Disputa na Câmara

Favorito, Eduardo Cunha oficializa candidatura e consolida poder regional

Cunha tem repetido que não é candidato 'nem do governo nem da oposição'. Suas propostas representam aumento considerável no orçamento do Legislativo, mas atendem à vaidade e a pleitos antigos dos deputados

CC / Arquivo Câmara / Reinaldo Ferrigno

Eduardo Cunha, representante máximo do ‘morde-e-assopra’ da relação entre o PMDB e o governo federal

Brasília e Rio de Janeiro – Na tarde desta terça-feira (2), o deputado federal Eduardo Cunha (PMDB-RJ) oficializará sua candidatura à presidência da Câmara. Antes, terá em Brasília um almoço com cerca de 200 deputados que integram a Frente Parlamentar do Agronegócio (FPA). A pajelança será na residência do deputado Marcos Montes (PSD-MG), presidente da frente, e servirá para que o grupo anuncie oficialmente seu apoio a Cunha, em um acerto que, somado ao também confirmado apoio da bancada evangélica, poderá ser decisivo para a vitória do parlamentar fluminense na eleição do início de fevereiro.

O lançamento oficial da candidatura será às 18h, horário insólito diante da disposição apresentada por Cunha para se dedicar à votação do projeto que altera as metas de superávit, que prometeu ajudar a aprovar. Mas, por outro lado, é garantia de que será ouvido pelos colegas. Nos bastidores, o lançamento é visto como um fortalecimento da sua articulação e, ao mesmo tempo, da apresentação de propostas de cunho corporativista entre os deputados.

Eduardo Cunha, que se coloca como candidato independente do governo, tem prometido nas conversas com as bancadas, se for eleito presidente, trabalhar para equiparar o salário dos deputados com o dos ministros dos tribunais superiores. Pretende, também, construir um novo prédio, que seria o quinto anexo da Casa – como forma de ampliar o espaço dos gabinetes destinados aos parlamentares – e, ainda, estender a cobertura jornalística da TV Câmara para as atividades dos deputados em seus estados.

Todos esses itens representarão aumento considerável no orçamento do Legislativo. Por outro lado, atendem à vaidade e a pleitos antigos dos deputados. “São questões naturais, que não interferem no trabalho da Casa. Desde quando salário de deputado é o fator de componente do ajuste fiscal?”, questionou Cunha.

Se antes já era absoluto na Câmara – sobretudo no baixo-clero – graças a seu papel de articulador de acordos políticos e recursos de campanha eleitoral, ele agora parece se consolidar como uma figura de primeiro time no PMDB, embora não seja tão próximo politicamente do presidente nacional do partido e vice-presidente da República, Michel Temer. Prova disso foi a reunião realizada em 26 de novembro na casa do influente deputado e ex-governador Newton Cardoso (PMDB-MG), na qual estiveram presentes diversas lideranças regionais de peso do PMDB, entra elas o atual presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN). Em meio às promessas de campanha, Cunha ouviu dos correligionários até mesmo que poderá ser o nome do partido para disputar o Palácio do Planalto em 2018.

Parece exagero, mas nem tanto, quando se conhece o modo desenvolto de fazer política de Eduardo Cunha. “Perseguido” pela imprensa desde o fim dos anos noventa, quando seu nome começou a aparecer em irregularidades cometidas em duas companhias públicas estaduais – Telerj e Companhia Estadual de Habitação (Cehab) – durante o governo do então aliado Anthony Garotinho no Rio de Janeiro, Cunha não somente sobreviveu politicamente como continuou a arregimentar as forças que o permitiram chegar primeiro à Câmara, depois à liderança do PMDB, e agora construir uma candidatura que começa a assumir ares de imbatível para a presidência da casa.

A plataforma de campanha de Cunha agrada em cheio à maioria dos deputados. Entre as promessas apresentadas pelo peemedebista se encontram desde antigas reivindicações do baixo-clero, como a construção do novo prédio anexo, até desejos dos líderes de bancada, como a cobertura pela TV Câmara das atividades dos parlamentares em seus estados de origem. Cunha promete ainda aos colegas “fazer a reforma política”, embora não especifique qual modelo defende, e há também as propostas claramente corporativistas, como a adoção de emendas parlamentares impositivas ao Orçamento da União e a equiparação salarial dos deputados com os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF).

Dilma

Detestado por Dilma Rousseff, segundo interlocutores da presidenta, Eduardo Cunha, como líder do PMDB e da base aliada, levou ao extremo o papel de “morde-e-assopra” do governo durante a última legislatura. Em sua atuação no plenário e nos bastidores, alternou a defesa de propostas pontuais do governo com a articulação de importantes derrotas ou obstruções, como nos casos do Marco Civil da Internet ou da MP 627, sobre legislação tributária, entre outros.

Para 2015, a resistência de Dilma e do PT a seu nome vem sendo vencida por Cunha com uma articulação que passa também pelas indicações dos senadores Vital do Rêgo (PMDB-PB) para o Tribunal de Contas da União (TCU) e Kátia Abreu (PMDB-TO) para o Ministério da Agricultura. Se, no primeiro mandato de Dilma, Temer ainda tentou neutralizá-lo, agora o deputado está no centro das discussões sobre a participação peemedebista no novo ministério.

Para aumento do incômodo de petistas e demais adversários, Cunha tem repetido que não é candidato “nem do governo nem da oposição”. Sobre as diferenças com Dilma, desconversa: “Não tenho nenhuma dificuldade de conversar com ela. Essa suposta animosidade é muito mais uma divulgação de imprensa. Ou se ela nutre, pessoalmente, nunca me mostrou. Eu também não estou aqui para ser candidato amigo de ninguém. Eu quero ser candidato para ter uma posição política, de compromissos que são cumpridos. Esse negócio de amizade em política é tudo muito relativo. Amizade a gente faz no fim de semana com nossos amigos ou com a nossa família. Não se faz política com amigos”, disse ao jornal Diário de Pernambuco.

Poder regional

Em seu estado de origem, Cunha também está em alta. Em novembro, se encontrou mais de uma vez com o governador reeleito do Rio de Janeiro, Luiz Fernando Pezão, e com o prefeito da capital, Eduardo Paes, ambos do PMDB. Os dois já foram a Brasília levar aos deputados seu apoio a Cunha no pleito de fevereiro. Aproveitaram para tentar aproximá-lo de Dilma, já que o deputado, para piorar ainda mais a relação, apoiou Aécio Neves, do PSDB, na última disputa presidencial: “Caberá ao governador costurar essa aproximação”, diz o deputado Leonardo Picciani (PMDB-RJ), outro que apoiou Aécio.

Cunha parece enxergar longe também na política regional. Ciente de que, ao final do mandato de Pezão, haverá uma disputa pelo controle do PMDB no Rio, tem atuado para consolidar sua aliança com o presidente regional Jorge Picciani, pai de Leonardo e mentor do movimento “Aezão”, que volta à Assembleia Legislativa (Alerj) – onde exerceu a presidência por oito anos – após quatro de ausência.

Nas articulações internas, Cunha tem sido decisivo para que Picciani derrote as pretensões do atual presidente da casa, deputado Paulo Melo (PMDB), de permanecer no posto. Também ensaia uma aliança com Garotinho, antigo aliado de quem começou a se reaproximar na última legislatura em Brasília. Ao apostar na união dos dois clãs – Picciani e Garotinho – na disputa pela Alerj, o deputado vislumbra o Palácio Guanabara. Já não se imagina o xadrez da política fluminense sem Eduardo Cunha.

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