Negros e mulheres têm menos acesso a transplantes de órgãos no país

Estudo inédito do Ipea mostra novas consequências da desigualdade social no País

São Paulo – A cada quatro transplantes de coração, apenas um é feito em mulheres. A cada três de fígado, dois são em homens. Do total de cirurgias para transplantar órgãos de modo geral, 56% beneficiam pessoas brancas. Negros, pardos e indígenas ficam com apenas dois de cada 10 operações médicas hepáticas do gênero.

As conclusões de um estudo inédito do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) mostram as consequências de diferentes faces da desigualdade social no Brasil. Com base em dados de 1995 a 2004, fornecidos pela Associação Brasileira de Transplantes de Órgãos (ABTO), o levantamento indica que algumas das intervenções mais avançadas da medicina registram efeitos de discriminação de gênero e racial.

“Verificamos que o conjunto de desigualdades brasileiras acaba chegando no último estágio de medicina”, aponta o economista Alexandre Marinho, da Diretoria de Estudos e Políticas Sociais do Ipea, um dos autores da pesquisa. Os dados dizem respeito a operações de transplante de coração, fígado, rim, pâncreas e pulmão.

Embora o estudo não inclua as causas do fenômeno, Marinho entende que ele ocorre em função da preparação para o transplante, o que inclui mudança na alimentação, medicamentos específicos – e de alto custo – além de exames clínicos e procedimentos de atenção básica. Essas etapas acabariam funcionando, em sua visão, como uma barreira social.

Para os três quartos da população que dependem apenas do atendimento público, oferecido pelo Sistema Único de Saúde (SUS), há dificuldades para se alcançar esses pré-requisitos. “A situação onera quem tem menos condições de buscar alternativas”, disse o economista do Ipea. “O sistema é desigual na ponta (cirurgia de alta complexidade) porque é desigual na entrada”, avalia.

Mais grave é o fato de que, em áreas nas quais o SUS alcança excelência de atendimento, há restrições de acesso. Como os planos de saúde resistem e criam impedimentos para pagar por procedimentos de alta complexidade, como as cirurgias de transplantes, muitos hospitais privados buscam recursos do SUS para custear a intervenção.

Segundo o Sistema Nacional de Transplantes (SNT), há 1.376 equipes médicas autorizadas a realizar esse tipo de procedimento em 25 estados brasileiros (548 hospitais).

A análise do Ipea, mostra que homens e mulheres são igualmente atendidos nos transplantes de pâncreas, mas 93% dos atendidos são brancos. A maioria absoluta de receptores de pulmão também são homens (65%) e pessoas brancas (77%). O mesmo fenômeno ocorre com o transplante de rim: 61% dos receptores são homens; 69% das pessoas atendidas têm pele clara.

Com informações da Agência Brasil