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Vacinas contra a covid-19 no Brasil: conheça tecnologia, histórico e eficácia de cada uma

Entenda os mecanismos de cada imunizante contra a covid-19 em uso no Brasil, ou em vias de

Govesp/Fotos Públicas
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Apesar da falsa sensação de segurança que avança no país, a Organização Mundial da Saúde (OMS) alerta que a pandemia está longe do fim. Isso, porque a variante delta avança em todo o mundo

São Paulo – As vacinas contra a covid-19 são feito histórico da ciência mundial, porque foram desenvolvidas e entraram em ação em velocidade nunca antes vista. Assim, imunizantes estudados em diferentes fases agora são aplicados na população e, hoje, salvam vidas e apontam para um futuro com a covid-19 sob controle.

Diferentes laboratórios obtiveram fármacos seguros através de diferentes tecnologias, em um movimento de inovação e dedicação dos cientistas. A velocidade tem relação com a necessidade. A pandemia é a crise sanitária global mais séria em mais de 100 anos, tanto que já fez mais de 4 milhões de mortos em todo o mundo.

Mas a ciência aponta que ainda há um longo um caminho a ser percorrido e que, portanto, além de vacinar com velocidade, medidas não farmacológicas (uso de máscaras, higiene e distanciamento social) seguem necessárias. As vacinas reduzem a circulação do vírus da covid-19, mas esses imunizantes ainda não estão disponíveis em número adequado. Enquanto isso, avançam os medos sobre mutações, novas cepas virais que se desenvolvem diante da ampla disseminação.

Variante delta

A variante mais agressiva até o momento, chamada de delta, foi identificada pela primeira vez na Índia, o que levou o país ao colapso do sistema de saúde no início do ano. A partir daí, a cepa se espalhou e, assim, muitos países retomaram medidas intensivas de isolamento social, como na Ásia; enquanto na Europa, com atraso nesses cuidados, voltou a subir o número de casos, mesmo com vacinação avançada.

A variante delta também provocou uma corrida para antecipar as segundas doses das vacinas. No Brasil, ao menos sete estados já anunciaram menor tempo entre as duas doses. Isso porque estudos indicam que a cepa é de 50% a 70% mais contagiosa, além de derrubar o índice de eficácia para imunização com apenas uma dose para níveis inferiores a 50%. Como apontou estudo publicado na revista Lancet, mesmo com duas doses a eficácia cai sensivelmente. A Pfizer, analisada pelos cientistas, tem sua eficácia reduzida de 95% para 79%; a AstraZeneca, de 73% para 60%.

A covid-19 é um vírus novo e estudo atualizados são publicados diariamente. Até o momento, os cientistas são unanimes em afirmar que todas as vacinas contra a covid-19 disponíveis são eficientes em proteger a população. Especialmente contra casos mais graves. Portanto, o ponto essencial é que todos devem se vacinar o quanto antes, com qualquer vacina aprovada. Até porque, em termos de prevenção de casos graves e morte, todos os imunizantes disponíveis possuem taxas elevadas de sucesso, perto de 85% a 90%.

Tecnologia brasileira

Centenas de vacinas contra a covid-19 seguem em estudo em todo o mundo. São 184 em fase pré-clínica, 52 em Fase 1, com ensaios de segurança em pequena escala, 37 em Fase 2, com ensaios de segurança expandidos, 32 em Fase 3, com aplicação em maior escala em humanos, 8 aprovadas em diferentes países e 9 com aprovações limitadas.

Além da busca por novas tecnologias, pesquisadores atuam para aperfeiçoar as já existentes, como é o caso da AstraZeneca, que conduz estudos avançados de um novo imunizante com maior poder de cobertura entre variantes. Outro destaque importante neste campo é a vacina ButanVac, em desenvolvimento pelo Instituto Butantan, em São Paulo.

Com tecnologia 100% nacional, a ButanVac utiliza experiências conhecidas pelos pesquisadores brasileiros. Trata-se de um molde seguro e com promessa de alta eficácia. A tecnologia em questão é de vetor viral não replicante. Desse modo, utiliza um vírus de aves (doença de Newcastle) que não provoca efeitos em humanos e inocula o vírus como vetor, “carregado” com características do coronavírus. Como resultado, estimula o organismo a produzir anticorpos, especialmente relacionados com a proteína Spike, um dos compostos do vírus ligado ao potencial de contágio com as células humanas.

Outro detalhe importante da ButanVac tem relação com o preço, pois a a vacina pronta para aplicação tenderá a ter valor significativamente inferior ao de todos os outros imunizantes disponíveis.

