Campanha do Idec

Consumidores apontam racionamento e queda da qualidade da água em São Paulo

Segundo levantamento feito pelo Idec com usuários do Sistema Cantareira, 73% dos relatos revelam acusam corte diário de fornecimento e 57% notam comprometimento da qualidade da água

Vagner Campos/GESP (31/3/2014)

Desde abril governador oferece bônus por economia; Sabesp nega racionamento, mas faz corte de fornecimento

São Paulo – O racionamento de água é uma realidade em São Paulo, segundo o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec). Desde o final de junho o Idec desenvolve uma campanha de coleta de informações junto a usuários atendidos pela Sabesp. O levantamento constatou que 73% dos relatos enviados acusam falta de água em suas residências diariamente, o que contraria a versão oficial da gestão Geraldo Alckmin (PSDB), de que não há corte nem necessidade de oficializar um racionamento. A zona oeste da capital seria a região mais afetada, com 27% dos relatos.

Ontem (29), o Idec enviou carta à Agência Reguladora de Saneamento e Energia do Estado de São Paulo (Arsesp) apresentando os dados já recebidos, antes mesmo de encerrar a campanha “Tô sem água”, prevista para se estender até amanhã (31). A carta foi encaminhada também ao governador e à Sabesp. O objetivo da campanha é mapear as localidades que estão sendo alvo de um racionamento não declarado por parte do governo. A denúncia junto à agência reguladora reforça o pedido feito pelo Ministério Público Federal para que o estado oficialize o procedimento.

Tanto o órgão público como a entidade de consumidores entendem que a formalização do racionamento seria mais adequado e transparente no trato da crise de abastecimento, uma vez que exigiria um “rodízio de corte de fornecimento” – tal qual está ocorrendo mais em algumas localidades – de maneira equânime entre todos os bairros.

Ontem, a companhia de saneamento do estado se negou mais uma vez a seguir a orientação. “Embora reconheça a importância institucional do MPF, com o qual sempre colabora, a Sabesp discorda frontalmente da imposição de um racionamento. A medida penalizaria a população e poderia produzir efeitos inversos daqueles pretendidos pelos procuradores. São Paulo preferiu enfrentar de forma organizada a maior estiagem de sua história”, disse a companhia, em nota.

O nível nos reservatórios do Sistema Cantareira continua em queda e se aproxima de 15% da capacidade de armazenamento, já levando-se em conta a utilização do volume morto. Há um ano, o Cantareira trabalhava com 53,7% da sua capacidade total. O sistema atende 9 milhões de habitantes na Grande São Paulo e 5 milhões de pessoas nas bacias dos rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí. Um estudo encomendado pelo Consórcio Intermunicipal das Bacias dos Rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí, que representa essas cidades do interior e elaborado pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), mostrou que o volume do Cantareira pode secar totalmente em menos de 100 dias. O MPF se baseou nos resultados dessa pesquisa para fazer a recomendação de racionamento ao governo estadual.

O professor Antonio Carlos Zuffo, do Departamento de Recursos Hídricos da Unicamp, responsável pela pesquisa usada pelo MPF, disse que acompanhou a situação dos reservatórios do sistema e alerta para a possibilidade de atraso no início do período de chuvas este ano. “Não se pode garantir que [as chuvas] voltam em outubro. No ano passado, ela só veio na segunda metade de dezembro. Foram só 15 dias de chuvas normais no ano passado. Não sabemos se [neste ano] vai voltar com normalidade ou se vai atrasar”, disse o especialista.

O Idec, por sua vez, informa que a pesquisa iniciada junto aos consumidores tem a finalidade de dar suporte ao processo de investigação iniciado pela Arsesp para apurar se está havendo racionamento em determinadas localidades. “Acreditamos que os dados serão extremamente importantes para ajudar a agência concluir o mais rápido possível a investigação”, afirma em nota a advogada do Idec Claudia Almeida, responsável pela campanha.

Até a última segunda-feira (28) foram registrados 494 relatos, dos quais 74% afirmam que falta água à noite, 9% de manhã, outros 13% durante o dia e a noite e 5% somente à tarde. A frequência da falta de água ficou distribuída assim: todos os dias, uma vez por dia, 73%; mais de uma vez por semana, 17%; mais de uma vez por dia, 5%; uma vez por semana, 3%; uma vez por mês, 1%.

As regiões mais afetadas são: zona oeste (27%), norte (23%), sul (18%), leste (24%) e Grande São Paulo (8%). Outro dado “alarmante”, segundo Idec, é que 57% dos participantes percebem comprometimento na qualidade de água.

“A falta de água tem sido um fato notório e a necessidade de ser declarado o estado de racionamento é imprescindível, pois o abastecimento de água é um serviço essencial e deve ser tratado com prioridade pelo estado e em total respeito aos direitos que regem a adequada prestação de serviço, como o direito à informação, direito a transparência e tratamento igualitário”, reforça Claudia.