Nicolás Maduro tentará vencer eleições para continuar legado de Hugo Chávez

Ex-funcionário do Metrô de Caracas, ex-deputado e ex-chanceler da Venezuela, o vice-presidente será o nome do chavismo no pleito que se realizará em abril

Nicolás Maduro é partidário do chavismo desde os anos 1990 e ganhou a confiança de Hugo Chávez (Foto: MinCI/Venezuela)

São Paulo – Quando se acabarem as cerimônias em homenagem a Hugo Chávez, e os venezuelanos superarem a dor que sentiram com a perda do presidente, o país começará a pensar em seu futuro político na ausência daquele que foi seu líder máximo nos últimos 14 anos. Os chavistas terão as mesmas preocupações, intensificadas pelo desafio de dar continuidade às transformações realizadas pela revolução bolivariana até então conduzida pelo comandante. Todos os holofotes, então, cairão sobre Nicolás Maduro.

Aos 50 anos, alto, corpulento e com um reluzente bigode preto, Nicolás Maduro acompanhou os passos de Hugo Chávez desde a primeira campanha eleitoral encabeçada pelo presidente, em 1998, quando se elegeu pela primeira vez. Então, Maduro fazia parte do Movimento V República (MVR), partido fundado por Chávez para arrebatar nas urnas o Palácio de Miraflores. Sua carreira política, porém, começara antes. 

A Assembleia Nacional venezuelana anunciou na noite de ontem (7), que o presidente interino, Nicolás Maduro, será juramentado, hoje (8), como presidente encarregado. A cerimônia está prevista para as 19h (20h30, no horário de Brasília).
O presidente da Assembleia Nacional, Diosdado Cabello, explicou que as medidas necessárias estão sendo tomadas para cumprir o conteúdo constitucional.
“A Constituição indica que se deve juramentar o vice-presidente Nicolás Maduro como presidente encarregado e, depois, ele pode convocar novas eleições presidenciais”, detalhou Cabello.
Algumas interpretações da Constituição definiam, que a função interina caberia ao presidente da Assembleia e não ao vice-presidente, no caso de falta absoluta do presidente eleito. As eleições presidenciais devem ser anunciadas para 30 dias, após a convocação de Maduro.
Cabello argumentou que a decisão foi tomada em conjunto com sua equipe de trabalho para dar continuidade ao mandato e ao desejo do chefe de Estado, Hugo Chávez. “Não pensávamos que teríamos uma falta absoluta, mas temos que fazer cumprir a lei”, disse o presidente da Assembleia.
(da Agência Brasil)

Quando jovem, Maduro militava na Liga Socialista da Venezuela. Trabalhava como condutor no Metrô de Caracas e, graças a sua atuação trabalhista, comandou o sindicato da empresa. Na última campanha presidencial, em 2012, Hugo Chávez contou com as habilidades de Nicolás Maduro ao volante para liderar suas carreatas. Foi seu homem de confiança para conduzi-lo pelas ruas do país enquanto acenava para a população na caçamba da caminhonete.

Deputado

Mas essa íntima relação teve um antecedente legislativo. Quando Hugo Chávez convocou uma Assembleia Constituinte para escrever a nova Carta Magna do país, em 1999, Nicolás Maduro foi eleito como um de seus escritores. Em 2000, elegeu-se deputado. Em 2005, seria reeleito, para um ano depois assumir a presidência da Assembleia Nacional. Mas durou pouco no cargo.

Hugo Chávez o convidaria ainda em 2006 para assumir o Ministério do Poder Popular para Assuntos Exteriores. Assim, Maduro ficou conhecido na América Latina e em todo o mundo como o representante do presidente nas querelas internacionais em que o país se meteu – e não foram poucas. Liderou conflitos diplomáticos com George W. Bush e os Estados Unidos, defesas contundentes do Estado Palestino, declarações de apoio ao Irã em sua tentativa de desenvolver energia nuclear e solidariedade aos regimes da Síria e Líbia durante as manifestações originadas pela Primavera Árabe – que degringolaram em guerras civis.