As vacinas contra a covid-19 no Brasil

Enquanto mais vacinas contra a covid-19 estão em desenvolvimento, quatro imunizantes estão em aplicação no Brasil e outros dois possuem autorização restrita para importação. Os fármacos em circulação são: AstraZeneca/Fiocruz, Pfizer, CoronaVac e Janssen. Com autorização restrita da Agência Nacional da Vigilância Sanitária (Anvisa), ainda sem aplicação em brasileiros, são: Sputnik V e Covaxin. Entenda as diferenças entre elas.

AstraZeneca/Fiocruz

Tecnologia: Vacina baseada em adenovírus (ChAdOx1). Desenvolvida pela Universidade de Oxford, no Reino Unido, em conjunto com a farmacêutica AstraZeneca. Utiliza um adenovírus de resfriado comum sem capacidade de se replicar no corpo humano, que por sua vez é modificado para transmitir informações do vírus da covid-19, Sars-Cov-2, ao sistema imunológico.

Esquema vacinal: Duas doses com intervalo recomendado de 12 semanas.

Eficácia: Diferentes estudos apontam para uma variação de eficácia entre 62% e 100%. Para previnir casos sintomáticos, a farmacêutica responsável aponta para 79%. Para impedir o contágio, 70%. Contra casos graves, 100%.

Brasil: O contrato da vacina com o Brasil envolve a Fiocruz, que participou dos estudos, e também prevê transferência de tecnologia. É esperado que neste semestre o imunizante seja 100% produzido no país; portanto, sem necessidade de importação de insumos. A unidade que fará a produção completa e envase das doses, a Bio-Manguinhos, fica no Rio de Janeiro.

Registro: No dia 12 de março, a Anvisa concedeu registro definitivo para uso em todo o país. Até o momento, de acordo com dados da plataforma Localiza SUS, do Ministério da Saúde, a vacina representa 46,6% das doses aplicadas no país.

CoronaVac

Tecnologia: Vírus (Sars-CoV-2) inativado (CoronaVac). Desenvolvida pela empresa farmacêutica chinesa Sinovac em parceria com o Instituto Butantan, de São Paulo. O imunizante utiliza o próprio vírus Sars-CoV-2 cultivado em laboratório e, então, através de calor ou reagentes químicos, é inativado. Assim, células do corpo capturam esses vírus e se adaptam a ele, provocando uma resposta imune.

Esquema vacinal: Duas doses com intervalo de 28 dias.

Eficácia: A eficácia geral da CoronaVac apontada por estudos de Fase 3 é de 50,28%. Esse número representa a efetividade do fármaco para prevenir o contágio. Já sobre casos graves, estudos avançados apontam para eficácia de 95% a 100%. Para prevenir casos leves, 78%. A vacina acumula sucessos práticos com aplicação em larga escala. É o caso do Projeto S, conduzido em Serrana, interio de São Paulo. Após vacinação em massa com a CoronaVac, mortes por covid-19 caíram 95%.

Brasil: A história da CoronaVac no Brasil contou com rejeição do governo federal, pois o presidente Jair Bolsonaro atacou a vacina com mentiras, bem como seus apoiadores. O país também recusou contratos ainda em 2020, o que poderia ter evitado milhares de mortes. O diretor do Instituto Butantan, Dimas Covas, disse que com o imunizante, o Brasil poderia ser um dos primeiros países do mundo a vacinar, mas as barreiras do governo federal impediram. Mesmo com o desgaste, o governo de São Paulo e o Instituto Butantan apostaram em um contrato com transferência de tecnologia e a vacina foi a primeira a ser aplicada no país.

Registro: A Anvisa concedeu aprovação para uso emergencial no dia 17 de janeiro. Até o momento, a vacina do Butantan representa 4 em cada 10 doses aplicadas em todo o país.

Pfizer/BioNTech

Tecnologia: Vacina de mRNA, ou RNA mensageiro. Trata-se de uma tecnologia inovadora que aponta para um futuro promissor na elaboração de vacinas para outras doenças. Primeiro, os cientistas replicam sequências do material genético do vírus e, em seguida, essa informação obtida pela engenharia genética é aplicada em humanos para, assim, preparar o sistema imunológico a criar defesas robustas através da mimetização da proteína Spike. O imunizante é produzido pela farmacêutica norte-americana Pfizer em parceria com a empresa alemã BioNTech.

Esquema vacinal: Duas doses com intervalo de 21 dias. No Brasil, a Anvisa autorizou intervalo maior, de 12 semanas. Com a ameaça da variante delta, estados estão reduzindo para oito semanas.

