‘Não é tão verdade assim que sou intransigente’, diz Marina ao JN

Pouco interrompida, candidata confrontou-se com contradições da velha política e sua chapa, trocou provérbios com Patrícia Poeta e discursou sobre si sem discutir projetos

Bonner, Patricia e Marina tiveram entrevista civilizada

São Paulo – As contradições entre o discurso da “nova política” e a crítica ostensiva à velha política dominaram perguntas e respostas entre os apresentadores do Jornal Nacional e a candidata do PSB à Presidência da República, Marina Silva. William Bonner começou questionando Marina sobre o avião usado por ela e por Eduardo Campos durante a campanha: “Foi objeto de uma transação milionária feita por meio de laranjas e não foi informada à Justiça Eleitoral. A senhora usou aquele avião, como teria feito qualquer representante daquilo que a senhora chama de velha política. A senhora procurou saber quem tinha pago por aquele avião ou confiou cegamente em seus aliados?”

Marina disse ter informação de que seria um empréstimo e que seria ressarcido dentro do prazo legal, até o encerramento da campanha. “Não tinha nenhuma informação quanto a qualquer ilegalidade referente à postura do proprietário do avião”, disse, defendendo que “a verdade terá de ser aferida pela investigação que está sendo feita pela PF. Isso não tem nada a ver com querer tangenciar o problema”.

“Em que esse seu comportamento difere daquele que a senhora combate tanto da tal velha política?”, insistiu Bonner. “Difere que esse é o discurso que eu tenho utilizado para todas as situações, inclusive quando envolve os meus adversários, e não como retórica, mas como desejo que de fato as investigações aconteçam”, repetiu a candidata. O assunto predominou durante quase a primeira metade da entrevista.

Em seguida, Patricia Poeta questionou a baixa votação obtida por ela no primeiro turno da eleição de 2010 em seu estado natal, o Acre, quando ficou com 23,45% dos votos, em terceiro, menos da metade de José Serra, então o primeiro, com 52,13%.

“Seu desempenho no Acre em 2010, foi terceiro, metade dos votos de Serra. Como explicar essa desaprovação clara em seu berço político?”, perguntou a apresentadora. “Não fiquei tão distante do segundo lugar, que foi a presidente Dilma” “Mas foi metade do primeiro, 23,45% a 52,13% Serra.” Marina respondeu com um provérbio: “É muito difícil ser profeta em sua própria terra”, ao explicar que teve de confrontar muitos interesses no Acre ao lado de Chico Mendes, com pessoas posicionadas “ao lado da Justiça, dos seringueiros, dos índios, da ética na política e que isso fez com que tivesse uma trajetória que não era o caminho mais fácil”.

A apresentadora ponderou que berço político pode ser uma enorme vantagem, ou não, como fora no caso dela, rebatendo com a adaptação de um ditado: “Seria como se os acreanos tivessem feito uma variação daquele velho ditado, ‘quem não a conhece que vote na senhora’?”

Marina insistiu que a “culpa era das circunstâncias”, entoando o discurso de que teve de contrariar muita gente e que pretendia “governar o Brasil fazendo o que é necessário para as futuras gerações, e não o que é necessário para ganhar voto para as próximas eleições”.

Bonner voltou ao choque ético ao expor contradições entre Marina e seu vice, o deputado Beto Albuquerque (PSB-RS), com quem travou muitas divergências em relação à aprovação do cultivo da soja transgênica pelo Congresso. “Há uma lenda de que sou contra os transgênicos, mas não sou. Eu não era contra o transgênico. Eu era favorável ao modelo de coexistência, e esse modelo de coexistência não passou.” O apresentador apontou ainda doadores de campanha de Albuquerque, como fabricantes de armas e de bebidas, que não caberiam no padrão ético de Marina.

“A nova política sabe trabalhar na diversidade e na diferença”, rebateu ela. “Não é tão verdade assim que sou intransigente.”

“Quer dizer então que a união de opostos, quando é com os adversários, é velha política. Quando é com a senhora, é nova política?”, provocou Bonner.

Os apresentadores – como tem de ser – não reservaram a Marina a mesma hostilidade dispensada a Aécio Neves (PSDB) e, principalmente, Dilma Rousseff (PT). Marina Silva pôde expor sua experiência de vida e sua trajetória política ambientalista. Estava tranquila e se saiu bem. Mas acabou poupada de discutir projetos – por exemplo, sobre como conduzirá a economia. Nem deu para explicar como governaria para as futuras gerações, se para ganhar as eleições compõe uma chapa com as bênçãos da oligarquia rural e financeira do Brasil.