Energia solar

Bolsonaro ‘lava as mãos’ ao não interferir na decisão da Aneel

Gigantes do setor energético têm influência na agência e no Congresso, que votará projeto prometido pelo presidente. Para parlamentar, pressão social será decisiva

Reprodução/Ecodebate/PR
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Bolsonaro insiste que não haverá fim do incentivo à energia solar. Mas não toma medidas concretas nesse sentido

São Paulo – Ao insistir que o Congresso aprovará lei para manter os atuais incentivos à geração de energia solar produzida por placas instaladas em residências e empresas e compartilhada com a rede local – a chamada geração distribuída, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) está, na verdade, ‘lavando suas mãos’ sobre o fim dos benefícios defendido pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).

Ao mesmo tempo em que se posiciona publicamente de maneira aparentemente contrária a taxação, sinaliza aos empresários do setor elétrico que não vai intervir na decisão da agência reguladora. A opinião é do deputado federal Nilto Tatto (PT-SP), titular da Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável.

“Bolsonaro demonstra para a sociedade que é contra e que vai trabalhar por um projeto para proibir. Mas não toma atitude concreta no sentido contrário à taxação que a Aneel está propondo justamente com base em um parecer da equipe econômica”, disse.

Bolsonaro falou pela primeira vez sobre o tema no último domingo, quando se colocou contrário a qualquer taxação da energia solar. “No que depender de nós, não haverá taxação da energia solar. E ponto final. Ninguém fala pelo governo a não ser eu, sobre essa questão. Não me interessa pareceres de secretários, seja quem for”, afirmou. Porém, emendou que a decisão final seria da Aneel. “É uma agência autônoma. Os seus interesses têm mandato e não tenho qualquer ingerência sobre eles”.

Grandes corporações

Tatto destacou que a agência é influenciada diretamente pelos interesses das grandes corporações do setor elétrico, seja da construção de infraestrutura, da produção e da distribuição de energia.

“É preciso entender que os técnicos que assinam parecer favorável à taxação integram o ministério que comanda a política econômica que privilegia essas grandes empresas. O parecer é uma proposta do governo Bolsonaro que atinge uma alternativa de produção de energia limpa, sem uso de combustíveis fósseis, que mobiliza toda uma cadeia do setor e também a comunidade preocupada com o meio ambiente”, destacou.

Segundo Tatto, há influências do setor também no Congresso. “Sempre que o tema é discutido, há grande mobilização de parlamentares que atuam de maneira silenciosa na defesa desses interesses. É mais ou menos como atuam os integrantes da bancada da mineração, que de maneira silenciosa estão a serviço de grandes companhias.”

Aparentemente em desvantagem em relação aos gigantes do setor elétrico hegemônico,  a cadeia da energia solar, com as empresas que produzem equipamentos, que atuam na instalação e manutenção, além de pequenos produtores dessa forma de energia e ambientalistas podem ganhar força se houver forte pressão popular.

“É preciso pressionar a Aneel, para que reveja a taxação, e também o congresso, pela aprovação de medida que mantenha os incentivos”, disse o parlamentar.

Taxação

De acordo com a Agência Câmara, o presidente da casa, deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), disse que vai pautar um projeto de lei para assegurar que não haverá taxação da energia solar produzidas em residências. E o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), também se manifestou a favor da manutenção dos benefícios.

Em 2012, durante o governo da presidenta Dilma Rousseff (PT), a Aneel editou a Resolução 482, que incentiva a instalação, pelos consumidores, de painéis fotovoltaicos para a geração de energia elétrica. Desde então, os produtores de energia solar podem usar a rede distribuidora da concessionária de energia para transmitir e armazenar o excedente gerado.  A diferença entre o consumo e a produção excedente é transformada em crédito, que pode ser usado para abatimento de uma ou mais contas de luz do titular. Além disso, esses produtores de energia têm isenção do pagamento de tarifas pelo uso da rede elétrica e de outros componentes da conta cobrados de todos os consumidores que “compram” eletricidade diretamente das empresas distribuidoras.

No ano passado a Aneel começou a revisar a resolução, que visa reduzir os incentivos. As atuais regras passam a vigorar até 2030 para o atuais geradores de energia solar. E os que implementarem a tecnologia após a nova resolução, prevista para este ano, terão de pagar o custo da rede.

Produtor rural em Peruíbe, litoral sul de São Paulo, Laerte Lourenço de Melo recorreu a uma linha de crédito oferecida pelo Banco do Brasil, o Pronaf Eco. Com o empréstimo no valor de R$ 60 mil, que será pago em 10 anos, ele instalou painéis no telhado de sua propriedade. Levando em conta os incentivos, seu custo com energia elétrica caiu consideravelmente. Uma conta que antes viria no valor de R$ 500, hoje é de R$ 50.

“Hoje vale a pena, mas se acabarem com os incentivos , as pessoas não vão investir na tecnologia, que vai tornar-se cara. Com isso a geração distribuída, que tem tudo para crescer – hoje representa cerca de 1% do total produzido – vai diminuir. Ficando só com as hidrelétricas, corremos risco de apagões”.

 

 

 

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