Sabatina no Senado

Autonomia do Banco Central não ameaça o ‘poder eleito democraticamente’, afirma Galípolo

Ex-secretário-executivo do Ministério da Fazenda Gabriel Galípolo foi sabatinado no Senado. Ele e Ailton de Aquino irão assumir postos na diretoria do BC

Pedro França/Agência Senado
Pedro França/Agência Senado
O economista Gabriel Galípolo, junto ao advogado Ailton de Aquino Santos, foi sabatinado na Comissão de Assuntos Econômicos

São Paulo – O economista Gabriel Galípolo e o advogado Ailton de Aquino Santos são sabatinados na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado, nesta terça (4). Eles foram indicados pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva – sob orientação do ministro Fernando Haddad (Fazenda) – para a diretoria do Banco Central (BC). Galípolo era secretário-executivo do Ministério da Fazenda, o número dois de Haddad na pasta. Já Aquino é servidor de carreira do BC desde 1998. Os dois foram aprovados na CAE.

Galípolo falou sobre questões polêmicas que são debatidas nos meios econômicos desde a posse de Lula: a autonomia do BC e a “moeda única” para comércio ente países Ele afirmou que, durante o período de eleição, foi percebendo que “boa parte” das divergências com interlocutores do mercado financeiro vinha “da dificuldade de compreensão de alguns conceitos”.

“Cada vez mais acredito que se a gente tirar alguns ruídos e perturbações, se a gente se sentar à mesa com pessoas de bom senso, a distância que parece ser muito grande nas divergências encurta bastante”, disse. “Às vezes se entende a autonomia do BC como se fosse autonomia do processo democrático, como se alguém quisesse ser indicado para ser diretor do BC para fazer alguma coisa à revelia do que saiu da vontade democrática. O que não é o desejo de ninguém”, explicou.

Segundo ele, essa constatação é “visível, porque o diretor-presidente (Roberto Campos Neto) está sempre disposto a dialogar, a vir (ao Congresso) todas as vezes que é convocado e falar publicamente”, acrescentou. “É preciso se entender que é óbvio que é o poder eleito democraticamente que determina qual o destino econômico da nossa sociedade. A autonomia técnica e operacional é o que os diretores devem perseguir”, continuou.

“Ruídos”

No início do governo Lula, o presidente e aliados deram várias declarações se dizendo contra a “independência” do BC. Em entrevista à CNN em fevereiro, por exemplo, Lula foi explícito. “Um Banco Central autônomo vai ser melhor? Vai melhorar a economia? Ótimo, mas se não melhorar, nós temos que mudar”, disse. “Vamos ver qual é a utilidade que a independência do Banco Central teve para este país”, acrescentou.

No entanto, a autonomia do BC foi uma decisão do Congresso e o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), já avisou, também em fevereiro, que “tecnicamente o Banco Central independente foi o modelo escolhido pelo Congresso”. Segundo ele, uma mudança nesse modelo não passará na Casa. O próprio Fernando Haddad chegou a classificar tal discussão motivada por “ruídos”.

Já uma eventual saída de Campos Neto da presidência do BC, sugerida por governistas, só poderá acontecer em três situações: se ele cometer algum ato ilegal, como improbidade administrativa; se for considerado inapto para com os objetivos do BC; ou se renunciar. Mas, para ele perder o cargo sem renunciar, é necessário parecer do Conselho Monetário Nacional ao presidente da República pedindo a exoneração e, se aceito, aprovação por maioria absoluta do Senado.

“Moeda comum”

Galípolo também comentou, na sabatina, a questão da “moeda comum”. Ele disse que o termo “moeda única” é equivocado. Segundo o secretário-executivo da Fazenda, a proposta que vem sendo ventilada não se assemelha ao euro, moeda que substitui as moedas nacionais na Europa.

A ideia, na realidade, se baseia no fato de que, no comércio e nas relações econômicas entre o Brasil e Argentina, por exemplo, os dois países são “constrangidos” por uma politica monetária em função de um terceiro país (no caso, Estados Unidos) que não participa dessa relação comercial ou de investimento.

“Muitas vezes, quando você depende de uma terceira moeda para fazer essa relação econômica a política, pode-se constranger a relação econômica entre os dois países. A ideia não é de uma moeda para substituir as moedas nacionais, mas uma unidade de conta como meio de pagamento que permita facilitar a relação entre dois países”, assinalou.

Após invasão da Ucrânia

De acordo com Galípolo, após a invasão da Ucrânia, essa discussão extrapolou o âmbito dos órgãos multinacionais ou acadêmico, e várias pesquisas começaram a alertar sobre a “pulverização” de moedas nacionais para reservas ou comércio. Políticas inovadoras nesse capo, entretanto, “não são soluções de curto prazo e devem ser pensadas sem perturbar a economia brasileira”.

O objetivo dessas políticas, acrescentou, seria “garantir maior possibilidade de livre comercio entre países, e que o Brasil não perca espaço como vem perdendo para países que implementam soluções como essa.”

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