Crise

Caso Delcídio explode em momento ‘estratégico’

Prisão de senador aconteceu em momento em que economia começava a dar sinais de recuperação, notícias positivas apareciam no noticiário e Dilma obtinha vitórias no Congresso

Geraldo Magela/Agência Senado/fotos públicas

Para economista, bomba Delcídio apareceu em momento oportuno para quem não quer ver o país dar certo

São Paulo – A bomba que explodiu no cenário político do país no dia 25 de novembro, com a prisão do senador Delcídio do Amaral, mostra que a crise econômica que toma conta das manchetes do país é decorrência de uma crise política que não se dá por acaso. “Tudo isso mostra, realmente, que a questão é política. Quem Delcídio é, já era de conhecimento público há muito tempo. Mas por que soltaram essa bomba justo agora? Era um momento estratégico”, avalia o professor de Relações Internacionais da Universidade Federal do ABC (UFABC) Giorgio Romano Schutte.

Entre as notícias catastrofistas de hoje (2), o destaque é a retração do PIB – que encolheu 1,7% no terceiro trimestre em relação ao anterior. Mas uma informação também trazida por veículos da “grande imprensa”, embora com menos destaque, se sobressai: a dos enormes impactos da Operação Lava Jato na recessão, o que economistas ouvidos pela RBA desde o fim de 2014 e durante este ano, como Luiz Gonzaga Beluzzo e o próprio Giorgio Romano, já previam.

O professor da UFABC sugere que a bomba Delcídio apareceu em um momento oportuno, politicamente, a setores que não querem ver o país dar certo, pelo menos com o governo Dilma Rousseff, exatamente quando a crise parecia estar lentamente dando lugar a boas notícias, que começavam a surgir na economia. Ele cita como paradigma dessa interpretação a edição do jornal Valor Econômico do dia 19 de novembro.

Naquela data, a manchete do diário foi: “Medidas começam a dar algum alento à economia”. A matéria informava que, segundo o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, estava naquele momento em discussão a possibilidade de os estados emprestarem recursos com os quais poderiam criar fundos de garantias para Parcerias Público Privadas, o que “poderia estimular investimentos em infraestrutura” e, consequentemente, abrir um caminho para o crescimento.

Outra informação era de que o governo também estaria estudando o aumento de alíquotas de importação de aço em defesa da indústria brasileira do segmento, que passa por dificuldades. Por conta disso, as ações da Usiminas (14,6%) e CSN (17%) subiram expressivamente. Esse cenário e vitórias do governo no Congresso, principalmente com a manutenção de vetos importantes de Dilma, apontavam para um cenário desanuviado e um fim de ano menos tenso.

Schutte lembra ainda o licenciamento de Belo Monte e a aprovação da MP 688/2015, que permite novos leilões de usinas hidrelétricas, além do acordo (em agosto) entre a Petrobras e a empresa Sete Brasil (que fornece sondas para se chegar ao petróleo na camada do pré-sal) como notícias muito positivas no cenário econômico.

Mas, com o episódio Delcídio, todo esse cenário voltou a ficar atrás de nuvens escuras. “É uma bomba que vai ter um impacto enorme, paralisou tudo. Envolveu um banco, o Pactual, que está vendendo ativos, tentando sobreviver, com grande queda das ações, e, para piorar, ninguém sabe o que Delcídio e (Nestor) Cerveró vão falar.”  Para ele, o fato de o banco Pactual ter caído na malha da Operação Lava Jato, com a prisão do banqueiro André Esteves, torna a crise ainda mais grave. “O banco tinha negociações com o governo, fez várias operações de interesse do governo. Agora só falta dizerem que Esteves é amigo do Lula.”

Para Schutte, se não fosse essa nova conjuntura política explosiva, a alteração da meta de superávit, objeto de batalha no Congresso, por exemplo, “iria passar com certa facilidade”. “Fora isso, a reprovação da Dilma tendia a cair, assim como o número de pessoas que realmente querem o impeachment.”

Para Thomas Heye, professor do Instituto de Estudos Estratégicos da Universidade Federal Fluminense, “a crise econômica está sendo alimentada pela crise politica”. Em sua avaliação, há ainda um problema adicional. “Como se resolve uma crise política? Com política. O problema é que a tarefa fica a cargo da presidente Dilma, que detém muito poder no nosso sistema político, mas a mandatária não tem tido muito sucesso nesse sentido.”

As crises, lembra, são alimentadas por fatos novos, e o caso Delcídio é um “que não tem como ignorar, é combustível na crise”. “Se não acontece nada, a crise começa a se diluir no cotidiano, mas quando há um fato novo como esse a coisa reacende numa velocidade absurda. Se há um desastre ambiental ou qualquer outro fenômeno, o leitor põe na conta da Dilma. Tudo de ruim que acontece a culpa é dela.”

Heye diz que, diante desse cenário, não está otimista. “Há duas alternativas no horizonte. Uma é Dilma sair agora, mas isso, politicamente, é muito traumático. A outra alternativa é esperar as próximas eleições, e aí sabe-se lá como estará o país daqui a três anos.”

Na opinião de Thomas Heye, os efeitos da atual crise podem se prolongar até a próxima década, e o governo tem responsabilidade sobre isso. “Expandir a base econômica através do consumo não foi uma das ideias mais inteligentes. Existe um fenômeno social que nos acostumamos a ver no Brasil: na periferia das grandes cidades, o cara está morando num barraco, mas tem televisão, freezer, celular, só que não tem serviço público, não tem educação, segurança e transporte. Tem um celular de última geração, mas se precisar de assistência médica, não tem.”