Rio+20: quem comeu aquele restinho de sustentabilidade que estava aqui?

Há algo de insustentável na organização da Conferência das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável

Segurança foi reforçada no Riocentro e vias de acesso estão restritas devido a manifestações populares e à segurança dos chefes de Estado (Foto: Marcello Casal Jr/ABr)

São Paulo – A chegada de 130 chefes de Estado ao Rio de Janeiro levou embora o pouco de sustentabilidade que restava na Conferência das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável. Filas antes métricas se tornaram quilométricas, a internet lenta transformou-se em miragem, e matar a fome virou meta para o próximo milênio.

Desde as primeiras horas da manhã o trânsito provocado pela Rio+20 foi visivelmente agravado pelos bloqueios provocados pela chegada de delegações oficiais, em especial nas imediações do Riocentro, na Barra da Tijuca, onde se concentram os debates organizados pelos 191 países-membros da conferência.

A isso se somou o número insuficiente de ônibus gratuitos que conectam os pontos centrais da cidade ao local de encontro. Em alguns lugares foi preciso esperar até uma hora por um veículo com assentos em número suficiente para a fila, e só então teve início o longo trajeto até o Riocentro. “Se tiver horário pra estar lá no Riocentro, chega antes das nove”, gritava uma voluntária. “Não está pagando, vai reclamar do quê? É tudo gratuito”, arrematava a quem tentava se queixar da desorganização, que teve efeito positivo à autoestima nacional: a prática de furar fila não é um esporte genuinamente brasileiro, e tornou-se corriqueira nesta Torre de Babel.

Na área de imprensa, as centenas de estações de trabalho colocadas à disposição tampouco são suficientes a esta altura, e é preciso inventar um espaço no chão para redigir um texto como este, ou entrar discretamente em uma sala na qual ocorre uma conferência. A privatização de espaços públicos é outro esporte que se mostrou internacional, este desde o começo do encontro, com papéis que servem como cercas virtuais para dizer a qual veículo de comunicação “pertence” cada mesa.

A internet disponível para o trabalho dos jornalistas, que na terça-feira era lenta, hoje se transformou em uma banda larga estreita demais para tanta gente: além da tradicional morosidade, as quedas de conexão se tornaram frequentes, dificultando o envio de material dos mais comuns – e o Plano Nacional de Banda Larga?

A praça de alimentação montada para receber as delegações trabalha a todo vapor na vã tentativa de dar conta de tantas bocas. Sorte dos donos dos negócios, que cobram R$ 5 por uma água, R$ 15 por uma salada pequena e de R$ 35 a R$ 75 por um bufê de comida – como se vê, há mundos que são mais sustentáveis para alguns do que para outros. Na ânsia de preparar tantos alimentos, as cozinhas somaram ao Pavilhão 2 uma fumaça que ajuda a perfumar o ambiente – ao menos o cheiro que impregna na roupa há de ser um direito universal.

Momentos românticos para um mundo que caminha para um novo modelo de desenvolvimento: teremos novas filas, novas maneiras de burlar regras e novos métodos de negócios que pratiquem preços abusivos.  

 

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