Indústria da morte

‘Cobaias da radiação’: livro detalha efeitos da experiência nuclear nos trabalhadores e no ambiente

Trabalho mostra origens da indústria nuclear brasileira, em São Paulo, e suas consequências nocivas sobre a vida

Reprodução/Fernanda Giannasi
Reprodução/Fernanda Giannasi
Livro relata origens e desdobramento da instalação de uma indústria nuclear em São Paulo, que fez vítimas durante décadas

São Paulo – Livro que será lançado na noite desta segunda-feira (24) mostra detalhes da experiência nuclear brasileira, sempre envolta em certa névoa de mistério por se tratar de assunto “estratégico”. A obra retrata os efeitos nocivos da contaminação sobre os trabalhadores, durante décadas. Sobreviventes e suas famílias convivem com uma triste rotina de doenças e tentativas de reparação judicial.

Cobaias da radiação – a história não contada da marcha nuclear brasileira e de quem ela deixou para trás, escrito pela jornalista Tania Malheiros, será lançado a partir das 18h na Câmara Municipal de São Paulo (que chegou a abrir uma CPI em 1991 sobre o tema). Em seguida, haverá debate. Com prefácio de André Trigueiro e Cristina Serra, a obra traz imagens e documentos inéditos relativos à primeira instalação industrial nuclear brasileira, nas décadas de 1940 e 1950, na capital paulista.

Rastro de mortos

O trabalho de Tania – que escreve sob o tema desde 1986 e atualmente mantém um blog – conta a história da indústria nuclear Orquima, no Brooklin, na zona sul paulistana, sucedida pela Usina de Santo Amaro (Usam), depois Nuclemon. Que deixou “um rastro de mortos, desaparecidos e doentes”. Vítimas ignoradas pelo Estado, as “cobaias da radiação”, que se somam a uma lista de trabalhadores contaminados em ambientes de trabalho no país.

A Nuclemon tem origem no acordo nuclear entre Brasil e Alemanha, ainda na ditadura. Em 1988, já nova “Nova República”, foi substituída pela INB (Indústrias Nucleares do Brasil). A usina do Brooklin foi fechada a partir de 1992. Desde então, os materiais ficaram sob a guarda da INB.

Exploração de mão de obra

A própria Tania fez denúncia sobre o caso em 1990, em matéria publicada no jornal O Estado de S.Paulo e no extinto Jornal da Tarde. Isso resultou em processo aberto pela engenheira Fernanda Giannasi, pesquisadora e ativista em saúde no ambiente do trabalho, e pelo Sindicato dos Químicos de São Paulo.

Neste contexto, o lançamento de hoje tem apoio do vereador Hélio Rodrigues (PT), presidente do sindicato. Também estarão presentes integrantes da Associação Nacional dos Trabalhadores na Produção de Energia Nuclear (Antpen)

Com vários depoimentos de vítimas e familiares de operários mortos, o trabalho exigiu quatro anos de pesquisa. “O livro se propõe a jogar luz sobre um dos maiores crimes de exploração de mão de obra operária ocorrido no Brasil. Espero que possa contribuir para que se faça justiça com as vítimas e representantes dos mortos”, afirma a autora.