Entidades criam fundo para amparar trabalhador escravo urbano

Imigrantes bolivianos estão entre os que mais sofrem com situações críticas de trabalho e vida

Imigrantes bolivianos em oficina de costura, onde moram e trabalham (Foto: Antônio Gaudério/Folhapress)

São Paulo –  Para amparar  trabalhadores do meio urbano submetidos a condições análogas à escravidão, órgãos públicos e entidades do terceiro setor acabam de criar um fundo para auxiliar nos casos em que não for possível a imediata responsabilização do empregador. Não são poucos os casos que ganham grande repercussão por envolver utilização de mão de obra mantida em condições indignas.

Além da criação do fundo de emergência, outras medidas estão sendo estudadas, como a criação de um programa que oferece assistência jurídica e a criação de um disque-denúncia. Uma primeira audiência sobre o tema foi realizada na semana passada e contou com a presença de representantes do Ministério Público do Trabalho (MPT), do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), Centro de Apoio ao Migrante (CAMI) e a ONG Repórter Brasil.

Com aporte inicial de cerca de R$ 400 mil, o fundo e as demais ações estabelecidas na reunião advirão de empresas do setor têxtil que, consciente ou inconscientemente, beneficiaram-se do trabalho escravo ao longo de sua cadeia produtiva.

Para o procurador do MPT Luiz Fabre, um dos articuladores das ações, é sabida a responsabilidade do empregador no caso de flagrante de trabalho escravo. Mas sem poder responsabilizá-lo imediatamente, os trabalhadores carecem de condições para sobreviver. Nesse contexto é que poderam ser usados recursos do fundo de emergência.

“A gente sabe que essas despesas são de responsabilidade do empregador, como encaminhar a um hotel, pagar alimentação. Só que muitas vezes não se consegue fazer com que ele seja responsabilizado e pague imediatamente as despesas. Por essa incerteza, os trabalhadores (libertados) acabavam indo morar em igrejas ou procuravam outro tipo de sobrevivência igualmente subumanas”, diz o procurador.

A realidade do trabalho degradante é ainda mais amarga para imigrantes vindos de outros países sul-americanos. Só de bolivianos, o Ministério Público de São Paulo calcula que entre 100 mil e 150 mil vivam na capital paulista. “Quando há denúncias de trabalho escravo, os trabalhadores, ao perder o emprego, automaticamente perdem também a moradia, porque muitas vezes moram no mesmo ambiente. O nosso objetivo é oferecer ajuda, como documentação, assistência jurídica. Porque essas pessoas ficam totalmente desamparadas”, lamenta Ivone Barreto, do Centro de Apoio ao Migrante (Cami), ONG que presta atendimento a estrangeiros.

A respeito de políticas migratórias, as discussões entre as entidades envolvidas não foram mais aprofundadas por se tratar de competência do Ministério da Justiça e da Polícia Federal, diz o procurador Luiz Fabre. Os esforços, segundo ele, serão concentrados para acabar com a informalidade dos trabalhadores imigrantes, de modo a tornar o custo desta mão de obra equivalente ao da contratação de brasileiros.