Judiciário

STF mantém rito em vigor desde o impeachment de Fernando Collor

Julgamento será concluído nesta sexta-feira. Plenário determina que a Câmara dos Deputados apenas autoriza a abertura do processo, mas cabe ao Senado fazer juízo inicial de instalação ou não do procedimento

Humberto Costa / Ag. Senado

Plenário do STF definiu rito do processo de impeachment, aberto pelo Câmara dos Deputados

Brasília – A sessão do Supremo Tribunal Federal (STF) desta quinta-feira (17) teve mais de cinco horas de duração, mas os trabalhos de julgamento sobre o rito do processo de impeachment ainda não estão totalmente concluídos. Serão arrematados durante sessão extraordinária programada para se realizar nesta sexta-feira (18), a partir das 10h. O último item apreciado determinou que a votação do Senado sobre a abertura ou não do processo (que, uma vez aceito, resulta no afastamento do presidente da República) será feita por maioria simples (a metade do total de senadores, mais um voto), desde que observada a presença absoluta de parlamentares em plenário.

Antes, os ministros já tinham decidido, por oito votos contra três, que é o Senado que tem autonomia para dar o voto final sobre o impeachment após a apreciação da Câmara. Também ficou decidido pelo colegiado que o voto para a comissão precisará ser aberto e não secreto (por seis votos contra cinco); que não é possível a formação de candidaturas avulsas para escolha dos integrantes da comissão (por sete votos contra quatro). E, por fim, que a presidenta Dilma só deverá apresentar sua defesa prévia após a abertura do processo de impeachment (este último, entendimento unânime por parte dos ministros).

Falta ainda ser definido se a chapa já aprovada pela Câmara dos Deputados será anulada ou não e outros detalhes em relação a toda a peça jurídica – embora a esta altura ninguém acredite que os ministros votarão pela sua manutenção. Quando foi votado o entendimento de que a chapa avulsa não deve ser permitida, praticamente todos que acompanharam a sessão entenderam que a votação da chapa formada por articulação do deputado Eduardo Cunha na última semana,  tinha sido cancelada. Mas os ministros, ao final dos trabalhos, preferiram avaliar com calma este item, na sessão de amanhã.

Verdadeiras aulas

O julgamento foi comemorado pelos deputados de vários partidos que se posicionam contrários ao impeachment – e que também atuam contra as manobras regimentais do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). E foi marcado por diálogos entre os magistrados que chamaram a atenção, por terem se traduzido, por vários momentos, em verdadeiras aulas de fundamentação jurídica. Também se destacou por um debate cortês e educado no colegiado, ao contrário de sessões polêmicas observadas anos atrás.

Mas mostrou que os ministros da mais alta Corte do país também divergiram em relação ao tema e deixaram nítida uma preocupação de evitar confrontos com o Legislativo. Tanto que tiveram um cuidado exagerado de explicitar em detalhes os seus votos e mostrar que não pretendiam passar por cima do Congresso Nacional com suas fundamentações, nem decidir todo o rito sem uma análise aprofundada.

Logo que a sessão foi encerrada, as repercussões foram imediatas.  A sensação da maior parte dos parlamentares da base do governo presentes foi de alívio, palavra usada por muitos dos ouvidos logo após o final dos trabalhos. “Estamos aliviados. O julgamento colocou o trem de volta aos trilhos”, afirmou o advogado-geral da União, Luís Inácio Adams.

“Foi uma decisão muito bem fundamentada”, avaliou o líder da Rede na Câmara, Alessandro Molon (RJ). “Agora está mais fácil discutir todo esse processo de forma democrática”, afirmou. Outro a falar foi o advogado do PT, Flávio Caetano, para quem a decisão do STF” agora define as regras do jogo”.

O inverso foi visto por parte dos oposicionistas, que embora desanimados, fizeram questão de deixar claro que vão batalhar pelo impeachment. “O que precisamos é ir para as ruas e tentar atrasar a votação no Congresso. Com certeza a economia vai piorar ainda mais e a população vai registrar isso aumentando a reprovação ao governo. O que influenciará nos votos dos parlamentares”, disse o vice-líder do PSDB, Bruno Araújo (PE).

‘Significado importante’

Um dos momentos considerados mais marcantes do julgamento foi uma declaração da ministra Carmem Lúcia, que acompanhou a primeira divergência aberta pelo ministro Luís Barroso. A magistrada afirmou que, a seu ver, a Constituição de 1988 deu autonomia ao Senado e disse que se a decisão pela abertura do processo de impeachment ficasse apenas com a Câmara dos Deputados, estaria sendo entregue à Câmara “o dever de se autorizar sem a Câmara nada poder fazer”.

Também o ministro Teori Zavascki, relator das ações referentes à operação Lava Jato, destacou que uma das suas maiores preocupações neste julgamento diz respeito ao momento em que se dará o afastamento da presidenta num caso de abertura do impeachment. Por isso, acentuou que a decisão final do Senado sobre a instauração do processo não tem caráter meramente burocrático. “Tem um significado muito importante, muito maior do que aparenta aqui”, acentuou.

Mas quem mudou o ritmo da votação mesmo foi Luís Barroso, quando apresentou seu voto divergente e destacou que “não existe previsão de voto secreto na Constituição”. De acordo com o ministro, quando se olha o regimento interno da Câmara o que existem lá “são dispositivos que tratam da formação de comissões, nenhum deles menciona a possibilidade de votação secreta”.

Decisão unipessoal

“Considero que o voto secreto foi decidido por uma decisão unipessoal, discricionária do presidente da Câmara no meio do jogo. O cidadão brasileiro tem o direto de saber a posição de seus representantes”, afirmou Barroso.

O ministro Luiz Fux foi outro que suscitou debates entre os que acompanharam a sessão, quando afirmou que a jurisprudência não poderia ser realizada para interferir os tramites que já estão em curso.

“É uma violência à segurança jurídica se nós modificarmos o rito adotado depois da Constituição de 1988”, afirmou Fux. “Como quer que se levamos às últimas consequências o regimento da Câmara dos Deputados se prever que nos casos de eleição nós teremos o voto secreto? Nós estaremos contrariando um silêncio eloquente”, acentuou ele, acrescentando que “a publicidade é a regra”.

Ao se manifestar sobre o assunto, logo após o resultado, o deputado Eduardo Cunha disse que vai convocar uma reunião entre os líderes partidários da Câmara na próxima segunda-feira (21), quando já tiver sido concluído em sua totalidade o julgamento do STF.

Cunha disse que é muito cedo para avaliar em detalhes o resultado de hoje, mas deverá questionar o resultado, por meio de embargos junto ao tribunal. E acrescentou que, no caso da chapa avulsa já eleita, “a mesa diretora da Câmara é que tem direito a escolher a comissão e não os líderes partidários”.