas tão interessante quanto analisar os resultados das urnas traçando um paralelo com a eficácia das pesquisas, disse Quaresemin, é buscar compreender o impacto e o papel político dessas sondagens.

“Quando você tem um candidato crescendo e na frente nas pesquisas, as pessoas indecisas têm duas possibilidades: ou ela votam em quem está na frente ou, não se identificando com este candidato, votam branco e nulo. Para entender os objetivos dessas pesquisas é preciso observar quem paga por elas, quais são seus objetivos, como são elaborados os questionários para coleta desses dados, entre outras questões”, sugeriu a especialista.

Um caso alarmante de manipulação de questionário com fins políticos foi protagonizado pelo Instituto Datafolha. Como o GGN mostrou em julho, todas as vezes em que a empresa foi a campo, contratada pela Folha de S. Paulo, para aferir a popularidade de Dilma Rousseff em meio ao processo de impeachment e perguntar ao entrevistado se ela deveria ser derrubada pelo Congresso, o motivo usado foi político, a operação Lava Jato, e não técnico, o suposto crime de responsabilidade fiscal. (Leia mais aqui)

Quaresemin chamou atenção para a possibilidade de inexistir isenção em torno da publicação das pesquisas, na maioria das vezes contratadas por veículos de comunicação que pautam diariamente o noticiário, alternando-se entre blindar e colocar na berlinda um ou outro governante, o que influencia na popularidade aferida nos estudos. “Os mesmos institutos que avaliam as administrações são os que fazem as pesquisas eleitorais. Mas quais têm isenção, de fato, para apresentar os resultados?”, indagou.

Quando o The Intercept, com ajuda de blogs independentes, expôs a fraude na edição de pesquisa do Datafolha pelo seu contratante, a Folha de S. Paulo, escancarou-se a falta de isenção do veículo em relação ao atual governo. O jornal manipulou a edição para fazer parecer que Michel Temer detinha legitimidade no cargo, enquanto quase 60% da população, de acordo com a sondagem, indicaram que não, que preferiam novas eleições.