O caso Polanski, aliás, Samantha Gailey

A situação não está fácil para Polanski, mas a história levanta muitas interrogações (Foto: Arnd Wiegmann/Reuters) Na mídia mundial, muito se tem falado sobre “o caso Polanski”. Mas o caso, […]

A situação não está fácil para Polanski, mas a história levanta muitas interrogações (Foto: Arnd Wiegmann/Reuters)

Na mídia mundial, muito se tem falado sobre “o caso Polanski”. Mas o caso, na verdade, deveria ser chamado de “Samantha Gailey”. E não é simples para ninguém.

Em 1977 o cineasta franco-polonês Roman Polanski foi detido e levado a julgamento sob várias acusações, que podem ser resumidas como prática de sexo com uma menor de idade, e sem o consentimento dela. No fim de setembro, 32 anos depois, ele foi detido na Suíça, quando ia receber um prêmio pelo conjunto de sua obra no Festival de Cinema de Zurique, a pedido da Promotoria de Los Angeles, nos Estados Unidos, onde o crime ocorrera.

A situação não está fácil para Polanski, pois a acusação é grave, e partamos do princípio de que todos devem ser iguais perante a lei. Portanto, ele deve ser julgado pelo que praticou. Mas a história levanta muitas interrogações.

Polanski e seus advogados alegam que em 1978, quando o caso entrou de fato em julgamento, a defesa fez um acordo com a promotoria: ele reconheceria parte das acusações, e em troca receberia uma pena menor. Assim aconteceu, mas na hora h, alegam os defensores, Polanski e eles receberam sinais de que o acordo seria rompido. Por isso, no dia da promulgação da sentença, ele fugiu dos EUA, e nunca mais voltou.

Se a história for confirmada, fica a pergunta: por que se teria feito o acordo? Por que ele foi rompido?

Outra pergunta incômoda: Polanski, que mora na França, tem uma casa de férias na Suíça, que ele frequentava. Provavelmente ele se sentia protegido por sua cidadania francesa, já que a França não tem tratado de extradição com os EUA. Por que só foi detido agora, e não antes, se o mandato de prisão internacional fora pedido pela Promotoria dos EUA há pelo menos sete anos? As autoridades responsáveis na Suíca, do Departamento Federal de Justiça, alegam que dessa vez sua visita fora “publicamente anunciada”. O argumento não é muito consistente, convenhamos.

Mais ainda: na edição de 21/10, o jornal inglês The Guardian revela (entre outros), com base em documentos da Associated Press, nominadamente e-mails trocados entre as autoridades suíças e as norte-americanas, que foram aquelas que advertiram estas da visita iminente de Polanski. Porque isso aconteceu? O tema é relevante, porque há um contencioso e uma tentativa de resolve-lo entre a Suíça e os Estados Unidos sobre sonegadores de impostos (são milhares, e zilhões de dólares) deste país que buscaram refúgio naquele. Qual o novo estatuto da relação/colaboração entre a Suíça e os Estados Unidos nesse caso? Valerá isso para os outros também?

Mas o lado mais complicado fica por conta da vítima, a menina de 13 em 1977 e hoje em vésperas de completar 45 anos, Samantha (então) Gailey, que hoje vive no Havaí com a a família. Naturalmente ela  continua dizendo que o que Polanski fez com ela foi uma violência, embora ela o tenha praticamente perdoado, ao dizer que ele já “pagou” pelo que fez.

Mas, diz ela, o que realmente arrasou com sua vida na ocasião foi a publicidade escandalosa que a mídia deu ao caso por um ano, inclusive com detalhes do que acontecera entre os dois. Esse tratamento já está se repetindo agora, e certamente vai se intensificar nos próximos meses, caso a extradição e o novo julgamento se confirmem. A vítima de 1977 vai ser violentada de novo em sua privacidade, e dessa vez não pelo cineasta conturbado de então, mas pela mídia sensacionalista de hoje – que, assim como em 1977 – também não irá a julgamento desta vez.