Portugal

Líder da Revolução dos Cravos prevê ruptura social violenta em Portugal

Para o capitão Vasco Lourenço, tudo que foi conquistado após o 25 de abril de 1974 na saúde e na educação está sendo destruído

TIAGO PETINGA/efe

Lourenço realiza discurso durante a comemoração dos 40 anos da revolução, hoje (25), em Lisboa

São Paulo – Passados 40 anos da Revolução dos Cravos em Portugal, que derrubou décadas de autoritarismo, o capitão Vasco Lourenço, um dos comandantes, expressa decepção com a atual situação do país. Para ele, o governo está criando cada vez mais injustiça social e acredita que vai haver ruptura social, convulsões fortes e violência. “O 25 de abril fez-se uma vez, e não é possível repeti-lo”. Conhecido como “Capitão de Abril” pelo seu destaque na revolução de 1974, Lourenço foi um dos precursores do movimento revolucionário.

Lourenço afirma que os jovens precisam lutar contra a política que provoca o desemprego e acredita que a liberdade está em perigo. “A democracia está em perigo, os adversários são fortes, o capital financeiro especulativo é muito forte”, aponta Vasco Lourenço ao recordar momentos da Revolução dos Cravos, em entrevista à Rádio Brasil Atual.

Desde 2008, o ano em que começou a crise econômica mundial, o nível de desemprego em Portugal cresceu muito. Em fevereiro deste ano, a taxa de desemprego entre jovens chegou a 34,7%, segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT). No ano passado o desemprego geral chegou a 18% no país, o risco de pobreza atingiu 18,7% da população: dois milhões de portugueses vivem com 4.904 euros por ano, ou seja, pouco mais de 400 euros por mês (cerca de R$ 1,2 mil).

Nos últimos cinco anos houve fortes cortes na saúde, com aumentos dos preços nas consultas médicas. Na educação, redução das bolsas de estudos e aumento das mensalidades de universidades.

Antes do 25 de abril, um quarto da população portuguesa era analfabeta, e o país tinha uma das maiores taxas de mortalidade infantil do Ocidente (60 óbitos por cada 1.000 nascimentos). Após a revolução, a taxa de mortalidade de bebês alcançou menos de 3,4 a cada 1.000 nascimentos por ano, melhor que a média da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), e a de analfabetismo ronda a casa de 5%, segundo os últimos dados.

Para Lourenço, tudo que foi conquistado após a Revolução dos Cravos na saúde e na educação está sendo destruído. O capitão ingressou na Academia Militar de Portugal em 1960. Cumpriu função militar entre os anos de 1969 e 1971 em Guiné durante a Guerra Colonial portuguesa (1961-1974), onde militares se organizaram contra as atrocidades cometidas nos países africanos Angola, Guiné e Moçambique e formaram o Movimento das Forças Armadas de Portugal.

No dia 25 de abril de 1974 o Movimento das Forças Armadas de Portugal derrubou quase meio século de autoritarismo. Na madrugada daquele dia, os líderes revolucionários emitiram na rádio Grândola a música Vila Morena, de Zeca Afonso, como senha de que a revolução começava em Portugal. A música havia sido censurada durante o governo de Marcelo Caetano (1968/1974), sucessor de Antônio de Oliveira Salazar, que governou Portugal durante 32 anos (1932/1968). A ditadura Salazarista foi inspirada no fascismo italiano.

Acabar com a repressão e com a guerra nas colônias é citada pelo capitão Lourenço como as principais motivações da revolução. “Nós lutávamos pela paz, queríamos uma justiça social para o povo português”, afirma. Vasco relata que no dia da revolução os comandantes tomaram a avenida Liberdade, mas as armas não dispararam fogo. A população aderiu ao movimento, ofereceu cigarros, bebidas e comidas aos comandantes, e flores foram distribuídas. “Assim nasceu de fato um símbolo extraordinário, os cravos nas espingardas que não foram usadas para dar fogo.”

Atualmente Vasco Lourenço é presidente da Associação 25 de Abril, uma organização que busca a defesa dos valores cívicos com base no movimento de 25 de abril. Foi criada 22 de Outubro de 1982 por oficiais dos quadros permanentes das forças armadas, e conta com centros de pesquisa, ligados a universidades, em diversas regiões de Portugal.

Ouça a reportagem da Rádio Brasil Atual: