Justiça Federal decide pela continuidade das obras da usina de Belo Monte

Ação de autoria do Ministério Público pedia a paralisação das obras pelo fato de os órgãos competentes não terem garantindo a oitiva das comunidades indígenas que possivelmente serão afetadas pela construção da hidrelétrica

Por dois votos a um, a validade do decreto foi mantida na Justiça Federal (Foto: Divulgação/ Xingu Para Sempre)

São Paulo – Após dois adiamentos, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região julgou nesta quarta-feira (9) a ação que questionava o decreto legislativo que autorizou a construção da usina hidrelétrica de Belo Monte, no Pará. Os juízes derrubaram a ação, autorizando, portanto, a continuidade das obras da usina.

O Ministério Público Federal do Pará (MPF-PA), autor da ação, argumentava que a oitiva das comunidades indígenas – garantida pela Constituição Federal –  deveria ser feita antes da edição da autorização legislativa.

Por dois votos a um, a validade do decreto foi mantida. O julgamento estava empatado, mas o voto da desembargadora Maria do Carmo Cardoso decidiu a questão. O único voto contrário foi o da relatora do processo, desembargadora Selene Almeida, que defendia a anulação da autorização até que os índios do Xingu fossem ouvidos.

Na sessão, a desembargadora federal Maria do Carmo Cardoso apresentou seu voto sustentando a validade da autorização da obra. A magistrada alegou não entender legalmente que as oitivas das comunidades indígenas devam ser feitas antes da autorização legislativa. Para a desembargadora, é fundamental que a oitiva das comunidades seja feita não antes da autorização legislativa, mas, sim, antes da implantação do empreendimento, “o que vem sendo feito, conforme demonstram os autos”.

A magistrada também sustentou em seu voto que as comunidades indígenas, conforme esclarecem estudos técnicos do processo, não serão diretamente afetadas, pois a construção do complexo hidrelétrico será “adjacente às suas terras”. Argumento que é fortemente negado por pessoas e entidades contrárias à obra. Segundo eles, a usina será uma ameaça à diversidade ambiental da região e à população local, que se verá afetada por uma série de alterações em seus modos tradicionais de vida. ONGs alegam, inclusive, que não foram detalhados nos estudos a verdadeira dimensão e o número real de pessoas afetadas, visto que, para o consórcio que constrói a usina muitas comunidades não serão afetadas pelas obras.

A polêmica do projeto

Projeto desenvolvido inicialmente durante a ditadura (1964-85), Belo Monte foi tirado da gaveta nos anos 2000 e, desde então, esteve envolto em polêmicas. Indígenas e ribeirinhos afirmam não terem sido ouvidos na elaboração dos projetos e criticam a condução da fase de audiências públicas. A liberação da licença ambiental prévia pelo Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama) foi marcada por pressões que resultaram na queda de diretores e presidentes do instituto.

Em junho deste ano, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), organismo ligado à Organização Estados Americanos (OEA), pediu ao governo brasileiro que paralisasse as obras da usina. Os motivos da decisão da comissão relacionam-se a demandas de comunidades indígenas da região e a falta de consultas públicas com as comunidades afetadas. A comissão questionou o estudo e o relatório de impacto ambiental aprovados provisoriamente pelo Ibama para a obra.

Por outro lado, o governo brasileiro considera o projeto prioritário por permitir levar desenvolvimento à região. Embora o desenho atual não assegure todo o potencial hidrelétrico disponível, a opção foi empregada para reduzir impactos ambientais. A avaliação é de que o país não pode abrir mão de seu potencial de geração de energia elétrica a partir de uma matriz que não envolve queima de combustíveis (como termelétricas) nem produz resíduo tóxico (como as nucleares).

Há duas semanas, a falta de consulta a comunidades tradicionais foi motivo de audiência na mesma CIDH, entidade ligada à OEA. Apesar de ter convocado o governo federal a se explicar, nenhum representante compareceu, sob alegação de que medidas cautelares estariam sendo estudadas e garantidas.