Dinâmica golpista

‘Vamos esperar o quê?’, instiga Bolsonaro em reunião que cobra ações de ministros para influir nas eleições

Gravação foi encontrada no computador de Mauro Cid, ex-ajudante de ordens do ex-presidente, e foi uma das peças que embasou operação da PF. Na reunião, Bolsonaro ordena disseminação de informações falsas e ataca o STF

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A PF quer analisar todo o material apreendido antes de decidir os próximos passos em relação a Bolsonaro

São Paulo – Trecho de gravação de uma reunião de cúpula do governo em 5 de julho de 2022 mostra o então presidente Jair Bolsonaro (PL) instigando ministros a tomar medidas para reverter o processo eleitoral. No vídeo apreendido pela Polícia Federal (PF) Bolsonaro dizia que o então candidato Luiz Inácio Lula da Silva (PT) o derrotaria em sua campanha à reeleição. E sugeria que a situação só poderia ser revertida com um golpe.

“Alguém tem dúvida do que vai acontecer no dia 2 de outubro? Qual é o resultado que vai estar lá às 10 da noite na televisão? Alguém tem duvida disso? Dai vai entrar com recurso no Supremo Tribunal Federal… Vai para puta que pariu, porra. Ninguém quer virar a mesa, ninguém quer dar o golpe, ninguém quer botar tropa na rua, fechar isso, fechar aquilo. Nós estamos vendo o que está acontecendo, vamos esperar o que?”, provoca Bolsonaro.

O vídeo foi encontrado no computador do ex-ajudantes de ordens do ex-presidente Mauro Cid. No ano passado, o também tenente-coronel firmou acordo de delação premiada com a Polícia Federal, no qual contou, entre outras denúncias, que Bolsonaro recebeu uma minuta de golpe preparada pelo então assessor de assuntos internacionais, Filipe Martins, logo após perder as eleições para Lula. O acordo foi homologado pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, que também transcreveu trechos da gravação do encontro do ex-presidente com seus ministros para embasar a operação Tempus Veritatis (Tempo ou Hora da Verdade, em latim), deflagrada ontem (8).

Dinâmica golpista, afirma Moraes

A ação, que teve como alvos ex-presidente e seus ex-ministros militares e ex-assessores, investiga suspeitas de formação de uma organização criminosa que, de acordo com a PF, atuou na tentativa de golpe de Estado, com abolição do Estado democrático de direito para invalidar as eleições de 2022 e manter Bolsonaro no poder. Ao autorizar o cumprimento dos mandados judiciais, Moraes destacou a reunião gravada e divulgada nesta sexta-feira (9) pela imprensa.

“Nitidamente, revela o arranjo de dinâmica golpista no âmbito da alta cúpula do governo, manifestando-se todos os investigados que dela tomaram parte”, registrou. O magistrado também destaca outro trecho do vídeo, que mostra o então presidente ordenando a disseminação de informações fraudulentas para tentar reverter a situação na disputa eleitoral. De acordo com Moraes, todos os participantes ajudaram a difundir as mentiras, como a defesa do voto impresso que visavam colocar em xeque a credibilidade das urnas eletrônicas. Além de ataques ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e aos ministros do STF.

As supostas fraudes nunca existiram. E a lisura do processo eleitoral foi confirmada por autoridades do Brasil e internacionais.

Campanha de mentiras

“Nós sabemos que, se a gente reagir depois das eleições, vai ter um caos no Brasil, vai virar uma grande guerrilha, uma fogueira no Brasil. Agora, alguém tem dúvida que a esquerda, como está indo, vai ganhar as eleições? Não adianta eu ter 80% dos votos. Eles vão ganhar as eleições”, diz Bolsonaro. “Nós não podemos, pessoal, deixar chegar as eleições e acontecer o que está pintado, está pintado. Eu parei de falar em voto imp… e eleições há umas três semanas. Vocês estão vendo agora que… eu acho que chegaram à conclusão. A gente vai ter que fazer alguma coisa antes”, acrescenta.

Outro trecho da gravação mostra ainda Bolsonaro atestando o processo do TSE, mas dizendo ter sido um erro do tribunal chamar as Forças Armadas para integrar a Comissão de Transparência das Eleições. “Eles erraram. Para nós, foi excelente. Eles se esqueceram que sou o chefe supremo das Forças Armadas?”, afirmou.

PF analisa provas

Ontem, ao realizar a operação de busca e apreensão na casa do ex-presidente, a PF ainda encontrou uma carta supostamente redigida por ele. O documento, pronto para ser divulgado em suas transmissões ao vivo e em outros meios de comunicação, também delineava um plano para um golpe de Estado. O teor revelava a intenção de decretar uma Operação de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) e o estado de sítio. Mais um fato que evidencia, supostamente, a participação de Bolsonaro em um golpe de Estado.

Segundo informações apuradas pelo portal g1, o texto, embora não estivesse assinado, corresponde ao discurso no qual o ex-presidente justificaria a ação. Ele se refere à necessidade de uma “virada de mesa”, mesmo termo previamente utilizado pelo general Augusto Heleno também na reunião de julho de 2022. 

Apesar das provas, a PF quer primeiro analisar todo o material apreendido antes de decidir os próximos passos em relação a Bolsonaro. A orientação, segundo o portal, é checar tudo o que foi recolhido para buscar reforçar ou até mesmo aprofundar a linha principal da investigação, de que o ex-presidente participou ativamente da elaboração de uma minuta de decreto golpista, o que ele vinha negando.

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Redação: Clara Assunção


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