Opinião

Aécio sofre com fogo amigo de perguntas em TV ligada a Alckmin

Perguntas incômodas contra tucanos são raras no programa Roda Viva, pois TV Cultura é controlada pelo governo peessedebista de São Paulo

PSDB/CC

Aécio quer que as eleições ocorram a cada cinco anos, mas não apresenta propostas de participação popular

O senador e pré-candidato à presidência da República Aécio Neves (PSDB-MG) parece não ter entendido o recado das ruas sobre a emergência de uma reforma política transformadora, com participação popular. Em entrevista ao programa Roda Viva, da TV Cultura, o tucano afirmou que, se for eleito presidente, proporá eleições de cinco em cinco anos, sem reeleição e com a coincidência de mandatos municipais e nacionais, mas para vigorar só a partir de 2022.

Ele admite que não pode prorrogar mandatos em vigor, portanto teria de implementar para as eleições seguintes, mas Aécio disse que, se eleito, não abriria mão de tentar a reeleição em 2018. Portanto, as mudanças só vigorariam a partir de 2022. Cômodo, não? Fazer mudanças só para os outros seguirem.

Curioso notar que tal mudança exige uma emenda à Constituição que passa pelo Legislativo, justamente onde ele está desde 2011, quando foi empossado senador. Se tem convicção do que diz, por que não apresentou uma proposta de emenda constitucional ao Congresso até hoje?

Mais curioso é observar que Aécio Neves estaria desfazendo tudo o que ele fez nos anos 1990. A Constituição de 1988 havia definido o mandato em cinco anos sem reeleição. Com apoio do PSDB e voto do então deputado Aécio Neves, o mandato foi reduzido para quatro anos sem reeleição durante o governo Itamar Franco.

Logo após o PSDB assumir o poder, em 1995, o então presidente Fernando Henrique Cardoso tomou a iniciativa de patrocinar a emenda da reeleição para ele próprio concorrer. De novo, o então deputado Aécio Neves votou a favor. Convenhamos que não há coerência nenhuma no que o senador propõe agora e no que fez no passado.

Outra proposta que falta combinar é se o povo quer ficar cinco anos sem votar. Isso, sem propor nenhum mecanismo de participação popular. Também propôs o voto distrital misto e cláusulas de barreira para os partidos. De novo, sem nenhuma proposta de consulta popular.

O programa Roda Viva costuma ter uma bancada bastante simpática aos tucanos paulistas, mas chegou a fazer algumas perguntas incômodas ao senador mineiro. Três jornalistas perguntaram sobre drogas. A primeira pergunta, de Ricardo Setti, da revista Veja, foi sobre rumores na internet. Pareceu ter como objetivo dar uma oportunidade para o tucano exorcizar o tema.

Em seguida, Fernando Rodrigues, do jornal Folha de S. Paulo, perguntou sobre as divergências entre a posição proibicionista às drogas que o senador tucano tem declarado e as posições pela descriminalização defendidas por Fernando Henrique Cardoso e pelo pré-candidato ao governo de Minas, Pimenta da Veiga. Aécio confirmou a divergência e disse optar pela repressão.

Fernando Barros e Silva, da revista Piauí, foi mais incisivo. Lembrou que o senador, em entrevista à Folha, havia admitido ter fumado maconha aos 18 anos e que depois parou. Disse haver insinuações de que ele fora usuário de cocaína. O senador respondeu que jamais, mas se irritou com a pergunta, dizendo que um jornalista qualificado não deveria repercutir rumores.

Barros e Silva explicou que a pergunta não se baseava apenas em rumores na internet, citando outros casos, como um jogo Brasil e Argentina, no Mineirão, quando a torcida gritava o nome do senador o associando à droga, e também um artigo de José Serra dizendo que o “debate sobre o consumo de cocaína no Brasil pode e deve ser uma pauta em 2014”, visto como uma indireta na mesma semana em que Aécio havia lançado candidatura. O senador tucano insistiu e disse que, se não há uma acusação, o jornalista não deveria dar vazão a rumores.

Um deslize de Aécio foi faltar com a verdade ao tentar culpar petistas por noticiarem o fato verídico de um processo por improbidade administrativa envolvendo suposto desvio de função de verbas da saúde em Minas Gerais. O senador afirmou que o processo estava extinto. Não está. Ele foi reativado em 21 de maio de 2014.

Essas perguntas incômodas contra tucanos são raras no programa Roda Viva, pois a TV Cultura é controlada pelo governo também peessedebista de São Paulo. O episódio gera dúvidas sobre até que ponto Geraldo Alckmin está empenhado na candidatura de Aécio Neves. Nas eleições de 2006, quando Alckmin foi candidato à Presidência, o grupo do governador paulista reclamou da falta de empenho em Minas Gerais.