Poder econômico

Empresas mudam Operação Água Branca: sem novidades

Depois de anos de discussões com a sociedade civil, texto foi alterado pela gestão Haddad para beneficiar o mercado imobiliário. Os mecanismos que levaram a isso não são nunca revelados

Joel Silva/Folhapress

Entre as alterações que beneficiam construtoras está a elevação do tamanho dos prédios, de 42 para 80 metros

A Operação Urbana Água Branca foi objeto de disputa intensa entre o Legislativo e o Executivo da cidade de São Paulo nas últimas semanas. Seu texto passou por um longo processo de reformulação para introduzir regulações ausentes na versão original, redigida em 1995 durante a administração de Paulo Maluf. O projeto passou três anos em análise pela sociedade civil, com a realização de audiências públicas e discussões no Conselho Municipal do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, como explica em artigo o vereador e urbanista Nabil Bonduki.

O texto resultante dessa discussão foi enviado para o Executivo. O prefeito Fernando Haddad (PT) e sua equipe inseriram importantes mudanças, quase sempre de maneira a beneficiar investidores: aumento do número de subsolos permitidos de um para dois; permissão para três vagas de garagem por unidade habitacional, em vez de duas; elevação da altura máxima dos prédios de 42 metros para 80 metros e diminuição de 25% para 20% dos recursos da operação em habitação social.

O projeto voltou para a Câmara Municipal para votação. Uma negociação entre governo e vereadores fixou em 22% dos recursos para investimento em habitação social. As demais alterações propostas pela prefeitura foram para o texto final.

O resultado de todo esse processo foi um texto muito melhor do que o anterior, que permitia que os prédios fossem construídos da maneira que o mercado achasse melhor. Agora haverá regras para que o bairro não se torne um mar de torres residenciais altíssimas, além da construção de 5 mil unidades de habitação para população de baixa renda, construção de escolas e postos de saúde, instalação de áreas públicas e outros pontos importantes.

Mas, apesar de conter avanços, o texto da operação poderia ter sido melhor. Qual o motivo para a intervenção da prefeitura num projeto que estava sendo debatido democraticamente havia tanto tempo? Isso foi, com razão, interpretado por quem participou do processo como uma traição ao processo democrático.

As razões e os mecanismos exatos que fizeram com que interesses de mercado conseguissem se infiltrar na agenda pública não são nunca revelados. No entanto, é sempre importante lembrar a razão estrutural para isso: a proximidade imoral – embora legal – entre partidos e empresas durante as campanhas eleitorais. As imensas doações que empresas de construção civil e do setor imobiliário fazem para os candidatos sempre cobra um preço durante as administrações, seja qual for a matiz ideológica do governo em questão.

Se é possível dizer que essa interferência parece menor agora, na administração Haddad, do que na gestão Kassab, também é válido lembrar que o último nunca prometeu mundos e fundos sobre participação popular. A decepção é maior quando as expectativas são altas.

Mas no cenário atual do financiamento de campanhas no país, ninguém sai ileso. Se a sociedade quiser ter a palavra final nas decisões públicas, as empresas não podem ter o poder de financiar os seus candidatos prediletos. Enquanto isso não mudar, a participação popular será só um acessório.