Futuro em jogo

Novas regras do pré-sal são ‘mimo de Temer para o PSDB’

Presidente da Federação Brasileira de Geólogos acusa governo federal de avançar para a desnacionalização da mais importante riqueza natural do Brasil

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Petrobras agora não quer mais construir plataformas no Brasil, decisão que afetará criação de empregos e tecnologia

São Paulo – Após o presidente Michel Temer sancionar, no último dia 29, a lei que retira da Petrobras o direito de explorar todos os blocos licitados na área do pré-sal, o presidente da Federação Brasileira de Geólogos (Febrageo), João César de Freitas Pinheiro, afirma que as novas regras para a exploração do pré sal são “um mimo que ele (Temer) dá aos privatistas do PSDB em troca de apoio ao seu cambaleante governo”. “Ao desobrigar a Petrobras de atuar nestas regiões – que são a última fronteira do planeta de enorme atratividade para exploração e extração de petróleo e gás, por serem as mais ricas e viáveis do ponto de vista econômico –, Temer está criando todas as condições para a desnacionalização da mais importante riqueza natural que o Brasil possui.”

“O caminho agora está aberto a Pedro Parente e seus amigos do PSDB para fazerem negociatas com as petroleiras estatais e privadas do mundo inteiro, que não possuem, como a Petrobras, uma região petrolífera extremamente rica, limítrofe da zona abissal do oceano”, diz Pinheiro.

Para ele, o futuro da maior empresa brasileira e do próprio país está em risco. “Estas petroleiras correrão para o Brasil como um enxame de abelhas e aos poucos se tornarão mandatárias de enormes reservas de óleo e gás, destruindo o futuro da Petrobras e o sonho de soberania econômica e política da nação.”

Como exemplo dos novos tempos, o presidente da Febrageo cita a venda do campo de Carcará para a estatal norueguesa Statoil. Anunciada no dia 28 de julho, a venda da participação de 66% da Petrobras no campo na Bacia de Santos, por US$ 2,5 bilhões, foi considerada pela Febrageo um “crime de lesa-pátria”.

A justificativa é o baixo valor do negócio, considerando o potencial único do campo de Carcará. Segundo Pinheiro, os conhecimentos existentes sobre o campo indicam que ele pode valer até “dez vezes mais”, levando em conta todas as variáveis do negócio.

Já o coordenador-geral da Federação Única dos Petroleiros (FUP), José Maria Rangel, lamentou que o Brasil optou por abrir mão de ter uma política de Estado e passa a ter uma política que contempla apenas os interesses do governo, diante de uma das maiores riquezas do país.

Como indicativo do que deve acontecer a partir de 2017, quando as novas regras entram em vigor na prática, Rangel citou a entrevista concedida semana passada pelo presidente da estatal, Pedro Parente, na qual ele avisou que a Petrobras irá reavaliar a participação da empresa nos próximos leilões do pré-sal. “Isso reafirma o nosso temor de que, a partir de agora, nós passamos a ter nessa área uma política de governo”, disse, afirmando que a situação financeira da Petrobras será sempre usada como desculpa para a empresa não participar de novas explorações na camada do pré-sal. “Eles vão continuar batendo na mesma tecla que batem hoje, de que a empresa não tem condição de fazer a operação e pronto.”

Para ele, é “conversa fiada” o argumento da direção da empresa de que é necessário reduzir a taxa de endividamento para a estatal voltar a ter grau de investimento. “A Petrobras, em 63 anos, só teve grau de investimento em 2008, no segundo mandato do presidente Lula”, disse Rangel. Por ser uma empresa do Estado, o ativista acredita que a Petrobras só irá recuperar o grau de investimento quando o próprio país recuperar também o grau de investimento, o que parece estar longe de acontecer, considerando as projeções econômicas para 2017. “Esse argumento é furado.”

Patrocinado pelo senador e atual ministro das Relações Exteriores, José Serra (PSDB-SP), a nova lei retira da Petrobras a participação mínima de 30% em todos os consórcios de exploração de blocos licitados na área do pré-sal e na qualidade de operadora. A partir de agora, a empresa escolherá os blocos em que pretende atuar como operadora, desde que tenha o aval do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE). Embora Temer tenha dito no momento da sanção da nova lei que sentia estar “praticando um ato em benefício do Brasil”, a alteração das regras do pré-sal era, há anos, uma demanda das petrolíferas estrangeiras.

José Maria Rangel lembrou que a luta dos movimentos sociais aliados à FUP, em conjunto com parlamentares progressistas, conseguiu pelo menos fazer com que a Petrobras tenha a opção de escolher os blocos em que quer atuar. “O projeto original do Serra era simplesmente retirar da Petrobras a operação única e os 30% de participação mínima.”

O coordenador da FUP ainda recordou que Pedro Parente já disse, em outras ocasiões, que as plataformas do pré-sal não devem ser mais construídas no Brasil porque aqui os prazos não são cumpridos. “Ele quer gerar emprego lá fora, ele quer desenvolver a engenharia lá fora.” Rangel acredita que a intenção final do governo Temer seja a de acabar com a política de conteúdo local, mas que o governo “ainda não teve coragem de dizer isso”.

“Essa sanção traz prejuízos significativos para o povo brasileiro, não só no que diz respeito à soberania, como na questão do conteúdo local, que desenvolve a engenharia e cria emprego e renda para o trabalhador brasileiro, e também nos recursos que serão destinados como royalties à saúde e educação para o fundo soberano”, afirmou.

Rangel avalia que o próprio desenrolar da economia demonstrará para empresários e trabalhadores que a política em curso é equivocada. Citou como exemplo sua recente visita a um estaleiro em Angra dos Reis que antes tinha 12 mil trabalhadores e hoje tem apenas três mil. “Com a política de conteúdo nacional cada vez se esvaziando mais, os empresários vão perder e os trabalhadores também. Penso que vamos ter que reorganizar nossas ações, dialogar e sensibilizar segmentos empresariais e dos trabalhadores para minimamente fazer um processo de resistência melhor do que estamos fazendo hoje.”