Problemas com ‘pulseiras do sexo’ refletem falta de orientação

Especialistas orientam pais e responsáveis a tornarem-se parceiros dos filhos. Falta de diálogo pode aumentar a curiosidade de crianças e adolescentes sobre sexo

Do ponto de vista jurídico, o que pode tornar o jogo das pulseiras ilegal é o fato de envolver menores, diz advogado (Foto: Suzana Vier/Redebrasilatual)

São Paulo – A polêmica envolvendo as pulseiras de silicone coloridas que ficaram conhecidas como “pulseiras do sexo” colocaram famílias e escolas em alerta. A polícia investiga a relação entre o uso do acessório e crimes graves, como o estupro de uma jovem de 13 anos em Londrina (PR) e a morte de duas adolescentes em Manaus (AM). Em todos os casos, as meninas usavam as pulseiras.

Os acessórios chegaram a ser proibidos em escolas e até pela Justiça. Especialistas ouvidas pela Rede Brasil Atual afirmam que as pulseiras não podem ser apontadas como únicas “culpadas” pelos casos de violência e a polêmica pode ser oportuna para os pais criarem um espaço de diálogo com os filhos.

Do ponto de vista jurídico, “ter qualquer tipo de relacionamento ou ato libidinoso” com menores é ilegal, explica o jurista Luiz Flávio Gomes. “Isso significa pelo novo código penal ato sexual contra pessoa vulnerável”, destaca. “Faça da sua vida sexual o que bem entender, mas há limites não tolerados pelo direito penal”, quando se trata de menores, alerta.

Em relação aos casos de violência, a psicóloga Yara Garzuzi, especialista em terapia comportamental e mestre em distúrbios do desenvolvimento, acredita que os eventos não foram gerados apenas pela utilização das pulseiras. “Quem comete um ato violento como esses (estupros e mortes) está perturbado e de alguma maneira já estava disposto a fazê-lo”, avalia a profissional, que atende principalmente crianças e adolescentes.

As histórias relacionadas às bijuterias são “uma pequena ponte do iceberg”, que passa por outros desequilíbrios sociais, aponta Yara.

Pulseiras

As pulseiras coloridas de silicone tornaram-se moda entre crianças e adolescentes. 

As bijuterias ganharam o apelido de “pulseiras do sexo” porque passaram a ser usadas em uma brincadeira em que cada cor representa uma ação que vai de um abraço até a prática de sexo.

A brincadeira veio da Inglaterra, onde tem o nome de “snap” e virou febre nos Estados Unidos.

Código das cores

Saiba o que cada cor significa:

  • Amarela – abraço
  • Rosa – mostrar o peito
  • Laranja – dentadinha de amor
  • Roxa – beijo com a língua, talvez sexo
  • Vermelha – dança erótica
  • Verde – chupões no pescoço
  • Branca – a menina escolhe o que quer
  • Azul – sexo oral a ser praticado pela menina
  • Preta – fazer sexo com quem arrancar a pulseira
  • Dourado – fazer todos os citados acima

Os acessórios seriam, assim, apenas o pretexto para o que as pessoas querem fazer, na visão da também psicóloga Márcia Maria Matos. “Não acredito que seja a pulseira a motivação desses casos violentos”, cita. “As pessoas teriam agido com violência de qualquer forma, independentemente da pulseira”, avalia.

Segundo Márcia, é preciso estudar as características peculiares de cada cidade e das pessoas envolvidas para determinar o que realmente levou a esses comportamentos violentos. “Uma brincadeira não era para causar tantos problemas, por isso é preciso conhecer melhor o contexto sociocultural dos envolvidos”, constata.

Tabu

“Sexo é algo natural em que toda criança em fase de desenvolvimento vai pensar”, observa Yara. O que é novidade no momento e exige atenção dos pais é o acesso à informação pela televisão e pela internet. Enquanto muitos pais ainda tem dificuldade em falar sobre o assunto com os filhos, a TV traz situações “com menos pudor do que antes”, lembra.

Segundo a terapeuta, tratar sexo como tabu aguça ainda mais a curiosidade natural das crianças sobre o assunto. “As crianças podem pesquisar no Google a palavra sexo”, adverte. Um exemplo disso, no dia a dia, é quando a criança vê uma cena de beijo na televisão, mas os pais dizem que elas não podem fazer aquilo. A proibição e a falta de orientação sobre o assunto podem ter o efeito contrário.

Márcia Matos também alerta que há famílias que não falam sobre sexo com crianças e jovens e acabam transferindo a responsabilidade para a escola. “Muitas mães não têm coragem de tocar no assunto”, cita. “Muitas vezes não é porque não querem, mas porque não sabem o que dizer ou como. Elas não aprenderam também, então não é porque não querem, mas porque não sabem”, opina.

Crianças

As crianças, mesmo pequenas, já tem noção de que não foram “trazidas pela cegonha” ou “encontradas num pé de repolho”, como muitos pais costumavam contar em décadas passadas, comenta Yara. “Minha experiência com crianças a partir de cinco ou seis tem mostrado que as crianças já têm ideias mais precisas de como as crianças nascem”, cita. “Eles sabem que papai e mamãe fazem alguma coisa, não sabem como, mas sabem que são fruto de ações dos pais”, garante.

Além de conversar com os filhos, Yara sugere que os pais acompanhem os assuntos e atividades comuns na idade dos filhos. “Os pais também devem ter noção de como são as outras crianças, para orientar melhor os próprios filhos”, salienta.

Outra orientação da especialista é que os pais sejam parceiros dos filhos. “Os pais não podem deixar o papel de educar e punir quando necessário, mas precisam ter também o papel de parceiros dos filhos”, observa.