Eficácia: Informações da empresa apontam para eficácia geral entre 86% e 95% na prevenção da infecção. Para manifestações sintomáticas, a porcentagem sobe para 97% e casos graves, até 100%.

Brasil: As tratativas com a empresa foram negligenciadas pelo governo Bolsonaro. Mais de 50 e-mails com propostas de fornecimento não foram respondidos. Com isso, a acusação de prevaricação está em investigação pela Polícia Federal e na CPI da Covid. A comissão do Senado aponta que a empresa tinha, inclusive, intenção de tornar o país como modelo de vacinação no mundo, já que conta com a ampla estrutura do SUS.

Registro: Obteve registro definitivo da Anvisa no dia 23 de fevereiro, antes mesmo do governo Bolsonaro fechar as primeiras compras, em março. É a vacina mais aplicada no mundo e conta com aprovação definitiva em países da União Europeia e Estados Unidos. Representa 10,5% das doses já aplicadas no Brasil.

Janssen

Tecnologia: Trata-se de uma vacina baseada em vetor viral não replicante a partir de adenovírus, como a AstraZeneca. O fármaco é produzido pela Janssen, farmacêutica do grupo Johnson & Johnson. A tecnologia utilizada é composta pela introdução de “pedaços” de proteína Spike do coronavírus no vetor não replicante. Desta forma, o corpo assimila a informação e desperta o processo de imunidade.

Esquema vacinal: É a única vacina em aplicação no Brasil que conta com dose única.

Eficácia: A eficácia global informada pela farmacêutica é de 66% para contágio. Já contra formas graves, inclusive a variante de Manaus, gamma, a eficácia informada é de 87%.

Brasil: O imunizante foi testado em brasileiros em fase 3. Foi uma das últimas vacinas contra a covid-19 a serem adquiridas pelo governo. A maior parte delas veio a partir de doações de doses próximas ao vencimento pelo governo dos Estados Unidos.

Registro: No dia 19 de março a Anvisa aprovou o uso emergencial do fármaco. Existe um contrato para o recebimento de 38 milhões de doses, inicialmente. Representa 3,2% das aplicações vacinais até o momento.

Sputnik V

Tecnologia: A vacina desenvolvida pela farmacêutica do Fundo Soberano Russo, Instituto Gamaleya, também utiliza vetor viral não replicante. Ela utiliza um esquema de dois adenovírus diferentes entre si. Assim, uma vez combinados, oferecem uma resposta imune reforçada.

Esquema vacinal: Duas doses com intervalo de 21 dias. Necessita de maior atenção na aplicação, já que as doses são diferentes entre si.

Eficácia: A eficácia informada pelo instituto e reafirmada por pesquisa publicada na Lancet por cientistas independentes apontam para 91,6% de eficácia contra manifestações sintomáticas e até 100% contra casos graves.

Brasil: A Sputnik V, mais do que as demais vacinas contra covid-19, encontrou barreiras no Brasil. A Anvisa recusou conceder o registro para uso emergencial, já que a documentação encaminhada era frágil e havia suspeita de que uma porcentagem mínima dos vetores virais pudessem ser replicantes. A União Química, responsável pelo imunizante no Brasil, reenviou os dados e conseguiu autorização especial para importação e aplicação em público restrito de adultos saudáveis.

Registro: Ainda não existe registro para uso emergencial ou definitivo, mas sim uma autorização especial. Existem encomendas de doses diretamente por estados do Nordeste e, também, um contrato para recebimento de 10 milhões de doses do governo federal.

Covaxin

Tecnologia: Vírus Sars-CoV-2 inativado. A vacina indiana da empresa BharatBiotech utiliza tecnologia semelhante à CoronaVac.

Esquema vacinal: Duas doses com intervalo de 28 dias.

Eficácia: A farmacêutica responsável publicou estudos que apontam para 78% de eficácia contra casos moderados e 100% contra complicações graves.

Brasil: A aquisição da Covaxin está no centro de um dos escândalos de corrupção envolvendo compra de vacinas contra covid-19 que pairam o governo Bolsonaro. O caso está sob investigação na CPI da Covid. Grupos de militares, pastores e integrantes do governo estão envolvidos. Houve pressão para compra de doses com valor acima do preço de mercado. Isso, sem sequer o imunizante ter autorização de uso emergencial da Anvisa, apenas uma permissão restrita, como a Sputnik V.

Registro: Inspeções da Anvisa nos dias 1º e 5 de março apontaram para o descumprimento de normas no laboratório produtor da vacina. A agência apontou para problemas com a documentação, além de outros pontos relacionados aos métodos de produção, como “esterilização, desinfecção, remoção e inativação viral”.