legislativo

Congresso abre a semana sem saber se entra em recesso

Da agenda positiva, muita matéria foi votada com seu teor modificado por deputados e senadores e muito foi adiado para agosto. Recesso ainda depende de apreciação da LDO

Gabriela Korossy/Câmara dos Deputados

Câmara dos Deputados, a meio caminho entre cumprir expectativas da sociedade e entrar em férias

Brasília – A população foi às ruas pedir e os parlamentares demonstraram avidez para votar uma agenda positiva para o país, mas embora vários dos clamores tenham sido acatados, o Congresso começa a semana sem saber se entrará oficialmente em recesso e com um saldo nada positivo. Das várias matérias apreciadas no último mês, conforme avaliação dos próprios deputados e senadores, muitas terminaram ou maquiadas para parecer que as manifestações foram ouvidas (caso do projeto que propunha a extinção de suplentes no Senado), ou ficaram com votação terminativa adiada para o segundo semestre.

Isso porque, entre os atrasos, destaca-se a apreciação do projeto da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) que, por conta de um dispositivo constitucional, se não for votada até o dia 17 de julho de cada ano, impede Câmara e Senado de entrarem em recesso. Como a maioria dos deputados e senadores consideram praticamente impossível uma matéria tão complexa vir a ser discutida em apenas três dias, é tido como certo que as próximas duas semanas de julho serão de sessões não deliberativas, onde os parlamentares poderão fazer discursos e homenagens no plenário, caso haja quórum para isso – numa espécie de recesso branco.

O momento não é de se pensar em dias de folga. Vamos ter como retorno uma enorme frustração por parte da população”, afirmou o deputado Danilo Forte (PMDB-CE), relator do parecer da LDO na Comissão Mista de Orçamento. “Já deixamos de votar alguns projetos importantes e se optou por textos incompletos, como o da suplência de senadores. Parar agora será desastroso para a imagem do Congresso”, completou o senador Randolfe Rodrigues (PSol – AP).

Falta de acordo

Toda a polêmica em razão da LDO reside no fato da matéria, além de ser amplamente debatida sempre que entra em apreciação, não contar com um acordo dos líderes partidários e, ainda por cima, estar atrelada ao projeto de orçamento impositivo, que vincula ao Orçamento da União a obrigatoriedade de serem destinados recursos para emendas parlamentares. Como o projeto de orçamento impositivo selaria uma esperada independência dos parlamentares em relação ao Executivo e é visto com cautela pelo Palácio do Planalto, deputados da base aliada vinham articulando para que o mesmo demorasse a tramitar.

Mas tamanha demora atrasou, em consequência, a votação da LDO. O parecer do relator está pronto para ser lido há quatro semanas, mas questões como a reforma política, a possibilidade de realização ou não de um plebiscito, a sessão conjunta para análise sobre o rito de apreciação dos vetos presidenciais e a votação das outras matérias da agenda positiva levaram a cancelamentos das reuniões da Comissão de Orçamento.

Houve pouco interesse para que se votasse a LDO e agora temos que correr atrás do prejuízo para ver o que pode ser feito”, enfatizou Forte. “O momento pede um esforço do Congresso. Não podemos ir para casa depois de tanto que se disse sobre a urgência de se votar matérias pedidas por todo esse clamor popular”, acentuou o deputado Beto Albuquerque (PPS-RS).

Barbaridades e desastre’

Para o senador Renan Calheiros (PMDB-AL), que fez um discurso inflamado na última quinta-feira elogiando a pró-atividade da Câmara e do Senado, a missão teria sido cumprida. Calheiros, numa espécie de balanço, frisou que nas duas semanas foram votados, somente no Senado, 17 Projetos de Lei (PLs) e sete Propostas de Emenda Constitucional (PECs). Esse saldo não é, porém, visto por muitos senadores como resposta verdadeira às manifestações.

Grandes barbaridades foram votadas. Estamos aprovando coisas que são absolutamente irresponsáveis, sem uma discussão apropriada. Espero que os parlamentares avaliem bem nossas próximas agendas, para que as matérias sejam melhor debatidas”, reclamou o senador Delcídio Amaral (PT-MS), ao chamar a atenção para o fato de matérias aprovadas não terem sido objeto de estudo adequado por parte do governo e virem a comprometer o planejamento fiscal e as contas públicas, num período difícil para a economia do país. Amaral já acha o oposto em relação ao recesso. Considera que, da forma como as votações têm sido observadas, é preferível que os parlamentares parem um pouco para pensar melhor como agir daqui por diante.

O pedido das ruas foi bom e deveria acontecer sempre, mas o Congresso não pode, em razão disso, votar as matérias sem uma discussão mais estabelecida, sem a apreciação correta. O trabalho feito dessa forma, tão açodado, só prejudica a imagem do parlamento”, pontuou também o senador Cristovam Buarque (PTB-DF). “Foi maquiagem pura. Fizeram estardalhaço para votar matérias tidas como importantes e que não foram pedidas nas passeatas. No entanto itens tão solicitados, como o projeto que pede a imediata cassação de políticos condenados pelo Supremo Tribunal Federal (STF) foram empurrados com a barriga”, bradou, por sua vez, o senador Jarbas Vasconcelos (PMDB-PE).

