Emir Sader

Equador caminha para segundo turno tenso, com favoritismo da esquerda

Candidato do presidente Rafael Correa está a 0,82 ponto de vencer no primeiro turno. Esquerda garante maioria no Congresso e referendo aprova proibição a agente público ter dinheiro em paraíso fiscal

Eduardo Santillán/Presidencia de la República

Eleição no Equador é decisiva para continuidade dos governos progressistas na América Latina

Embora ainda não tenha sido concluída a apuração dos votos (neste momento faltam 6,6%), se pode prever pelas projeções que haverá segundo turno na eleição presidencial do Equador, no dia 2 de abril. Ao candidato de esquerda, Lenín Moreno, ex-vice de Rafael Correa, falta 0,82 ponto percentual para chegar aos 40%. Embora uma parte dos votos que faltam apurar seja do exterior, onde ele tem uma vitória clara, ele não deve conseguir impedir o segundo turno com Guillermo Lasso, o banqueiro mais rico do Equador, sobre quem Lenín tem uma vantagem de quase 11 pontos percentuais. A diferença está em 39,18% a 28,40%. Para definir a eleição no primeiro turno, o vencedor precisa alcançar no mínimo 40% e ter diferença superior a 10 pontos para o segundo colocado.

O pleito deixa incertezas até o final, com a direita denunciando possíveis fraudes e até mobilizações militares. O resultado oficial pode ter de esperar até a próxima quinta-feira, segundo o Conselho Nacional Eleitoral. A se confirmar a decisão se prevê mais um mês e meio de tensão. O candidato opositor já chamou a uma frente de “governabilidade democrática”, para a qual obteve o apoio de Cyntia Viteri, colocada em terceiro lugar com 16%, e de outros candidatos menores da direita. Tentará, de forma similar ao que fez Mauricio Macri na Argentina, dizer que a maioria quer a mudança, somando os votos dos opositores.

Mas a disputa será muito acirrada. Em primeiro lugar, pela distância de mais de 10% que Lenín tem sobre Lasso. A Aliança Pais se reafirmou como o maior partido político, renovando sua maioria absoluta no Parlamento. E conseguiu a aprovação no referendo paralelo às eleições, que proíbe que quem ocupe cargos públicos, tenha contas em paraísos fiscais.

O quarto colocado, candidato que se considera social democrata, de esquerda moderada, já afirmou que não apoiara’ ninguém no segundo turno, declarando-se equidistante, embora o partido que o lançou, embora seus eleitores possam não segui-lo. Foi o candidato apoiado pela ultra esquerda, que depois da fragorosa derrota do seu candidato – Alberto Acosta – nas eleições presidenciais anteriores, desta vez nem sequer lançou candidato, se concentrando nos ataques ao governo de Rafael Correa e seu candidato.

É uma eleição de importância decisiva não apenas para a continuidade do processo de transformações que vive o Equador há 10 anos, mas para toda a América Latina. Depois de sucessivos avanços da direita, desde a conquista da maioria no Congresso venezuelano, passando pela vitória eleitoral na Argentina, pela derrota do referendo convocado por Evo Morales na Bolívia sobre a possibilidade de que ele se candidate uma vez mais, pelo golpe no Brasil, se passou a falar de “fim de ciclo”, para o que faltaria uma derrota da esquerda no Equador.

A direita tinha se assanhado como nunca, depois de ter perdido sucessivamente todas as eleições nacionais no Equador por uma década, com Rafael Correa se elegendo e reelegendo no primeiro turno. A direita, sucessivamente derrotada, desta vez se vale da recessão econômica que vive o país e da ausência de Rafael Correa como candidato. O desgaste que isso representa levou a que Lenín tivesse uma votação abaixo os mais de 50% de aprovação popular ao governo Correa.

Lenín desenvolveu um estilo menos conflitivo que o de Correa, projetando uma imagem de político aberto para o dialogo com setores opositores e menos radical nas medias que possa tomar. Seu vice, Jorge Glass, representa mais diretamente as posições e o estilo de governo de Correa.

Caso triunfe, vai ter de enfrentar a difícil tarefa de superação da recessão econômica e dos índices sociais, que haviam melhorado tanto no Equador nos últimos 10 anos. Terá que recuperar um clima mais ameno para o governo, polarizado nestes últimos anos, especialmente na campanha eleitoral. Já Guillermo Lasso, caso chegue a triunfar, teria de se enfrentar, antes de tudo, a suas promessas de manutenção dos avanços sociais, incompatíveis com seu programa econômico. Teria de conviver com uma maioria da esquerda no Congresso. E teria de encerrar seus negócios financeiros no Panamá, como determinou o referendo.

Fica-se na espera agora das primeiras pesquisas, para saber se haverá transferência de votos de direita ou se prevalecerá o favoritismo de Lenín.

Além desses temas, o destino de Julian Assange, o criador do WikiLeaks, também se joga nessas eleições. Lasso afirmou que terminará de imediato com o asilo que o Equador propicia há mais de quatro anos, o que levaria a que fosse expulso da Grã-Bretanha para responder pelas acusações de violação que tem na Suécia, além das de que é vitima nos Estados Unidos.