Repúdio a Bolsonaro

Barroso: ‘Dirigentes brasileiros, hoje, não são bem-vindos em nenhum país democrático’

Na última sessão como presidente do TSE, ministro diz que ataques ao sistema eleitoral são “repetição mambembe do que fez Donald Trump nos Estados Unidos”

Reprodução/Youtube
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Desacreditar o processo eleitoral é "estratégia das vocações autoritárias em diferentes partes do mundo", lembrou Barroso, que deixou hoje a presidência do TSE

São Paulo – Ao presidir a última sessão como presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), nesta quinta-feira (17), o ministro Luís Roberto Barroso despediu-se manifestando repúdio ao comportamento de Jair Bolsonaro, que desde o primeiro dia de seu mandato atacaou o sistema eleitoral e a democracia. “Uma das estratégias das vocações autoritárias em diferentes partes do mundo é procurar desacreditar o processo eleitoral, fazendo acusações falsas e propagando o discurso de que ‘se eu não ganhar, houve fraude’”, declarou, sem citar nomes.

“Trata-se de repetição mambembe do que fez Donald Trump nos Estados Unidos, procurando deslegitimar a vitória inequívoca do seu oponente e induzindo multidões a acreditar na mentira”, continuou Barroso. No trecho, o ministro se referiu à invasão do Capitólio. Em 6 de janeiro de 2021, uma multidão de manifestantes incentivados pelo então presidente Trump invadiu o Congresso dos Estados Unidos, promovendo depredações e ataques a seguranças, na maior ameaça à democracia americana da história moderna.

Em referência ao isolamento do presidente brasileiro no mundo e sua péssima reputação entre líderes democratas, mas também sem citá-lo diretamente, Barroso afirmou: “Não é de surpreender que dirigentes brasileiros não sejam, hoje, bem-vindos em nenhum país democrático e desenvolvido do mundo. E nos eventos multilaterais, vagam pelos corredores e calçadas sem serem recebidos, acumulando recusas e pedidos de reuniões bilaterais”, disse.

Nesse trecho, o ministro aludiu à rocambolesca passagem de Bolsonaro por Nova York em setembro do ano passado, por ocasião da Assembleia-Geral da ONU, quando andava pelas salas de recepção sem que nenhum outro chefe de Estado quisesse conversar com ele. Na mesma viagem, o presidente brasileiro comeu  pizza na calçada de um estabelecimento que não permitia a entrada de pessoas não vacinadas

Voto impresso

Barroso também criticou a obsessão de Bolsonaro pelo voto impresso, dizendo que “boa parte do ano de 2021 foi gasto com uma discussão desnecessária, que significaria um retrocesso: a volta do voto impresso”. Ele lembrou que “as provas (de que o sistema eleitoral permite fraudes) não foram apresentadas porque simplesmente não existem”.

O ministro mencionou ainda a revolução digital iniciada no século passado, caracterizada pela “massificação da informação”. Apesar de democratizar a difusão da informação, os meios eletrônicos permitem os preocupantes “disfarces para mentiras e notícias fraudulentas da época da pós-verdade”.

Sobre as redes sociais e aplicativos de mensagens, Barroso disse que, apesar dos fatores positivos, há um “componente extremamente negativo: a circulação de campanhas de ódio e desinformação, veiculação de mentiras deliberadas, teorias conspiratórias, ataques às instituições”.  

“Passado sombrio”

Segundo ele, em razão da experiência adquirida na eleição de 2018, o TSE montou “estratégia de guerra” para enfrentar desinformação voltada contra o processo eleitoral em 2020. Entre outras medidas, a corte criou uma coordenação digital de combate à desinformação; uma parcerias com mídias sociais e aplicativos de mensagens e com agências de checagens de noticias; e a celebração de acordo com provedores de internet. Na última terça (15), o TSE assinou acordos com oito plataformas digitais para combater a disseminação de notícias falsas no período eleitoral. 

O ministro Edson Fachin, que vai suceder Barroso na presidência, também discursou. Ele elogiou a gestão do colega e sua atuação transparente “mesmo quando as ameaças de um passado sombrio não tão longínquo nos rondaram dia e noite”.