Orçamento de SP volta a tramitar, mas é ‘peça ficcional’, afirma economista

Áreas essenciais como saúde, educação e segurança devem sofrer cortes em 2010, segundo parlamentar da oposição. Serra usa excedentes do orçamento para criar 'vitrine eleitoral'

Parlamentar critica cortes em áreas prioritárias como saúde, educação e segurança pública (Foto: Sxc.hu/Cintia Martins)

Os deputados paulistas já podem voltar a analisar o orçamento do estado de São Paulo. O Tribunal de Justiça revogou a decisão que interrompeu a tramitação do documento no dia 6. Na terça-feira (10), o TJ considerou que deixou de existir razão jurídica para impedir a análise do orçamento.

De volta à pauta da Casa Legislativa paulista, o orçamento de São Paulo é um verdadeiro cheque em branco para o governador José Serra (PSDB-SP), afirmou o deputado Ênio Tatto (PT-SP), membro da Comissão de Finanças da Assembleia Legislativa (AL). “O governo tem 47% de margem para remanejamento”, aponta Tatto.

Uma das manobras possíveis para realocar verbas é a margem de suplementação. Em entrevista à Rede Brasil Atual, o economista Amir Khair alertou que a margem de suplementação em vigor em São Paulo é de 17%, o que permite ao governador alterar a destinação das verbas à vontade. “Com esse índice, o orçamento não representa nada. É uma peça de ficção”, dispara.

Apesar de submeter os planos de gastos, investimentos e receita à Assembleia Legislativa, o governador na prática tem liberdade para manipular o orçamento como desejar.

O ideal, segundo o economista, seria que a margem de suplementação dos estados não ultrapassasse 5%. “A sociedade discute o orçamento, mas o artigo que estabelece a margem de suplementação aniquila tudo”, sustenta Khair.

Segundo Ênio Tatto, ao todo, as manobras para remanejamento do orçamento podem significar liberdade para manipular 47% do valor total. O parlamentar critica também o valor subestimado de crescimento do estado, apontado para 3,5% no orçamento para 2010. “Nos últimos três anos, o estado tem de 6% a 7% de excesso de arrecadação, ou seja, mais de R$ 10 bilhões que, tirando saúde e educação, ficam livres para o governador utilizar como quiser”, lamenta.

“O governador apresenta uma previsão pessimista de crescimento, de um estado que historicamente cresce mais que o país, e depois fica com o excedente em caixa”, resume Tatto. A estratégia, segundo o parlamentar, seria usar os recursos acumulados para montar uma “vitrine eleitoral”.

Educação, saúde e segurança com dificuldades

De acordo com o parlamentar, que acompanhou as audiências públicas sobre o orçamento, o maior problema apontado em todas as regiões é a precariedade da saúde no estado. “A saúde está um caos total”.

Os municípios estão reivindicando a municipalização de hospitais regionais na tentativa de melhorar a situação em suas localidades. “O problema é que o governo passa o hospital, mas não os recursos”, reclama. Mas, a situação deve piorar porque no orçamento para o próximo ano consta um corte de 35% na pasta, admite o deputado.

Na área de educação, em que apenas investimentos federais estão previstos, a situação também deve ser mais difícil que em 2009. “Do jeito que o governo planejou 2010, não há dinheiro para qualquer tipo de reforma, ampliação, nada”.

Ele cita o caso de 3 a 4 mil jovens do Grajaú, zona sul da capital paulista que, por falta de escolas na região, têm de viajar uma hora e meia de ônibus até outra região para terem aula. E o mesmo tempo de volta.

Investimentos em estradas vicinais também sofreram cortes e devem causar problemas para escoamento da produção, transporte de estudantes e deslocamento de trabalhadores entre cidades. “A população usa muito as vicinais que não são aquilo que se vê nas autoestradas paulistas”, compara. As vias menos movimentadas estão em péssimas condições, segundo o deputado.

Com os investimentos do governo federal nas áreas de habitação e saneamento, o estado também fez cortes nessas áreas para 2010. “São Paulo está cada vez mais dependente de recursos federais. É só olhar o que foi realizado este ano e o que está previsto para o ano que vem”, suscita.

A área de segurança pública também perdeu investimentos. Já o funcionalismo parece ser a última prioridade do governo, relata Tatto. “ O secretário de planejamento não cansa de repetir, que depois do investimento em outras áreas, o que sobrar ele vai ver o que pode fazer para o funcionalismo”, finaliza.