Propostas de governo: Haddad ousa com nova fronteira de desenvolvimento em SP

Mapa do arco de desenvolvimento proposto pelo candidato do PT (Reprodução) Na semana passada, o candidato a prefeito de São Paulo Fernando Haddad, do PT, apresentou seu plano de governo. […]

Mapa do arco de desenvolvimento proposto pelo candidato do PT (Reprodução)

Na semana passada, o candidato a prefeito de São Paulo Fernando Haddad, do PT, apresentou seu plano de governo. Foi o primeiro dos postulantes à prefeitura a fazê-lo. Analisarei sua proposta neste post e farei o mesmo com os planos apresentados pelos outros candidatos. Até agora, apenas mais um candidato apresentou um plano, Paulinho da Força, do PDT, lançado hoje (23).

É bom esclarecer que todos os candidatos são obrigados a apresentar um plano de governo na ocasião de sua candidatura. Essas documentos estão disponíveis nos Tribunais Regionais Eleitorais (TREs), mas poucos candidatos, se algum, levam esse plano a sério. Por isso, não os levarei em consideração, pelo menos enquanto houver a possibilidade de que os candidatos apresentem um documento mais consistente. 

Outros centros

O plano de Haddad é dividido em diversas áreas, como desenvolvimento urbano, política habitacional e fundiária, mobilidade e transporte, saúde, educação, cultura, entre outros. Aqui, mostrarei as propostas que se relacionam com o planejamento urbano. Só a presença de um tópico sobre urbanismo já é uma noticia alvissareira, coisa pouco comum no debate eleitoral. Desenvolvida pelo professor de urbanismo na FAU-USP, ex-vereador, candidato a vereador e responsável pela concepção do Plano Diretor da cidade de São Paulo Nabil Bonduki, esse tópico tem importância fundamental no conjunto da proposta do candidato do PT.

O que Haddad apresenta não é novo no campo dos estudos urbanos. Com base no diagnóstico de que os empregos e equipamentos públicos na cidade concentram-se nas regiões Centro e Sudoeste, enquanto os moradores estão nas periferias Sul, Leste e Norte, o plano propõe uma área nova de desenvolvimento urbano, no entorno do atual centro expandido. A ideia é mudar a lógica do excessivo centralismo que norteou o desenvolvimento da cidade ao longo de sua história e criar novas áreas de emprego e urbanidade mais perto de onde a moradia popular está concentrada. Com isso, diminuiria a necessidade de deslocamento diário para uma boa parte da população.

A área prevista para fazer parte dessa nova fronteira de investimentos – batizada pela campanha da Arco do Futuro – começa na avenida Cupecê, segue até a marginal Pinheiros, Marginal Tietê e chega à avenida Jacú-Pêssego. Na defesa desse formato, o plano afirma que essa linha é composta por avenidas largas e é pouco adensada, o que permitiria intervenções da prefeitura sem que houvesse conflitos. Para atrair empregos e construções para a área, a ideia é oferecer incentivos para o mercado imobiliário e para empresas, especialmente aquelas que empregam grande quantidade de pessoas. Além disso, a linha concentraria novos equipamentos públicos.

A proposta é mais complexa que isso; os detalhes podem ser conhecidos aqui. Mas, em linhas gerais, a proposta é ousada. Desconheço outro plano, em qualquer época, que defenda uma intervenção pública tão profunda na cidade. Os conceitos usados para elaborar essa proposta, de cidades compactas e sustentáveis, é moderno: está alinhado com o que vem sendo aplicado em várias cidades pelo mundo. Como urbanista, é um alívio saber que alguém vem estudando novas maneiras de fazer as cidades serem ambientes melhores para seus moradores.

Há, evidentemente, questões a serem debatidas. Um plano de ação tão diferente do que estamos acostumados pode não ser bem recebido. Fomos por muito tempo doutrinados a achar que o Estado não deve intervir fortemente nas atividades privadas, sob risco de inibir o desenvolvimento econômico. Balela, claro. Mesmo nos EUA, provavelmente o país mais liberal do mundo, o estado atua para garantir regulações mínimas nas cidades. Até na Inglaterra de Margareth Tatcher isso ocorria. Mesmo assim, prevejo críticas a esse respeito. Elas não encontram base nas teorias, mas acontecerão mesmo assim.

O que pode ser questionado de fato é a viabilidade econômica para uma mudança tão grande. O mundo encontra-se em recessão, e se a crise não é tão forte no Brasil, tampouco estamos totalmente blindados aos seus efeitos. A criação de novos empregos nas áreas menos centrais depende de crescimento econômico, o que nunca pode ser garantido. Se a economia vai mal, mesmo os incentivos fiscais serão pouco para que empresas que atualmente estão no centro se realoquem. 

De qualquer forma, um plano tão bem estruturado e interessante tem, no mínimo, a capacidade de fomentar um debate eleitoral mais sofisticado. Os candidatos costumam propor mais ou menos as mesmas coisas sempre: construir corredores de ônibus, abrir novas avenidas, construir moradia no centro, cuidar das áreas de mananciais. Mas, isoladas umas das outras, iniciativas que poderiam ser positivas acabam perdidas. Espero sinceramente que as propostas dos outros candidatos acompanhem a qualidade do que esse plano oferece.