Irresponsabilidade

‘Tratamento precoce’ de Bolsonaro eleva risco de lesão renal aguda em pacientes com covid-19

Estudo da Unifesp mostra que 70% de pessoas internadas com coronavírus desenvolveram a chamada Lesão Renal Aguda, sendo que metade desse grupo fez o tratamento precoce amplamente defendido por Jair Bolsonaro

Robina Weermeijer/Unsplash
Robina Weermeijer/Unsplash

São Paulo – Estudo encampado pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) mostra que a utilização do “tratamento precoce”, amplamente defendido pelo presidente Jair Bolsonaro como terapia contra a covid-19, aumenta o risco de pacientes internados com a doença apresentarem quadro de Lesão Renal Aguda (LRA). Remédios como hidroxicloroquina e azitromicina já haviam dado outras indicações de que, além de comprovadamente não terem eficácia contra a doença, podem agravar o quadro de saúde e até matar.

O ponto central do estudo da Unifesp foi avaliar a incidência da LRA em pacientes internados para tratar a covid-19. Após analisarem 278 casos, chegaram à conclusão que 198 deles apresentaram problemas graves nos rins. Desse grupo, metade acreditou em Bolsonaro e fez o tratamento precoce. Já entre os que não evoluíram para a Lesão Aguda Renal, a porcentagem de quem usou hidroxicloroquina e azitromicina foi de 30%.

Hipertensão e diabetes

De acordo com a Agência Einstein, o estudo mostrou ainda que a hipertensão foi outro fator associado à aparição da LRA, aparecendo em 70% dos casos. Por outro lado, não foram constatadas diferenças na análise de indicadores como idade, gênero, sobrepeso ou quadro de diabetes.

“Observamos que o maior risco para pacientes com LRA após covid foi independentemente associado com marcadores sanguíneos inflamatórios, histórico de hipertensão arterial, terapia com hidroxicloroquina e azitromicina e necessidade de vasopressores para aumentar a pressão arterial quando esta encontrava-se muito baixa”, detalha Miguel Angelo de Góes Junior. Ele é docente da disciplina de Nefrologia da Escola Paulista de Medicina (EPM/Unifesp) e um dos especialistas envolvidos na pesquisa. “A LRA foi identificada com elevação dos níveis sanguíneos de creatinina ou redução no volume urinário”, complementa.

Morte e transplante

Apesar de ser amplamente descartada por um sem número de especialistas no mundo inteiro, inclusive pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), Bolsonaro constantemente defende a uso de medicação sem eficiência contra a covid-19, como hidroxicloroquina e azitromicina. Muitos de seus fiéis seguidores compram a ideia e o resultado é trágico.

Na segunda-feira (5), por exemplo, um homem de 69 anos morreu no Rio Grande do Sul após passar por uma nebulização de hidroxicloroquina. Em março, outros três casos vieram à tona, também em terras gaúchas. Todos tendo a mesma médica responsável pelo procedimento. De acordo com matéria do portal G1, o diretor técnico do hospital, Tiago Bonilha, informou que três dos quatro internados que fizeram o tratamento apresentaram taquicardia ou arritmias após a nebulização.

Fila de transplante

Em São Paulo, de acordo com o jornal O Estado de S.Paulo, há pelo menos três mortes por hepatite suspeitas de terem ligação com o tratamento precoce. O mesmo veículo afirma, que outras cinco pessoas precisaram entrar na fila de transplante de fígado após passar pela mesma terapia.

“Eles chegam com pele amarelada e com histórico de uso de ivermectina e antibióticos”, disse Luiz Carneiro D’Albuquerque, professor e chefe de transplantes de órgãos abdominais do HC-USP. “Quando fazemos os exames no fígado, vemos lesões compatíveis com hepatite medicamentosa. Vemos que esses remédios destruíram os dutos biliares, que é por onde a bile passa para ser eliminada no intestino”, explicou.


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