Maduro também foi o primeiro negociador venezuelano em todas as iniciativas integracionistas impulsionadas pelo presidente Hugo Chávez: Aliança Bolivariana para as Américas (Alba), União de Nações Sul-Americanas (Unasul), Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac), Banco do Sul e Conselho de Defesa do Sul. Também externou, em fóruns internacionais, as críticas do chavismo ao Sistema Interamericano de Direitos Humanos da Organização de Estados Americanos (OEA).

Herdeiro

Tamanha lealdade conquistou a simpatia – e a confiança – de Hugo Chávez. Em 10 de outubro de 2012, depois de seis anos servindo na diplomacia venezuelana, Nicolás Maduro foi nomeado como vice-presidente executivo do país. A nova posição o colocava em primeiro lugar na linha sucessória dentro do Partido Socialista Unido da Venezuela (PSUV). O posto ficara vago após a saída de Elías Jaua, que exercia o cargo até então. Jaua se lançaria às eleições estaduais, e tentaria – sem sucesso – vencer o maior opositor do chavismo, Henrique Capriles, como governador do estado de Miranda. Após a derrota, assumiria as antigas atribuições de Nicolás Maduro e se converteria em chanceler da Venezuela.

A expectativa de Nicolás Maduro, agora, é não ter o mesmo fim que seu antecessor na vice-presidência – ou seja, ser derrotado por Capriles e ter de se arranjar com outro cargo no partido. Maduro recebeu das mãos do próprio Hugo Chávez, dois dias antes de passar pela sua última cirurgia em Cuba, a missão de levar o chavismo adiante. “Se acontecer alguma coisa que me impeça de seguir governando, minha absoluta convicção é que vocês elejam Nicolás Maduro como presidente da república”, pediu o líder bolivariano em cadeia nacional de rádio e tevê.

Ainda não há nada definida, mas é praticamente certo que o herdeiro político de Hugo Chávez se enfrentará ao garoto-prodígio da Mesa de Unidade Democrática (MUD) nas novas eleições que deverão ocorrer em todo o país entre os dias 7 e 14 de abril. De acordo com a Constituição, após a morte do presidente, o governo interino tem 30 dias para convocar o pleito. O artigo 233 determina que o presidente da Assembleia Nacional, Disdado Cabello, outro nome importante do chavismo, deve assumir a chefia do Estado nesse período. Mas não foi o que ocorreu até agora.

Atropelos

Nicolás Maduro passou por cima da institucionalidade venezuelana e ficou com o posto que, na prática, já vinha exercendo durante a convalescência de Chávez. Para isso, contou com apoio de sua esposa, Cilia Flores, ex-presidente do Legislativo venezuelano e atual titular da Procuradoria Geral da República. Foi com o título de “presidente interino” que assinou seu primeiro decreto, determinando sete dias de luto oficial no país pelo falecimento do comandante. As bandeiras ficarão a meio pau na Venezuela até 11 de março.

Nas ruas, acompanhando o cortejo fúnebre de Hugo Chávez, a população manifestava seu apoio eleitoral a Nicolás Maduro, prometendo lealdade ao último pedido feito pelo presidente. “Chávez, te juro, votaremos em Maduro”, cantavam. Para vencer Henrique Capriles, porém, o candidato chavista terá de trabalhar duro. Disputando contra Hugo Chávez e todo seu carisma popular, o opositor conseguiu 44% dos votos, apenas 10 pontos menos que o comandante. Maduro terá de manter o percentual de seu antecessor – ou, ao menos, não deixar que os votos que outrora foram para o chavismo se transfiram para o adversário, que tem bastante apelo nas classes médias venezuelanas. A diferença é bastante estreita.

“A qualidade de estadista, o nível de preparação e de conhecimento da realidade venezuelana é um mérito quase exclusivo  de Hugo Chávez, que conseguia estar a par de muitos cenários políticos, sociais e econômicos do país e acompanhar diariamente a evolução dos programas governamentais”, analisa Carlos Navarro, presidente da Aliança Sindical Independente (ASI) e professor da Universidade Central da Venezuela (UCV). “Maduro passou os últimos seis anos fazendo diplomacia. Realizou um bom trabalho, mas permaneceu muito tempo longe da realidade venezuelana.”