Ivan Lessa deixa como lição a eterna luta pela democracia

São Paulo – No ano em que a Comissão da Verdade pode começar a trazer à tona os documentos escondidos nos porões da ditadura, as mortes de Millôr Fernandes, em 27 de […]

São Paulo – No ano em que a Comissão da Verdade pode começar a trazer à tona os documentos escondidos nos porões da ditadura, as mortes de Millôr Fernandes, em 27 de março, e agora de Ivan Lessa, aos 77 anos, na sexta-feira, 8 de junho, em Londres, na Inglaterra, são um duro golpe na luta por deixar cada vez mais claro o que aconteceu durante mais de vinte anos de regime (1964-1985). Os dois exerceram o importantíssimo papel de luta pela liberdade nas páginas do jornal “O Pasquim”, sempre se valendo de um humor ácido, corrosivo e extremamente necessário.

Vindo de uma família de escritores e intelectuais, Ivan Pinheiro Themudo Lessa, nascido em São Paulo, em 9 de maio de 1935, Ivan Lessa escreveu livros de contos “Garotos da Fuzarca” (1986), de crônicas “Ivan Vê o Mundo” (1999) e “O Luar e a Rainha” (2005), mas destacou-se mesmo nas páginas do jornal O Pasquim, onde a criação mais conhecida foi o ratinho Sig (redução do nome do pensador Sigmund Freud), uma parceria com o cartunista Jaguar baseada na anedota “Se Deus criou o sexo, Freud criara a sacanagem”.

Em “O Pasquim”, Ivan Lessa assinou as seções “Gip-Gip-Nheco-Nheco”, “Fotonovelas” e “Os Diários de Londres”, nos quais adotou o heterônimo Edélsio Tavares. A Inglaterra, aliás, foi o país que escolheu para viver desde janeiro de 1978, de onde escrevia três crônicas semanais para a BBC Brasil. Na última, publicada no próprio 8 de junho, o jornalista relembrava o amigo Millôr Fernandes: “E aí trago à cena, mais uma vez, porque cismei, mestre Millôr Fernandes. Esse era profissional. Nada a ver com ‘frasista’. Trabalhava com a enxada dura da língua. Nunca para dar a cara no Flore, principalmente com Topor e Léaud (…) E assim cada vez que um ‘frasista’ passar por perto de mim, leve uma nossa: minha e de Millôr. Dois contra um a gente ganha mole”.

Ivan Lessa também colaborou com as revistas Senhor, Veja e Playboy, e os jornais Folha de S. Paulo, O Estado de S. Paulo e Jornal do Brasil. A causa da morte não foi divulgada, mas ele sofria há alguns anos com dificuldades respiratórias resultantes de um enfisema pulmonar e, nos últimos meses, deixara de frequentar todos os dias a redação da BBC Brasil, para escrever as colunas. 

Fica uma grande lacuna para uma geração que aprendeu a acompanhar a fundamental luta pela democracia e pela verdade desses grandes mestres da imprensa e das letras brasileiras. Agora ele se junta a Millôr Fernandes, Paulo de Tarso e Henfil, entre outros, na luta pela democracia em outras bandas. E que a gente trate de cuidar da nossa e lute para que os fantasmas do passado venham finalmente à tona e que os responsáveis por eles sejam devidamente responsabilizados e punidos.

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