Sindicalistas prometem ‘martelar’ defesa do emprego no G20

Secretário de relações internacionais da CUT, João Felício, ressalta preocupação com direitos trabalhistas nas decisões sobre a crise internacional

Protestos na Grécia iniciaram-se em 2010, e prosseguem contra redução de direitos dos trabalhadores. Sindicalistas prometem cobrar defesa do emprego (Foto: © John Kolesidis/Reuters)

São Paulo – O movimento sindical vai continuar “martelando” possíveis soluções para manutenção dos empregos em plena crise econômica internacional, em reunião do G20, frisa João Felício, secretário de relações internacionais da Central Única dos Trabalhadores (CUT). O dirigente vai participar de eventos que antecedem a cúpula do G20 – grupo dos países mais desenvolvidos – nesta quinta e sexta-feiras (3 e 4) em Cannes, na França. Em conjunto com outros representantes sindicais da Confederação Sindical Internacional (CSI), o objetivo é inserir a preocupação com os direitos do trabalhador nas decisões econômicas da crise.

Em reuniões anteriores do G20, sindicalistas realizaram protestos para apresentar reivindicações. Agora, mesmo de fora da agenda oficial, a realização de debates anteriores e paralelos permite espaços para demandar diretamente aos governos. Uma reunião com ministros do Trabalho do grupo de países já foi realizada, e estão previstos encontros com chefes de Estado.

“A gente continua martelando (a defesa do emprego), enchendo o saco mesmo. Vamos lá para não deixar barato”, disse João Felício. Um dos alvos principais de críticas é o setor financeiro, que paga altos salários a executivos, mas procura socorro do Estado em momentos de instabilidade. “Não é possível os bancos continuarem nesta libertinagem total, fazem o que querem e pedem ajuda. E o governo é obrigado a socorrer”, criticou.

Nesta quarta-feira (2), os sindicalistas encontram-se com o presidente da França, Nicolas Sarkozy. Segundo Felício, a reunião tem como objetivo debater iminentes reformas da previdência que podem significar a retirada de direitos trabalhistas. O grupo também deve se reunir com a chanceler da Alemanha, Angela Merkel, e com a presidenta reeleita da Argentina, Cristina Kirchner.

O sindicalista destaca o papel das centrais de articular propostas aos líderes mundiais que visam a combater a desigualdade entre trabalhadores de diferentes países, ocasionadas por medidas emergenciais de nações que mais sofrem impacto econômico.

Se imaginássemos uma reunião semelhante, há dez anos, em vez do G20, o encontro seria do G8, apenas das sete nações mais ricas e a Rússia. E o movimento sindical estaria apenas protestando do lado de fora. Agora, são feitas audiências com chefes de Estado. O que mudou?

O movimento sindical combina sempre estratégias. Cada país desenvolve seus protestos. É claro que (o movimento) não se recusa a dialogar e apresentar cara a cara as reivindicações. Darei um exemplo: as centrais sindicais portuguesas têm greves eventuais, assim como as espanholas, francesas, e por aí vai. Na Grécia, é greve toda hora. Você combina mobilização, greve, luta e o pessoal não deixa de participar dessas reuniões.

Isso fazemos desde o governo passado. O Lula (Luiz Inácio Lula da Silva, ex-presidente), por exemplo, sempre fazia encontros conosco. Eventualmente houve governos mais sensíveis à área social. Quem bancou e quem reivindicou veementemente que a OIT (Organização Internacional do Trabalho) deveria ter assento nas reuniões do G20 foi o Lula, por causa de nossas reivindicações. Os governos brasileiro e argentino sempre tiveram preocupações mais sociais com nossas posições.

Qual é o saldo dessa postura?

Admito que nossas reivindicações não foram tão bem acatadas assim. Eles ouvem nossos questionamentos e, em algum momento, publicam notas com resoluções da reunião do G20 com nossa defesa sobre emprego e recursos para estatais. Escrevem, mas não cumprem. Na reunião eles dizem que temos razão, mas na prática, pouca medida se toma. A gente continua martelando. Vamos lá para encher o saco, mesmo, para não deixar barato.

O que a CUT pretende levar ao G20? Nas últimas semanas, houve encontros com ministros do Trabalho..

Nossa análise não muda muito sobre o que vamos levar. Como questão central, somos contra qualquer reforma que signifique a retirada de direitos, porque é o que os governos estão fazendo. Quando os Estados socorreram o sistema financeiro, usaram os recursos públicos, de impostos que o povo paga. O que eles estão fazendo agora para resolver o problema de caixa? Reformas liberais, tirando direitos, fazendo reforma da previdência local para que as pessoas se aposentem mais tarde. O governo da França e da Itália agiram assim. Na última semana, houve uma reunião da OCDE (Organização de Cooperação e de Desenvolvimento Econômico), na qual foi sugerido o aumento da idade para aposentadoria.

Esse tipo de reforma é justamente o que não queremos ver. Não queremos resolver um problema de caixa retirando nossos direitos. É uma posição clara. Em segundo lugar, é preciso ter um piso de proteção social. Os estados têm de usar recursos para estabelecer pisos, como se estivesse dando ajuda às famílias desempregadas.

Além do que o movimento sindical não quer, quais seriam as formas para se lidar com o cenário?

Uma outra questão que a gente leva é a taxação sobre as transações financeiras. É uma posição muito antiga da CSI. As transações financeiras têm uma taxação para se criar um fundo social para socorrer economias em situação difícil. Não é taxar em classe média, pobre. Há investidores que mantêm aplicações em cirandas financeiras, que em um dia colocam dinheiro em Tóquio e, no outro, levam tudo para Frankfurt. É preciso taxar isso.

Outro tema é o controle sobre o sistema financeiro. Devido ao depósito compulsório, os bancos brasileiros não usufruem de uma libertinagem tão grande como os norte-americanos e europeus. O sistema brasileiro é bem mais controlado pelo governo do que os europeus ou americanos.

Não é possível que os bancos continuem nessa libertinagem total, fazem o que querem, pagam altíssimos salários aos seus executivos e depois vão à falência. E o Estado é obrigado a socorrer.

Há expectativa de que o Brasil leve proposta de ajuda financeira aos países europeus que sofrem com a crise internacional, por meio de um pacote de socorro em acordo bilateral com o Fundo Monetário Internacional (FMI). A CUT tem posição sobre?

Confesso que nunca debatemos esse assunto aqui na CUT, mas eu pessoalmente sou contra utilizar recursos. Tudo bem que qualquer recurso que se entrega tem retorno. Não é doar à União Europeia para resolver o assunto na Grécia, na Itália, ou na Espanha. É mais por uma questão política. Não é correto para um país emergente como o Brasil socorrer um país europeu. A China é diferente, porque tem US$ 3 trilhões (em reservas) de divisas. O Brasil, se não me engano, tem US$ 300 bilhões (o dado mais recente do Banco Central é de US$ 352 bilhões). Não é uma situação confortável. É confortável para os nossos padrões, mas com cautela. A não ser que tenha contrapartida. Por exemplo: o Brasil concordaria em ajudar, mas com controle sobre o sistema financeiro, ou taxação, ou que não tenha reforma neoliberal que tire o direito dos trabalhadores.

Desde a crise de 2008-2009, foi gasto US$ 1,7 trilhão em socorro a bancos e outras empresas. É muito dinheiro que sai dos estados para socorrer o sistema financeiro. Não é possível isso acontecer, precisa ter uma contrapartida. E a contrapartida principal é ter controle sobre esse monte de ladrões.