Mais Médicos

Padilha vê ‘postura arrogante’ contra cubanos e rejeita comparação com escravidão

Ministro da Saúde lamenta comparação feita pelo líder do DEM, Ronaldo Caiado, e questiona se países europeus que firmaram acordo com Cuba aceitariam trabalho escravo

Luis Macedo/Câmara

Padilha alega que o problema é de todos os municípios do Brasil, e não de um partido

São Paulo – O ministro da Saúde, Alexandre Padilha, pediu hoje (4) que os críticos ao programa Mais Médicos não sejam contra os profissionais cubanos por terem posturas ideológicas contrárias ao sistema político do país. “Não podemos ter uma postura arrogante”, disse, durante comissão geral da Câmara sobre o programa, em Brasília.

Em agosto, 400 médicos cubanos chegaram ao Brasil para atender em regiões pobres e foram recebidos com hostilidade por associações médicas. Até o final do ano, mais 3.600 profissionais do país virão ao Brasil, por meio de um acordo de cooperação entre o governo brasileiro e a Organização Panamericana de Saúde (Opas). “Temos de separar uma postura ideológica de crítica a Cuba, que é legítima, de um programa que garante uma alternativa para milhões de brasileiros que hoje não têm acesso a qualquer médico”, argumentou o ministro. “Existem opiniões diferentes sobre o regime cubano (…) O que estamos trazendo para o Brasil não é o regime cubano ou o seu modelo econômico e de democracia. O que o Ministério da Saúde está fazendo é trazer a experiência da atenção básica à saúde pública.”

De acordo com o ministro, os médicos cubanos trabalharão em 701 cidades que não foram escolhidas por nenhum médico brasileiro ou estrangeiro, participantes do programa. “Mais de 12 milhões de pessoas moram nesses municípios, que hoje não têm nenhum médico”, alertou. Atualmente, Cuba mantém missões médicas em 58 países.

O líder do DEM, Ronaldo Caiado (GO), aproveitou a ocasião para trazer ao plenário a versão de que os médicos cubanos estariam submetidos a más condições de trabalho. “Os médicos europeus vêm com suas famílias, hospedam-se em bons hotéis, vão a restaurante. Os cubanos, por sua vez, chegam guardados pela polícia, são escoltados por uma brigada médica, estão restritos a um quartel, não podem trazer a família, não têm direito ao passaporte nem podem pedir anistia politica. Isso é trabalho escravo”, argumentou.

Padilha lamentou a fala do parlamentar. O acordo firmado com a Opas prevê que o salário dos profissionais seja repassado à organização, que enviará as verbas a Cuba, repassando aos médicos um percentual do total. Os cubanos receberão cerca de R$ 4 mil e o restante será repassado para o governo de Cuba, que por sua vez repassará parte para a família do médico e parte para a manutenção do sistema de saúde do país, que é 100% público e gratuito.

O contrato é diferente dos demais médicos estrangeiros, que receberão R$ 10 mil líquidos por mês. “Não existe nenhum paralelo de trabalho escravo nas missões externas do trabalho médico de Cuba, inclusive na Europa. Alguém acha que a União Europeia permitiria trabalho escravo em Portugal? Lá, até o presidente da ordem dos médicos defendeu a presença dos cubanos, que era a forma de garantir a presença do médico em áreas rurais”, exemplificou. Porém, ele ressaltou que se qualquer um dos profissionais estrangeiros quiser ficar no Brasil por motivos políticos, a situação será analisada.

O ministro lembrou que a verba será usada para garantir a formação de novos médicos em Cuba e que o país já atua em nações pobres, como o Haiti, em missões internacionais. “Um país pobre como Cuba custeia integralmente esses programas. Disso ninguém se lembra ao criticar o formato de remuneração dos médicos no Brasil”, ponderou.

O ministro lembrou que o Mais Médicos conta com outras ações além da contratação imediata de profissionais, incluindo garantia de infraestrutura em unidades de saúde e estímulo à criação de vagas em faculdades de Medicina.

De acordo com ministro, o Brasil oferece 0,8 vaga de medicina para cada 10 mil habitantes. Em Portugal, a proporção é de 1,6, e, na Argentina, de 3,2. A cada ano, 700 mil pessoas concorrem às 17 mil vagas na área disponíveis no Brasil. “Mesmo países com maior número proporcional de médicos têm mais vagas em cursos superiores. O Brasil precisa democratizar o acesso ao estudo da Medicina, caso contrário não resolveremos o problema estruturante da falta de médicos”, afirmou.

Legalidade

Durante o debate em plenário, o advogado-geral da União, Luís Inácio Adams, defendeu a legalidade do programa Mais Médicos, afirmando que a existência de pelo menos 700 municípios brasileiros sem nenhum médico justifica a medida. Segundo ele, existem 53 ações no Judiciário questionando a legalidade do programa, nenhuma delas exitosa.

“Dessas 53 ações, nenhuma delas resultou em uma ordem judicial de suspensão do programa. Ao contrário, as decisões tem reiterado o ponto de vista jurídico e constitucional reafirmando a consistência jurídica da proposta”, disse Adams. “Não vemos nenhuma falha, nenhuma fragilidade que pudesse ser comprovada”.

Ele afirmou que qualquer negativa de um conselho regional de Medicina de conceder o registro provisório aos profissionais estrangeiros será punida.

A diferença de salários dos profissionais de Cuba também é legítima, segundo o magistrado. “No caso dos médicos cubanos, apenas a remuneração se submete à especificidade própria do acordo com o país. Não há limitação desse ponto de vista. Não vemos nenhuma falha, nenhuma fragilidade”, declarou ao Jornal do Brasil.

Com informações da Agência Câmara, do Jornal do Brasil e do Valor Econômico.