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Dos indignados a Syriza e Podemos; do grito à perspectiva de poder

A passagem dos indignados e dos movimentos “ocupe” para Syriza e Podemos representa o amadurecimento da resistência ao neoliberalismo e a luta pela construção de alternativas à Europa contemporânea

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Movimentos Grécia e Espanha representam avanços em ausência de projeto de protestos do início da década

O modelo neoliberal promoveu um profundo processo de mercantilização das nossas sociedades e do próprio Estado. Tratou de transformar os direitos em temas de mercado. Busca que tudo tenha preço, que tudo se venda, tudo se compre

Atacou a esfera pública, que é a esfera dos direitos, dos cidadãos, buscando impor a centralidade da esfera mercantil, a esfera dos consumidores, das mercadorias. A centralidade do mercado significa conversão de direitos em mercadorias, enfraquecendo o papel dos cidadãos em favor do consumidores. Compram-se educação, saúde, cultura, que deixam de ser direitos. O império do dinheiro é o responsável pelo aprofundamento das desigualdades no mundo contemporâneo.

Na América Latina a luta antineoliberal também começou pela resistência diante da avalanche ideológica, econômica, social e política do neoliberalismo. Era indispensável conter essa ofensiva, defendendo os direitos das pessoas, o papel do Estado, a proteção do mercado interno, do emprego, dos salários.

Assim se deu a luta, especialmente nos anos 1990, até que começaram a surgir governos que se propunham a superar esse modelo, governos pós-neoliberais. O que caracteriza a esses governos, que conseguiram fazer com que vários países da região – a mais desigual do mundo – tenha diminuído a desigualdade, a pobreza, a miséria, mesmo no meio da mais profunda e prolongada crise que o neoliberalismo gerou em escala mundial?

Países como Brasil, Argentina, Venezuela, Uruguai, Bolívia, Equador, têm em comum, antes de tudo, a centralidade das políticas sociais. Mesmo quando são necessários ajustes das contas publicas, para controlar a inflação, por exemplo, isso não é o centro das políticas desses governos que implementam a prioridade das políticas sociais. Desenvolvem modelos de desenvolvimento econômico com distribuição de renda, ampliando o mercado interno de consumo de massas.

São políticas de diversas características, mas nenhuma distribui mais renda que a extensão dos empregos formais e o aumento dos salários acima da inflação. Mas como muita gente está fora do mercado formal de trabalho, políticas como as do bolsa família no Brasil se estenderam e têm um papel complementar importante no resgate social de grande parte da população.

Além disso, resgataram o papel ativo do Estado, como indutor do crescimento econômico, de garantia a direitos sociais recuperados e como ator político internacional. Porque o terceiro aspecto dos governos pós-neoliberais foi a prioridade dos processos de integração regional e os intercâmbios Sul-Sul, em vez dos Tratados de Livre Comércio com os Estados Unidos.

A partir desses três aspectos, as forças antineoliberais conseguiram passar da resistência à construção de alternativas, da oposição à construção de forças hegemônicas de superação do modelo neoliberal. O processo que vive a Europa, com a vitória eleitoral do Syriza na Grécia, com o fortalecimento do Podemos na Espanha, parece atuar de maneira similar – com um amadurecimento das forças sociais de resistência em direção à construção de alternativas concretas ao neoliberalismo, disputando a hegemonia em nível nacional nos seus países.