Hora da decisão

Na região Norte, voto presidencial se divide entre pragmatismo e ideologia

Políticas sociais como o Bolsa Família disputam votos contra os interesses dos fazendeiros de soja, madeireiros e outros setores empresariais regionais; PT deve se manter hegemônico na região

Camila Domingues/ Palácio Piratini

Entre as eleições e as reivindicações populares do Pará, os interesses do mercado de soja e dos madeireiros

Belém – A região Norte, quando se trata de eleição presidencial, segue sob domínio do Partido dos Trabalhadores e sua coalizão. No primeiro turno, dos sete estados da região, a presidenta Dilma Rousseff (PT) venceu em quatro (Amapá, Pará, Amazonas e Tocantins), e, em todos eles, com mais de 50% dos votos. Aécio Neves (PSDB), candidato da oposição no 2º turno das eleições presidenciais, ficou com o primeiro lugar em Rondônia e em Roraima, com 44% dos votos, em média. Marina Silva (PSB) ganhou no Acre, estado onde nasceu e construiu militância política, com 41,9%.

O resultado do primeiro turno das eleições presidenciais segue a mesma dinâmica do embate inicial da eleição presidencial de 2010, quando a única diferença foi a vitória de José Serra, então candidato tucano, no Acre de Marina. Apesar de tratar-se de uma região com altos índices de pobreza, para o mestre em Ciência Política pela Universidade Federal do Pará (UFPA), Max Costa, o que ainda predomina na região é a escolha de voto mais complexa do que uma simples adesão a um programa social, como o Bolsa Família.

“Na minha pesquisa sobre a influência do Bolsa Família na região Norte, realizada comparando os votos de 2002 e 2006, pude perceber que a influência deste programa é menor que no Nordeste. As pessoas ainda votam no PT por ter um histórico de luta, mesmo que não se tenha avançado em pautas como a reforma agrária”, avalia.

Para Guilherme Carvalho, doutor em Ciências do Desenvolvimento Sócio Ambiental pelo Núcleo dos Altos de Estudos Amazônicos (NAEA), da UFPA, existe mesmo uma disputa ideológica no voto da região. “Em Roraima, as elites sustentam uma ideia constante que os índios atrapalham o desenvolvimento do estado. E mesmo que o PT não tenha avançado na demarcação das terras indígenas como o movimento social reivindica, tem o caso da Raposa Serra do Sol, que influencia bastante o voto pró PSDB”, explica.

O professor ressalta ainda a presença de elites imigrantes de outros estados na região e a influência política. “Em Rondônia, existe também uma elite que vem do Mato Grosso e outros estados das regiões Sul e Sudeste, com a cultura da soja, e que tem um poder muito grande sobre os votos na região. Além disso, as hidrelétricas geraram colapso no serviço público de Porto Velho, trouxeram muita violência e deixaram o trânsito caótico. Acredito que esses problemas também reflitam numa votação maior de Aécio Neves”, explica.

Políticas sociais x mercados

O doutor em Ciência Política e professor da UFPA, Roberto Correa, avalia que os votos na região para Dilma são fruto das políticas sociais, sendo que o PSDB vence em regiões onde os empresários da soja e do setor madeireiro tem mais poder. “Por ser uma região muito pobre, o Norte é muito influenciado pelas políticas sociais da presidenta Dilma. Os locais onde Aécio vence são muito mais ligados ao setores exportadores, como ‘sojeiros’ e madeireiros, que buscam uma política de desvalorização do real frente ao dólar, o que não tem ocorrido no mandato da petista”, define.

Apesar de ter Kátia Abreu, presidente licenciada da Confederação Nacional da Agricultura (CNA) entre as apoiadoras, a presidenta Dilma não foi tão aplaudida como Aécio Neves na sabatina realizada pela CNA com os presidenciáveis.

A favor da petista, entre o eleitorado conservador do campo, não pesa nem mesmo o orçamento público dedicado ao agronegócio: na propaganda eleitoral, a petista frequentemente relembra ter feito investimentos três vezes maiores que o governo tucano de Fernando Henrique Cardoso. Mesmo assim, enfrenta resistência. “Com a reformulação do Plano Agrícola e Pecuário (PAP), agora com foco em produtividade (2003 a 2014), a colheita de grãos saltou de 96,8 milhões de toneladas, numa área de 40,2 milhões de hectares, para 191,2 milhões de toneladas, produzidas em 56,4 milhões de hectares, crescimento 70% superior a uma década atrás”, ressaltam os materiais petistas.

Já Aécio Neves critica a política petista no programa de governo e propõe o “Superministério da Agricultura” para fazer o setor avançar. Quase como um recado para os movimentos de luta pela reforma agrária, o tucano também diz que vai demorar mais para desapropriar terras. “No meu governo, as fazendas invadidas não serão desapropriadas por um prazo de dois anos, como sinalização clara de que respeitamos o direito de propriedade”, diz o plano de governo do PSDB.

Sobre a política de democratização do acesso à terra, Dilma afirma que o PT fez um dos maiores programa de reforma agrária do mundo. “De 2003 até 2013, 51 milhões de hectares foram incorporados a esses programas, permitindo que 751 mil famílias se estabelecessem. Ao todo, hoje são 88 milhões de hectares destinados à reforma agrária, área equivalente a 3,5 vezes o tamanho do estado de São Paulo, que beneficiam 957 mil famílias”, contabiliza.

Ao contrário da propaganda petista, o Movimento dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais Sem Terra (MST), a Comissão Pastoral da Terra (CPT) e outras entidades de luta pela reforma agrária criticam a política dos últimos 12 anos como insuficientes e causadoras de conflitos. De acordo com dados não oficiais do MST, cerca de oito mil famílias estão acampadas no Pará, esperando pela criação de assentamentos. De 2009 a 2013, o governo federal não realizou nenhuma desapropriação de terras no estado.

Se a dinâmica político-eleitoral de 2010 se repetir no segundo turno das eleições de 2014, Dilma deve vencer no Amapá, Pará, Amazonas e Tocantins. Ao mesmo tempo, Aécio tem mais chances de ganhar Rondônia, Roraima e Acre. É o que acredita o coordenador do mestrado em Ciência Política da UFPA, Carlos Augusto Souza.

“Avalio que Aécio deve ganhar votos da Marina na região, mas não acredito que será suficiente para vencer Dilma”. Ele também considera que a pobreza ainda é um item fundamental, no Norte, para decidir pelo voto e que, nesse sentido, “os impactos dos programas sociais do governo ainda são muito grandes.”