Santa Sofia, encontro de crenças e civilizações
Monumento mais visitado da Turquia é obra-prima de arquitetura, arte e integra histórias onde cristãos e muçulmanos coexistem em paz
Publicado 14/09/2014 - 14h04
Na cúpula da basílica observa-se um versículo do Alcorão
A basílica de Santa Sofia é o monumento mais visitado da Turquia. No ano de 2013, mais de 3 milhões de pessoas conferiram de perto aquela que é considerada uma obra-prima da arquitetura e da arte bizantinas. A edificação integra as zonas históricas da capital, Istambul, declaradas Patrimônio Mundial da Unesco há 29 anos. Atualmente, funciona como museu. Mas nasceu como templo cristão, e tornou-se mesquita quando os turcos conquistaram Constantinopla – nome anterior de Istambul –, em 1453.
Santa Sofia – em grego, “divina sabedoria” – foi construída por iniciativa do imperador Justiniano na capital do antigo Império Romano do Oriente (Constantinopla), entre os anos de 532 e 537. Para tal feito contratou os arquitetos Isidoro di Mileto e Antemio di Tralle, e reuniu mais de 10 mil trabalhadores. No local, onde antes existia um templo pagão, haviam sido erguidas duas outras basílicas. A primeira, no século 4, acabou incendiada durante uma rebelião. E a segunda, maior, no século seguinte, fora destruída na sangrenta Revolta de Nika, juntamente com outros edifícios da cidade.
Pode-se dizer que o evento detonador do conflito que ocorreu no ano 532 foi a rivalidade entre equipes que disputavam uma corrida de bigas. A rixa foi, entretanto, apenas o estopim. Os principais combustíveis para a revolta, uma das mais violentas da história de Istambul, eram mesmo a fome, a falta de moradia e os pesados impostos cobrados pelo império. Trinta mil pessoas foram encurraladas no hipódromo e massacradas por mercenários comandados por Belisário, general de Justiniano.
A poucos metros do antigo hipódromo está a entrada da Santa Sofia, de onde pode-se percorrer o local projetado para ser o reflexo terreno dos céus – e perceber o caráter cristão da arte bizantina. Com altura equivalente a um prédio de aproximadamente 20 andares, a catedral foi durante quase mil anos a maior do mundo. Sua vasta cúpula pousa sobre quatro colunas e quatro grandes arcos. Através de inúmeras janelas, a luz invade o espaço e ilumina os mosaicos espalhados por todo o ambiente. Capitéis detalhadamente entalhados arrematam as colunas de mármore trazidas de longínquas cidades do império que se estendia da atual Espanha até o Oriente Médio.
Os mosaicos, feitos de pequenos pedaços de vidros, ouro, prata, terracota e pedras coloridas, retratam Jesus Cristo, Maria e personagens bíblicos ao lado de integrantes da corte bizantina. Na Igreja Ortodoxa, o imperador é considerado o representante de Deus na Terra, sendo responsável, inclusive, pela escolha do Patriarca, o cargo mais alto da Igreja. Sediada na capital de um estado teocrático, Santa Sofia acolhia os rituais da comunidade cristã e os eventos de coroação dos imperadores bizantinos.
A cúpula da basílica ruiu algumas vezes em consequência de terremotos, ao mesmo tempo em que reformas e reconstruções eram empreendidas. No século 13, durante a Quarta Cruzada, foi saqueada por cristãos latinos. Dois séculos depois, em 1453, pelas tropas do sultão Mehmed, que havia prometido aos seus soldados três dias de saques como recompensa pela tomada da até então invencível Constantinopla. Era o fim do Império Bizantino.
Naquele mesmo ano, a obra foi transformada na primeira mesquita de Istambul. A maioria dos turcos já havia se convertido ao islamismo. Santa Sofia funcionou como mesquita durante cinco séculos. Ao longo desse período recebeu reparos que a mantiveram em pé. Historiadores reconhecem a importância da intervenção dos otomanos para que esse patrimônio arquitetônico e cultural tenha sido preservado.
Já no século 20, Santa Sofia (Ayasofya para os turcos) foi transformada em museu. Muçulmanos e cristãos ainda reivindicam que a basílica volte a ser espaço sagrado de orações. Enquanto isso, sob sua vasta cúpula coexistem ícones do cristianismo e do islamismo, exemplo – a ser semeado pelo mundo – de civilidade e respeito ao diverso.