Justiça mantém alteração em atestado de óbito de Herzog

Documento agora dirá que morte de jornalista decorreu de 'maus tratos' nas dependências do 2º Exército, e não mais de 'enforcamento'

O jornalista Vladmir Herzog, morto por maus tratos quando foi preso pelo Exército em São Paulo (arquivo/RBA)

São Paulo – O recurso apresentado pelo Ministério Público Estadual de São Paulo, que pedia uma mudança na proposta de alteração do atestado de óbito do jornalista Vladmir Herzog, morto em 1975 nos porões da ditadura militar, foi recusado pela Justiça.

Em agosto, a Comissão Nacional da Verdade (CNV) havia recomendado ao Juízo de Recursos Públicos de São Paulo que alterasse a versão que afirmava a causa de morte ter sido “asfixia mecânica por enforcamento” por uma que atestasse “lesões e maus tratos sofridos em dependência do 2º Exército em São Paulo (no antigo DOI-CODI)”.

Em setembro, a 2ª Vara de Registros Públicos do TJ-SP acatou o pedido da CNV por meio de requerimento feito pela viúva do jornalista, Clarice Herzog. Porém, o Ministério Público pediu que no registro de morte do jornalista constasse “morte violenta, de causa desconhecida”.

O presidente do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (Condepe), Ivan Seixas, ressalta a importância da decisão de retificação do atestado de Herzog. “A decisão de colocar a verdade na certidão de óbito é uma questão de afirmação da verdade sobre a mentira que foi o período da ditadura, período baseado em mentiras e violência.”

Para ele, entretanto, a questão do detalhamento e dos nomes utilizados no registro de morte importam pouco diante da verdade finalmente revelada. “As pessoas que morreram não cometeram suicídio, não foram vítimas de atropelamento, mas foram vítimas da tortura, assim como Vladmir Herzog, e isso tem de ser falado. O fato de reparar a verdade é o mais importante. A forma como é colocado não importa.” 

Autos de resistência

Registros de morte foram, recentemente, motivo de discordância entre a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo (SSP-SP) e o Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República (CDDPH-SDH).

Foi aprovada na segunda-feira (11), pela CDDPH, resolução que recomenda o fim do uso dos termos “autos de resistência” e “resistência seguida de morte” nos registros policiais, boletins de ocorrência, inquéritos policiais e notícias de crime. 

Porém, na terça-feira (12), o secretário de Segurança Pública de São Paulo, Fernando Grella, afirmou que São Paulo irá manter estes registros, já que a maneira como aparecem no boletim de ocorrência é mera “variação estatística”. 

A questão da mudança nos registros de morte foi colocada como não-prioritária por Grella. “Essa questão de dados estatísticos, os dados são divulgados amplamente, com um rótulo ou com outro. Tudo pode ser pensado, reavaliado, mas não é primordial, não é prioritário”, disse.

Seixas ressalta, mais uma vez, a verdade por trás dos fatos, independentemente das nomenclaturas usadas. “A definição de como isso é colocado é irrelevante. O fato é que as resistência seguidas de morte são farsas montadas para dar a ideia de que a pessoa provocou a própria morte ao resistir à prisão, o que é um absurdo, não faz o menor sentido isso. Se isso for usado para cobrir um assassinato, é um absurdo.”

 

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