Sinais de prevaricação

Luciana Santos exonera diretor do Museu Goeldi nomeado por Bolsonaro no apagar das luzes

A ministra da Ciência, Tecnologia e Inovações exonerou o bolsonarista Antônio Carlos Lobo Soares. O agora ex-gestor, nomeado 40 dias antes do fim do governo que apoiava, atropelou um processo seletivo em andamento

Roberto de Vasconcellos/Commons Wikimedia
Roberto de Vasconcellos/Commons Wikimedia
Mais que um centro de memória e exposições, o Museu é centro produtor de ciência. E tem banco de óleos essenciais da Amazônia cobiçado pela indústria farmacêutica

São Paulo – A ministra da Ciência, Tecnologia e Inovações, Luciana Santos, exonerou o diretor do Museu Paraense Emílio Goeldi, Antônio Carlos Lobo Soares. O agora ex-gestor havia sido nomeado pelo então presidente Jair Bolsonaro (PL) a 40 dias do fim do governo. A exoneração foi publicada na sexta-feira (13) no Diário Oficial da União. A nomeação do bolsonarista se deu em meio a indícios de prevaricação.

No primeiro semestre de 2022, o apoiador de Bolsonaro enviou ofício ao então titular do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCTI), o hoje senador eleito Marcos Pontes (PL-SP). Na carta, dizia que Pontes deveria constituir um “Comitê de Busca alinhado com os valores e as diretrizes do atual governo federal, a fim de que distorções ideológicas não venham a produzir uma direção incapaz de efetuar as mudanças que o Museu Goeldi necessita para se conservar, fortalecer e modernizar”.

No documento, o servidor do museu também apresentou “credenciais” para o cargo, o que sugere a prática de prevaricação. Trata-se de um crime praticado quando o servidor público adota medidas para satisfazer interesse pessoal.

Lobo Soares foi escolhido e nomeado em meio ao período eleitoral, tornando-se alvo de críticas da comunidade científica. Isso porque o processo de seleção para o cargo de diretor do segundo maior museu do país estava aberto desde março; o Goeldi só fica atrás do Museu Nacional, do Rio de Janeiro. Mais do que um espaço de exposições, figura entre as principais instituições produtoras de ciência e conhecimento sobre a Amazônia.

Museu concentra ciência produzida na Amazônia

A exoneração foi bem recebida. “Encaro com naturalidade que a atual ministra tenha considerado inadequado um processo como o que escolheu o diretor do Museu Goeldi. Afinal, a gestão será integralmente durante o governo eleito e empossado. A nomeação aconteceu numa fase de transição de governo em que todas as novas nomeações deveriam estar suspensas”, disse à RBA a pesquisadora Ima Célia Vieira, que integrou o grupo temático de Ciência e Tecnologia do governo de transição.

A cientista, que já dirigiu o Museu Goeldi, disse que é um grande desafio estar à frente de uma instituição de pesquisa desse nível. “Manter o protagonismo da ciência feita na Amazônia nos debates e propostas para a região exige muita responsabilidade. Um diretor tem que conhecer bem os problemas da região e ser capaz de aglutinar pesquisadores e toda a gama de profissionais engajados em processos de educação e comunicação da ciência em torno de programas e projetos estratégicos para a Amazônia e a ciência nacional”, disse.

Mas não é só isso. Precisa também ter a capacidade de conduzir a instituição de forma democrática, inclusiva e com interação com a multiplicidade dos públicos abrangidos pela instituição. “Um diretor sem reconhecimento, clareza das questões-chave para a Amazônia e liderança científica nos campos de atuação do Museu Goeldi torna a instituição vulnerável. E sem representação nos fóruns de discussão científica ou de políticas públicas para ciência e a Amazônia”, afirmou.

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