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Relatório da PF pode afetar reaproximação entre PT e PSB, e ajudar PMDB

Eduardo Campos demonstrou irritação com vazamento de inquérito, que vem em momento em que se avaliava manter socialistas ao lado de Dilma em 2014, o que poderia dificultar a situação de Temer

Governo Pernambuco

Campos já vinha ensaiando a possibilidade de seguir unido ao PT em 2014

Brasília – Depois de encontros amenos entre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a presidenta Dilma Rousseff com o governador de Pernambuco, Eduardo Campos, e a sinalização de que a aliança existente há décadas entre o PSB presidido por ele e o PT pode ter continuidade, um fato novo ameaça colocar nova água na fervura das costuras políticas para 2014. Campos demonstrou irritação por ter sido divulgado, no último fim de semana, relatório da Polícia Federal que aponta irregularidades em projeto do Ministério da Ciência e Tecnologia para a prefeitura de João Pessoa quando era administrada pelo agora governador.

Os fatos envolvem dois aliados de Campos: o ex-ministro Sérgio Rezende, indicado por ele para a pasta no segundo mandato de Lula, e o então prefeito Ricardo Coutinho. Isso levou o governador a afirmar que as denúncias têm “conotação política”.

Na noite de ontem (22), Eduardo Campos afirmou em tom taxativo: “Ninguém aqui é inocente para achar que não tem interesse político”, ao comentar o caso e negar a existência de irregularidades, inclusive por parte do seu governo. Reiterou também apoio e defesa ao governador da Paraíba, enfatizando que Coutinho está disposto a ajudar no processo de esclarecimento dos fatos.

O relatório da PF, divulgado no sábado pelo jornal Folha de S. Paulo, aponta indícios de superfaturamento em um dos contratos da empresa Ideia Digital, responsável pelo projeto Jampa Digital, de internet grátis para a cidade de João Pessoa (capital paraibana).  O convênio foi firmado com a prefeitura de João Pessoa, então administrada por Coutinho, que renunciou ao cargo de prefeito para disputar o governo estadual em 2010.

Conforme a PF, o projeto teria sido aprovado por meio de emenda parlamentar apresentada pela bancada da Paraíba no Orçamento Geral da União (OGU) da ordem de R$ 18,5 milhões. Desse valor, R$ 1,6 milhão teria sido superfaturado e pelo menos R$ 1,1 milhão, pago a duas empresas fantasmas de publicidade, atribuídas ao publicitário Duda Mendonça – que fez a campanha política de Ricardo Coutinho para o governo estadual.

Já em relação a Pernambuco, o jornal apenas ressalta que a empresa também tem convênios com o governo estadual para programas orçados em R$ 77,2 milhões no total, dos quais R$ 51,2 milhões já teriam sido pagos nos últimos anos.

Emenda parlamentar

Se a denúncia já tinha pego de surpresa os políticos nordestinos, a declaração de Eduardo Campos balançou a bolsa de especulações e apostas dos parlamentares, que se encontram com um pé nos seus estados e outro em Brasília, por conta do período de recesso branco. A forma ostensiva de defesa feita pelo presidente nacional do PSB serviu como deixa para que, na manhã de hoje (23), o vice-governador da Paraíba, o ex-deputado federal Rômulo Gouveia (PSD), também saísse em defesa de si e do governo estadual.

Gouveia, citado no relatório, abriu seu sigilo bancário, o da esposa e do filho e colocou os dados à disposição das autoridades. Destacou que a menção ao seu nome se deu apenas porque foi ele o autor da emenda que apresentou a proposta para o projeto, no Orçamento, mas teria sido “um pedido da bancada”. “A emenda foi apresentada por 12 deputados federais e três senadores da Paraíba, eu apenas fui co-autor. Respeito a Polícia Federal, mas não posso concordar com esse entendimento deles”, acentuou.

O convênio de R$ 6,5 milhões da empresa Ideia Digital com a Prefeitura de João Pessoa foi assinado em outubro de 2009, quando o ministro era Sérgio Rezende (do PSB, indicado por Eduardo Campos). “Vamos procurar acompanhar as investigações com calma, mas é claro que tomaremos uma atitude. Não podemos ficar omissos para um fato tão grave e de ampla repercussão como esse”, afirmou o líder do PSC na Paraíba, deputado estadual Carlos Batinga. “Vamos acompanhar tudo e, dependendo, poderemos até abrir uma CPI, até porque o caso afeta diretamente a campanha eleitoral de 2014”, disse o líder do PMDB paraibano, deputado Raniery Paulino.

Concorrência simulada

O relatório foi enviado na última semana para a Justiça, a Controladoria-Geral da União e o Tribunal de Contas da União (TCU) e corresponde a investigação de um ano e quatro meses da PF. Aponta, também, que as irregularidades foram observadas desde o início do convênio e que a empresa venceu a licitação por meio de esquema fraudulento, em uma concorrência simulada – com a participação empresas formadas pelos próprios funcionários da Ideia e outras, cujos documentos apresentados foram considerados falsos.

O governador paraibano declarou, por meio da Secretaria de Imprensa, que ainda não foi notificado a respeito. Já o publicitário Duda Mendonça, que se encontra fora do país, divulgou por meio do seu advogado, Antonio Carlos de Almeida Castro, que não foi ouvido no inquérito, mas está à disposição da polícia.

Mais do que uma disputa eleitoral regional, o caso começou a repercutir como uma possibilidade real de afastamento entre o governo e o PSB, com a divulgação do relatório da PF. Nas últimas semanas, após encontros com o presidente Lula, informações de bastidores davam conta que Campos estaria sendo cercado por pessoas próximas a ele e ao ex-presidente no sentido de ser convencido a demover da ideia de se candidatar à presidência em 2014.

Vice de Dilma

O governador de Pernambuco teria sido, inclusive, motivo de pretexto utilizado pelos parlamentares da base aliada para reclamar da conduta do vice-presidente Michel Temer (PMDB), que estaria tendo pouco atuante na missão de aproximar mais o governo do Congresso.  Isso porque, uma das alternativas em discussão poderia ser a de Campos vir a integrar a chapa de 2014 como vice de Dilma Rousseff.

Durante jantar de confraternização realizado na casa do presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), na última semana, o deputado Osmar Terra (RS) chegou a dizer textualmente para Temer que ele corre “sério risco” de ser trocado nas próximas eleições. O governador, por outro lado, teria feito um acordo com os candidatos declarados Aécio Neves (PSDB) e Marina Silva (Rede Sustentabilidade) de, se vier mesmo a se candidatar, os três evitarem agressões entre si, em 2014. Em alguns estados, como no caso da Paraíba, o PSDB faz parte da bancada de apoio ao governo estadual, comandado pelo PSB.

Na mesma entrevista em que apontou interesse político por trás da divulgação do relatório pela Polícia Federal, Eduardo Campos afirmou ainda que, assim que tomou conhecimento, no ano passado, de denúncias de irregularidade por parte da empresa Ideia, o governo de Pernambuco suspendeu os contratos e iniciou uma investigação. A conclusão do trabalho sairá dentro de 30 dias, agora que as apurações poderão contar com o resultado do inquérito da PF.

“A minha primeira preocupação sempre é esclarecer. É responder à sociedade com tranquilidade e com presteza”, colocou o governador. No Ministério da Justiça, a assessoria de imprensa divulgou que o ministro José Eduardo Cardozo, a quem é subordinada a Polícia Federal, não costuma comentar sobre esse tipo de declaração.

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