Premiação

Defesa de direitos humanos reúne magistrados, professores, estudantes e ativistas

Premiados em solenidade de hoje destacaram importância da cidadania, da continuidade das ações em curso e do cumprimento de acordos internacionais que tenham Brasil como signatário

Brasília – Magistrados, professores, assistentes sociais, jornalistas, advogados, ativistas populares estiveram reunidos hoje (11), imbuídos de um propósito: todos eles representaram um único grupo, durante solenidade no Palácio do Planalto. Foram homenageados com o Prêmio Nacional dos Direitos Humanos pelos êxitos de ações, campanhas e trabalhos que desenvolveram junto ao setor, tanto na promoção de políticas públicas que levem à redução das desigualdades, como também em denúncias contra abusos e maus-tratos cometidos contra brasileiros. E cada um dos agraciados tem uma história própria para contar.

O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Ricardo Lewandowski, contemplados pelo combate à tortura nos presídios, não falou oficialmente durante a solenidade, mas foi um dos principais destaques da edição deste prêmio. Lewandowski é responsável pelo trabalho iniciado e coordenado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) – órgão que sempre é presidido pelo presidente do STF – de audiências de custódia.

Implementadas pelo Judiciário de todo o país por meio de legislação sancionada no ano passado, as audiências determinam que os presos sejam submetidos à presença de um juiz até 24 horas após a detenção. E esse novo rito reduziu, de forma significativa, práticas de tortura observadas nos presídios e abusos cometidos com as chamadas prisões provisórias.

Para se ter uma ideia, antes desta obrigatoriedade de audiências de custódia, o CNJ chegou a constatar casos de dezenas de pessoas presas em caráter provisório (que deveriam permanecer, no máximo, por dois meses detidos – de acordo com a legislação penal vigente até hoje). Mas eles terminaram por mais de dois anos em presídios, sem que tivesse sido aberto qualquer processo sobre os casos que os levaram à detenção.

De acordo com o ministro Lewandowski, tais audiências, por motivos como esses, representam “um importante passo do Estado brasileiro no combate à cultura do encarceramento e de abusos policiais durante a prisão”. “De um simples ato processual pode decorrer mudança dos eixos e paradigmas em que se fundamentam a atuação de juízes e atores do sistema de justiça criminal”, afirmou.

Para Lewandowski, além de fazer valer a Constituição quanto aos direitos dos presos, o projeto também dá concretude a tratados internacionais em direitos humanos dos quais o Brasil é signatário, o que ele considerou como um gesto importante para o país.

Multiplicadores de dignidade

Outra premiada, a professora Lourdinha Nunes, do grupo de Educação e Cultura em Direitos Humanos do Piauí, ressaltou a relevância do trabalho realizado pela equipe que integra. E disse que a educação em direitos humanos, a seu ver, é um eixo básico para a dignidade das pessoas. O trabalho dos piauienses também foi considerado pioneiro no repasse de conhecimento ao setor para professores e multiplicadores e pelo êxito do programa elaborado por eles. “Atuamos de forma a dar, a partir do Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos, orientações para que essas ideias sejam levadas adiante”, explicou.

Já as assistentes sociais Glória Avelar e Cristiana Moreira, que participaram da solenidade acompanhando grupos quilombolas homenageados com o prêmio pelo programa de Garantia dos Direitos da População Indígena, Quilombola e dos Povos e Comunidades Tradicionais, demonstraram preocupação com a continuidade dos trabalhos. Na avaliação de Glória Avelar, as ações realizadas nessas duas décadas mostram resultados constantes e refletem o avanço nas políticas de direitos humanos no país, que passaram a ter voz e protagonismo. “Se estamos aqui comemorando tantos feitos, é porque também houve uma mudança de postura por parte do Estado, que precisamos ajudar a continuar”, ressaltou ela.

O jornalista Leonardo Sakamoto, autor do Blog do Sakamoto, também foi premiado. No seu caso, pelo trabalho de divulgação de crimes contra direitos humanos e as políticas públicas implementadas para o setor, ao longo dos anos. Sobretudo, ações de combate ao trabalho escravo e denúncias de empresas flagradas cometendo esta prática.

Em texto divulgado em seu site, Sakamoto declarou: “O mundo está em convulsão, com guerras, ataques terroristas, crises migratórias, catástrofes ambientais. O Brasil passa por um período sombrio, com um governo e uma oposição ruins e o pior Congresso Nacional de todos os tempos – que está aprovando leis que retiram, à luz do dia, direitos de trabalhadores, mulheres, populações tradicionais, minorias. Contudo, é exatamente nestes momentos, que precisamos nos lembrar da caminhada que nos trouxe até aqui. Para ter a clareza que, mais importante do que reinventar todas as regras, é tirar do papel, pela primeira vez, a sociedade que um dia imaginamos frente aos horrores da guerra ou da ditadura. O que só se fará com muito diálogo e a garantia desse quinhão mínimo de dignidade que todos têm direito por nascerem humanos”.

Contemplados

O prêmio foi entregue a 18 homenageados: Coletivo Margarida Alves de Assessoria Popular; grupo Direito à Memória e à Verdade: Memorial da Resistência de São Paulo; o trabalho de prevenção e combate à tortura do ministro Ricardo Lewandowski; programa de Combate e Erradicação ao Trabalho Escravo, que teve como representante Brígida Rocha dos Santos; o programa Pátria Educadora – Educação e Cultura em Direitos Humanos, do Comitê Estadual em Direitos Humanos do Piauí, e o trabalho em comunicação e Direitos Humanos, desenvolvido por Leonardo Sakamoto.

Também foram agraciados o Programa de Garantia dos Direitos da População em Situação de Rua, da Clínica de Direitos Humanos Luiz da Gama, da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP); o Programa Segurança Pública, Acesso à Justiça e Combate à Violência, da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) na seccional do Paraná; o ativista Rad Assis Brasil Ugarte, por desenvolver ações de promoção e respeito à diversidade religiosa e o Projeto de Expressão de Gênero da Infância à Juventude e Faces da Homofobia, desenvolvido pela Escola de Educação Básica Coronel Antonio Lehmkuhl.

O terceiro grupo de contemplados com o prêmio é formado pela Secretaria de Direitos Humanos de Minas Gerais, pela implementação do programa de acesso à documentação civil básica. Também foi agraciada uma das responsáveis pelo trabalho de garantia dos direitos da criança e do adolescente, Tiana Maria, já morta (o prêmio foi entregue ao seu filho); além da Associação de Comunicação Educativa Roquette Pinto; a prefeitura de Caruaru; a Coordenação Nacional das Comunidades Quilombolas e a Rede Thydêwá.

As ativistas Edusa Pereira e Silvana Veríssimo receberam o prêmio, cada uma, por ações nas áreas de garantia dos direitos da pessoa idosa e da igualdade racial. E foi concedida, ainda, uma menção honrosa ao projeto Respeitar é Preciso, que consiste numa parceria entre o Instituto Vladimir Herzog e a prefeitura de São Paulo.