Rio Grande do Sul

Manifestantes processam prefeitura de Porto Alegre e governo gaúcho por repressão

Ramiro Furquim/Sul21 Corte de 115 árvores foi efetuado imediatamente após remoção do acampamento Porto Alegre – Manifestantes que passaram mais de 40 dias acampados contra o corte de árvores da […]

Ramiro Furquim/Sul21

Corte de 115 árvores foi efetuado imediatamente após remoção do acampamento

Porto Alegre – Manifestantes que passaram mais de 40 dias acampados contra o corte de árvores da Avenida Edivaldo Pereira Paiva, em Porto Alegre, estão processando a prefeitura da cidade e o governo do estado. Na segunda-feira (13), 13 dos 27 integrantes do grupo conhecido como Ocupa Árvores ingressou com uma ação exigindo indenização por danos morais e materiais dos poderes públicos.

Entre abril e maio do ano passado, os ativistas organizaram um acampamento no terreno ao lado da Câmara Municipal como forma de resistir ao corte de 115 árvores: 43 tipuanas, 16 carobinhas, 15 goiabeiras, 9 ipês-roxos e 7 canafístulas. No lugar dos vegetais, a prefeitura pretende duplicar a avenida – obra que, naquele momento, ainda estava no rol das intervenções urbanas consideradas necessárias para a realização da Copa do Mundo.

A remoção das árvores já havia sido alvo de protestos de rua nos dias 20 e 27 de maio. No dia 29 do mesmo mês, um oficial de Justiça foi até o acampamento do Ocupa Árvores entregar uma notificação de que o grupo teria que deixar o local em até 48 horas – fruto de uma ação de reintegração de posse protocolada pela prefeitura e acatada pelo Judiciário. Entretanto, logo em seguida a própria prefeitura anunciou que estaria solicitando a suspensão da ação junto ao Judiciário.

Contudo, na madrugada do dia 29 de maio,a Brigada Militar desmantelou o acampamento, empregando um efetivo de 150 policiais para a operação. Os ativistas foram levados para o 9º Batalhão algemados, onde tiveram que preencher um termo circunstanciado. Na ocasião, foram diversos os relatos de agressões físicas e verbais. Além disso, muitos argumentaram que tiveram pertences extraviados ou danificados.

A advogada Eloísa Agra Hassen, autora da ação, explica que vinha trabalhando na elaboração da peça desde julho de 2013, realizando a busca de todos os ativistas e compilando as informações sobre o caso. “Esperamos também o resultado dos termos circunstanciados aos quais eles respondiam, que acabaram sendo arquivados pelo próprio Ministério Público. Eles eram acusados de ter cometido os crimes de desobediência e resistência, isso é um absurdo”, opina.

Ela afirma que, para haver crime de desobediência, é preciso que tenha havido alguma ordem judicial ou administrativa descumprida – o que aponta não ser o caso, já que a própria prefeitura retirou a ação de reintegração de posse. E sustenta que também não houve delito de resistência, já que os manifestantes estavam dormindo às 3h da madrugada, quando a Brigada Militar iniciou a ação.

“O que aconteceu foi uma verdadeira emboscada de guerra”, qualifica Eloísa. A advogada aponta que, mesmo se houvesse uma ação de reintegração de posse, a operação de despejo só poderia ter ocorrido 48 horas após a notificação – que havia sido feita apenas poucas horas antes da operação policial.

“Foram presos, algemados, humilhados”, afirma advogada

Durante a elaboração da ação, os ativistas reuniram listas com os materiais que sumiram ou foram danificados após a operação policial. Os itens variam entre livros, barracas e até mesmo celulares. Além da indenização material, a advogada solicita indenização por danos morais no valor de R$ 20 mil a cada manifestante. “Eles foram presos, algemados, humilhados e despidos para realização de vistoria. Foram moralmente atacados em suas subjetividades”, afirma Eloísa.

Um dos autores da ação, já falecido, é representado por seus pais. Trata-se do psicólogo Samuel Eggers, assassinado com tiros à sangue-frio em Caxias do Sul, sua cidade natal, em um episódio onde o autor do crime não lhe roubou nada. Eloísa recorda que, quando a RBS TV noticiou o assassinato de Samuel, transmitiu imagens de sua prisão no episódio do acampamento do grupo Ocupa Árvores e o taxou de criminoso por ter possuído aquela passagem pela polícia. “A RBS deixou bem claro que ele tinha ‘antecedentes criminais’. O Samuel foi duplamente humilhado”, lamenta.

Autoridades defenderam legalidade da ação

No mesmo dia em que ocorreu a operação policial, as autoridades envolvidas em seu planejamento consideraram que a ação foi positiva. O coronel João Diniz Godoi, comandante do Comando de Policiamento da Capital, disse, na ocasião, que a ação foi “rápida”, “transparente” e “cirúrgica”.

O vice-prefeito de Porto Alegre, Sebastião Melo (PMDB),afirmou que o planejamento levou em conta a segurança dos manifestantes. Ele disse, ainda, que a prefeitura havia esgotado as tentativas de negociação com o grupo, que afirmou não querer dialogar com o poder público.

Como foi protocolada durante período de férias do Judiciário, a ação ainda não foi distribuída e, portanto, a prefeitura de Porto Alegre e o governo estadual não foram notificados de seu teor. A reportagem do Sul21 entrou em contato com a Procuradoria-Geral do Município e com o Comando de Policiamento da Capital para falar sobre o processo, mas não obteve retorno até o fechamento desta reportagem.