Os exemplos são os mais variados. O projeto referente às suplências, por exemplo, tinha como objetivo extinguir esses cargos no Senado. Depois de terem derrubado a matéria, já alvo de críticas na imprensa e mídias sociais, os senadores resolveram voltar atrás e aprovar uma nova versão do texto. Na versão aprovada pelo plenário, os parentes dos candidatos a senadores passam a ser proibidos de integrar chapas eleitorais como suplentes. Também fica reduzido o número de suplentes, de dois para um – mas a extinção, de fato, não acontecerá. Pequeno detalhe: atualmente 16 dos senadores que votaram a proposta ocupam a vaga em substituição aos titulares eleitos para a Casa.

O mesmo aconteceu com uma primeira das propostas da chamada agenda positiva: a distribuição dos royalties do petróleo para o setor de Educação. A matéria alterada pela Câmara e votada em caráter de urgência para fazer valer a voz das ruas sofreu novas alterações no Senado. De volta à Câmara, foi mudada outra vez e virou objeto de muita briga na última quarta-feira. Por conta disso, ficou de vir a ser colocada na pauta desta semana, mas ainda não há garantias quanto a isso.

Da mesma forma, o projeto do passe livre estudantil, ensaiado para ir a votação por mais de duas vezes, terminou ficando adiado para agosto, assim como o fim do foro privilegiado para parlamentares e o projeto do Plano Nacional da Educação (que destina 10% do Produto Interno Bruto (PIB) para a Educação). Também ficou adiada para agosto a PEC que aumenta gastos com a Saúde Pública, o projeto que acaba com o fim do foro privilegiado para os políticos, o Código de Mineração e a votação em caráter terminativa do PL que acaba com o voto secreto.

Trabalho hercúleo

Na programação desta semana, os presidentes das duas Casas e os líderes dos partidos pretendem fazer um esforço hercúleo para apreciar o Marco Civil da Internet – que chegou a ir quatro vezes a votação em plenário e foi retirado de pauta por falta de um consenso entre os deputados sobre o teor da matéria. Também querem terminar o semestre do Congresso votando o projeto que transforma corrupção em crime hediondo em caráter terminativo (uma vez que já foi aprovado pelo Senado).

No Senado, a grande expectativa é a audiência pública programada para a próxima terça-feira com o jornalista Glenn Greenwald, do jornal britânico The Guardian. Foi ele quem divulgou informações repassadas pelo ex-técnico da agência de segurança americana (NSA), Edward Snowden, sobre instalação de uma base norte-americana em Brasília para monitoramento das comunicações do país, por parte dos Estados Unidos.

E há, ainda, na Câmara, reuniões das comissões de reforma política e de minirreforma tributária agendadas, respectivamente, para terça-feira e quarta-feira. “Temos que saber quem são os parlamentares da base aliada que estão contra o governo e quem são os que o apoiam. Assim não é possível”, disse em tom de irritação, o líder do PT na Câmara, José Guimarães, ao criticar tantas divergências entre deputados e senadores da mesma coligação partidária. Guimarães ainda tem esperanças de conseguir recolher assinaturas para a apresentação de um projeto de decreto legislativo pedindo a realização de um plebiscito para valer em 2014.

Nem os deputados da base aliada acreditam que isso seja mais possível. Uma curiosidade: hoje, existem 442 propostas de consulta popular em tramitação na Câmara dos Deputados, para os mais diversos assuntos – desde casamento entre pessoas do mesmo sexo à criação de novos estados. “Em meio às dúvidas, num Congresso com tantas contradições à mostra, o certo é que, votando ou não matérias sobre todos os temas reivindicados, ao menos a população passará a ser mais ouvida daqui por diante”, avaliou a cientista política e professora da Universidade de Brasília (UnB), Cynthia Ferreira.

O que o Congresso quer se esforçar para votar esta semana:

Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO)

Orçamento Impositivo

Royalties para Educação

Marco Civil da Internet

PL que tipifica o crime de corrupção como hediondo

Projetos da agenda positiva adiados para votação só em agosto

Cassação de parlamentares condenados pelo STF

Passe livre estudantil

Fim do foro privilegiado para parlamentares

Plano Nacional de Educação (PNE)

PEC que aumenta gastos com a saúde pública

Votação em caráter terminativo do PL que acaba com o voto secreto

 

Matérias que foram – ou podem vir a ser – votadas com alterações radicais:


Suplências no Senado


O projeto objetivava extinguir esses cargos. Foi rejeitado. Um dia depois, os senadores voltaram atrás e aprovaram uma versão de meio termo: continuam os suplentes, mas em vez de dois, só poderá existir um. E parentes de senadores não poderão ocupar suplência.  


Distribuição de 75% dos royalties do petróleo para a Educação


A Câmara alterou o texto do Senado conforme a mensagem das manifestações nas ruas. O Senado mudou uma segunda vez o texto, que retornou para a Câmara. Ainda não se sabe de quanto ficará o percentual dos royalties para o setor, enquanto a discussão não for encerrada.


Crime hediondo


O projeto foi aprovado pelo Senado, mas na Câmara há grupos de parlamentares que acham que podem ser feitas alterações ao seu teor.


Voto secreto


Existem dois projetos em tramitação: no Senado, foi aprovado o texto que acaba com o voto secreto de uma vez por todas. Alguns parlamentares são simpáticos à ideia de segurar esse projeto para que seja votada na Câmara matéria que determina o fim do voto secreto apenas em caso de cassação de parlamentares, pelo fato de ter um teor mais brando.

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