Rapinagem

Distribuição de dividendos bilionários da Petrobras vira caso de Justiça

Petroleiros, Frente Parlamentar em Defesa da Petrobras e centrais sindicais contestam “megadividendos” de R$ 43,68 bilhões aos acionistas da estatal

André Valentim/Agência Petrobras
André Valentim/Agência Petrobras
No ano passado, Petrobras distribuiu mais de R$ 200 bilhões em dividendos

São Paulo – A Petrobras anunciou nesta quinta-feira (3) a distribuição de dividendos no valor de R$ 43,68 bilhões relativos ao lucro do terceiro trimestre. O pagamento foi aprovado em reunião do Conselho de Administração (CA) da estatal. Assim, o total de dividendos chegará a quase R$ 180 bilhões nos três primeiros trimestres.

De acordo com Índice Global de Dividendos, da gestora Janus Henderson, a estatal se tornou a maior empresa pagadora de dividendos do mundo. Desse montante, apenas 37,5% irá para o Governo Federal. O restante será apropriado por investidores privados – a maioria estrangeiros.

Ao mesmo tempo, a Petrobras anunciou lucro líquido de R$ 46,096 bilhões no terceiro trimestre. O resultado ficou 15,2% abaixo do registrado nos três meses anteriores. Mas cresceu 48% na comparação com o terceiro trimestre do ano passado, atingindo recorde para o período. A alta do lucro da companhia decorre do aumento do preço internacional do barril de petróleo.

A distribuição dos dividendos bilionários, no entanto, é alvo de uma série de críticas, embora a farra dos investidores parece estar com os dias contados. Isso porque o novo governo do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva deve rever tanto a política de preços da Petrobras – o Preço de Paridade de Importação (PPI) –, quanto a forma de remuneração aos acionistas.

A presidenta do PT, deputada Gleisi Hoffmann (PT-PR), foi uma das primeiras a reagir, ainda antes do anúncio oficial da Petrobras.

Contestações

Nesta sexta-feira (4), foi a vez de o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União (MPTCU) tentar barrar a farra. O procurador Lucas Furtado pede que o TCU suspenda a distribuição de dividendos até que a corte julgue se o valor estipulado pelo CA da Petrobras é compatível com o fluxo de caixa da empresa. Ele argumenta que os “valores astronômicos” distribuídos aos acionistas pode comprometer a própria saúde financeira da companhia.

Além disso, a Federação Única dos Petroleiros (FUP) e a Associação Nacional dos Petroleiros Acionistas Minoritários (Anapetro) entraram na Justiça com ações que contestam a distribuição dos “megadividendos”, que tem como alvo a gestão da empresa e titulares do conselho de administração. As medidas envolvem representação no TCU, no MP de Contas, denúncia à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e à Procuradoria-Geral da União (PGR), além de processo judicial.

Para a FUP, a distribuição de dividendos dessa magnitude é “imoral”. “Só com os dividendos deste terceiro trimestre, daria para comprar de volta as refinarias Rlam e Six e concluir as obras da Abreu e Lima, do Comperj, da UFN-3, reabertura da Fafen-PR e ainda sobraria dinheiro para outros investimentos”, destacou o coordenador-geral da FUP, Deyvid Bacelar. Nesse sentido, essas iniciativas jurídicas devem contar com o apoio da A Frente Parlamentar em Defesa da Petrobras, presidida pelo senador Jean Paul Prates (PT-RN).

“Desconectada da missão”

Oito das principais centrais sindicais do país também divulgaram nota, em que repudiam a distribuição bilionária de dividendos. Como consequência, as entidades dos trabalhadores apontam a queda dos investimentos da estatal. “Sem planejamento de investimento de longo prazo e desconectada da missão de produzir tecnologia para a expansão da produção de energia renovável, a empresa atende somente ao interesse de lucro dos acionistas nacionais e estrangeiros”, diz a nota das centrais.

O movimento sindical denuncia ainda a venda de ativos da companhia, de modo a engordar os dividendos repassados aos acionistas. Também criticam as encomendas de plataformas no exterior, que poderiam ser feitas no país, de modo a alavancar a criação de empregos. Por fim, destacam que a atual política de preços pressiona a inflação, “aumentando o custo de vida e a estrutura de preços de todo o sistema produtivo”.

Nesse sentido, as centrais apoiam as iniciativas da FUP, da Anapetro e da Frente Parlamentar em Defesa da Petrobras, que contestam o favorecimento aos acionistas. “A antecipação de distribuição dos lucros exorbitantes é uma manobra contra os interesses da nação!”, alerta a nota.

Riqueza para poucos

O professor Eduardo Costa Pinto, do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (IE/UFRJ) e pesquisador do Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (Ineep-FUP), também explica a relação entre os dividendos recordes e queda dos investimentos da Petrobras. De acordo com o especialista, em função da atual política de distribuição de dividendos, a renda petrolífera está sendo apropriada por um pequeno grupo de investidores, comprometendo, até mesmo, o futuro do país.