Ambientalistas aprovam propostas do Brasil, apesar de contradição interna

Riscos de retrocessos como revisão do código florestal brasileiro são ameaças para metas de redução de emissões do país

“Cabe à sociedade civil monitorar e exigir a implementação dos quatro eixos contemplados no Plano Nacional sobre Mudança do Clima”, iz Carmen Foro, da CUT (Foto: Jefferson Rudy/Sxc.hu)

Apesar de algumas críticas, as posições que o Brasil deverá anunciar durante a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas contam com a aprovação da maioria das organizações socioambientalistas brasileiras que pretendem marcar presença na capital da Dinamarca. O encontro teve início nesta segunda-feira (7) em Copenhague. Muito resta a fazer no plano interno, ressaltam os ambientalistas, mas o fato de o governo brasileiro assumir metas voluntárias em um encontro do porte da COP-15 já é um grande avanço.

“O Brasil sinalizou que, pela primeira vez, o assunto clima está na pauta das altas esferas governamentais e que a sociedade brasileira agora vai ter um número para cobrar do governo as medidas adequadas”, festeja Rubens Born, do Instituto Vitae Civilis, que acompanha de perto há duas décadas as negociações multilaterais estabelecidas pelo Brasil no que concerne às mudanças climáticas.

Born, no entanto, faz uma ressalva: “Do ponto de vista interno, as políticas ambientais no Brasil ainda são contraditórias. Ao mesmo tempo em que anunciamos metas para fora, em Copenhague, temos que conviver em Brasília com a apreciação do projeto de lei da senadora ruralista Kátia Abreu (DEM-TO), que é um grave retrocesso no Código Florestal e na legislação ambiental do país”, lamenta.

O fato de os principais nomes do governo federal vestirem a camisa ambiental também é comemorado pela secretária nacional de Meio Ambiente da CUT, Carmen Foro. “Houve, por parte do governo brasileiro, a iniciativa de envolver diversos segmentos da sociedade: os trabalhadores e trabalhadoras por meio das centrais sindicais, as ONGs, os empresários, o movimento social, a academia, entre outros. Foi uma construção coletiva da maior importância para subsidiar a posição brasileira nos debates e negociações junto à comunidade internacional”.

Carmen afirma que “cabe à sociedade civil monitorar e exigir a implementação dos quatro eixos contemplados no Plano Nacional sobre Mudança do Clima”, e cita temas como mitigação, vulnerabilidade, impacto e adaptação, pesquisa e desenvolvimento, capacitação e divulgação. “A inclusão de metas numa Política Nacional de Mudanças Climáticas torna essa importante política de governo uma política de Estado”, diferencia.

Liderança

A representante da CUT aposta no sucesso brasileiro em Copenhague. “A proposta brasileira foi muito ousada, visto que o Brasil não teria de apresentar metas a partir de Kyoto, pois sua industrialização foi muito tardia. Mas quando você tem uma sociedade civil que cobra, participa e um governo com um projeto de futuro para o país, o resultado é esse. O Brasil, ao assumir metas, chama para si a liderança. Uma liderança constituída regionalmente e que vem sendo reconhecida também internacionalmente. Penso que devamos avançar nas articulações, e, como país indutor do desenvolvimento com sustentabilidade, ser um exemplo a ser seguido pelos demais”.

“Somos favoráveis ao estabelecimento de uma meta nacional de redução de emissões, mas ficamos muito preocupados com a denúncia do Banco Mundial de que o cenário futuro das nossas emissões, que define as metas propostas, está superfaturado”, aponta Márcio Santilli, dirigente do Instituto Sociambiental (ISA). Ele afirma que as metas anunciadas pelo Brasil são factíveis desde que levadas a sério pelo governo. Precisamos avançar sem perder a seriedade. “Não havendo meta séria, não haverá um plano de ação crível que as considere. Seria prudente realizar uma auditoria técnica da proposta brasileira antes de consolidá-la em lei”, opina.

Coordenador do Greenpeace na Amazônia, Paulo Adário chama a atenção para a necessidade de se viabilizar os mecanismos internacionais de financiamento para o combate ao aquecimento global. “O que o Brasil irá reduzir em termos de emissões depende, é claro, de apoio internacional. O país precisa de recursos para mudar a matriz energética, a indústria e a agricultura. Os compromissos a serem anunciados em Copenhague são bons passos na direção certa, mas são insuficientes”.

Zerar o desmatamento

 

Adário garante que “o Brasil tem condições de zerar o desmatamento até 2015”, e afirma que já existe um plano que pode ser implantado. “Adiar para 2020, que está profundamente ligado à ação do Estado – já que a maioria do desmatamento é ilegal – é inaceitável. No meio do caminho entre zerar o desmatamento em 2015 e reduzir 80% em 2020 existem mais de dois bilhões de árvores”, afirma.

O ambientalista aponta um detalhe na proposta brasileira. A curva das emissões está em ascensão e o país quer levá-la para baixo. “Isso depende do grau de referência que se usa. A promessa brasileira está baseada num crescimento de 5% a 6% do PIB por ano daqui até 2020, o que não é necessariamente o que pode acontecer, pois o Brasil nunca teve um crescimento contínuo nessa margem. Assim sendo, não será difícil para o Brasil cumprir esse compromisso de 38%”, opina.

Para Adário, o mais importante nesse momento, no entanto, é o gesto político feito pelo Brasil para destravar as negociações climáticas. “É uma sinalização importante para os países similares, em desenvolvimento acelerado como o Brasil. É um desafio para países como China, Índia e Indonésia, que estão numa situação parecida e, embora não sejam obrigados, têm de assumir metas porque somente a redução das emissões dos países ricos não vai resolver o problema da preservação do clima. É uma sinalização positiva de um país que está assumindo um papel de liderança mundial muito grande. A economia faz com que o Brasil esteja confortável para assumir esse papel de liderança”.