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Árabes podem exigir neutralidade brasileira para manter relações comerciais

Para presidente da Câmara de Comércio Árabe Brasileira, anúncio de Bolsonaro de abrir escritório em Israel indica desequilíbrio e produtos do Brasil podem perder preferência nas negociações

Agência Brasil

Carne de frango é um dos principais produtos brasileiros exportados ao bloco de países árabes

São Paulo – Após o anúncio do governo brasileiro da abertura de um escritório de negócios em Israel, a expectativa do presidente da Câmara de Comércio Árabe Brasileira, Rubens Hannun, é de que o Brasil mantenha equilíbrio no comércio com o bloco árabe. “Esperamos que possa haver no mínimo um tratamento igualitário, que escritórios como esse também sejam abertos nos países árabes, inclusive na Palestina“, diz. “A neutralidade é importante para os negócios.”

Para ele, o movimento brasileiro de abertura do escritório em Jerusalém anunciado pelo presidente Jair Bolsonaro indica uma mudança na posição de equilíbrio adotada historicamente pelo Brasil. “Achamos que dá para ter comércio com todo mundo. Essa é uma decisão desnecessária aos negócios.” Segundo Hannun, a questão tem repercussão inclusive porque os árabes “são muito sensíveis” a posições relativas à Palestina.

“E quando digo os árabes, me refiro tanto do ponto de vista administrativo, quanto da sociedade. A sociedade civil é muito sensível a isso. E como a sociedade civil é muito admiradora do Brasil, da marca brasileira e seus produtos, pode haver uma reação”, diz. Em sua opinião, ainda não é possível medir a dimensão dessa reação.

Inicialmente, uma possibilidade seria a perda de preferência dos produtos brasileiros nas negociações, que podem ser abertas a outros fornecedores, o que levaria o Brasil a perder espaço no médio prazo.

Em termos de receita, as exportações brasileiras para os países árabes caíram 15,5% de 2017, quando chegaram a 13,6 bilhões de dólares, para 2018, quando atingiram US$ 11,5 bilhões. Mesmo assim, o saldo foi favorável ao Brasil, ao fim de 2018, em US$ 4 bilhões.

Mas, em volume, as exportações se mantiveram no mesmo patamar de 2017 para 2018, chegando a subir ligeiramente (2,9%) no ano passado – passou para 43,2 milhões de toneladas contra 42 milhões no ano anterior.

Houve problemas com dois grandes produtos exportados ao mundo árabe. O principal foi o açúcar, cujas vendas ao bloco caíram 19,9% – de US$ 4,6 bilhões para US$ 2,8 bilhões –, principalmente devido à “supersafra” mundial de açúcar (com destaque para a Índia), que é o principal produto exportado pelo Brasil aos árabes. A produção internacional pressiona o preço da commodity negativamente no mercado internacional.

Outro problema foi relativo à carne de frango, cuja queda se deveu a problemas com o produto fornecido à Arábia Saudita principalmente. O país fez algumas exigências em função do tratamento halal, para o qual o Brasil não estava totalmente preparado. O tratamento halal para produção e abate segue princípios islâmicos.

A carne de frango caiu tanto em volume quanto em receita na exportação geral aos árabes. Atingiram 1,6 milhão de toneladas em 2017, contra 1,4 milhão no ano seguinte (queda de 11,4%). Em receita, a queda foi de US$ 2,6 bilhões em 2017, para US$ 2,2 bilhões em 2018 (16,1% a menos).

O Brasil tem longa tradição e boas relações com os árabes. Há mais libaneses no país do que no próprio Líbano. Estima-se que haja cerca de 10 milhões de pessoas nascidas ou de ascendência libanesa em solo brasileiro. O Líbano tem cerca de 6 milhões de habitantes, dos quais aproximadamente um quarto são refugiados sírios da guerra.

No Brasil, a comunidade árabe é de entre 12 a 15 milhões de pessoas, a maioria de libaneses e sírios e seus descendentes.