No duelo entre Tigre e Timão, deu Lula

Ex-presidente volta ao estádio onde se projetou, ganha homenagem e sai satisfeito com o empate

Ex-presidente Lula, ao lado da mulher, Marisa Letícia, e do prefeito de São Bernardo, Luiz Marinho (Foto: Cláudia Motta)

São Bernardo do Campo – Quando Júnior Xuxa, o camisa 10 do São Bernardo, deu um drible de corpo, ficou sozinho diante do goleiro Júlio César e tocou com tranquilidade a bola para o canto esquerdo, aos 15 minutos do primeiro tempo, Luiz Inácio levantou, deu um sorriso tímido e aplaudiu. Nem parecia que era o seu time do coração, o Corinthians, que havia levado o gol. Mas do outro lado jogava o time da cidade onde ele mora e que o projetou para a política, e exatamente no estádio palco de memoráveis assembleias que ele, como líder metalúrgico, liderou no final dos anos 70. Por isso, o placar final de 2 a 2 atendeu ao desejo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que foi homenageado no estádio 1º de Maio, antes conhecido como Vila Euclides. E assistiu ao jogo, pelo campeonato paulista, com uma camisa metade São Bernardo (o Tigre, também chamado de Bernô), metade Corinthians (o Timão). Com o número 13 às costas. 

“Hoje (ontem) estou torcendo para que haja um empate para que meu coração não perca”, declarou Lula antes da partida, ainda nas sociais do estádio, cuja capacidade foi ampliada de 13 mil para 15.800 espectadores, em reformas que incluíram refletores, entre outras melhorias, e custaram R$ 11 milhões. E a casa estava cheia, com 15.159 pagantes.

Muitos mal viram a partida, porque ficavam de costas para o campo e de olho no camarote onde estava o ex-presidente, ao lado de sua mulher, Marisa Letícia, do prefeito Luiz Marinho, do senador Eduardo Suplicy, e dos presidentes do São Bernardo, Luiz Fernando Teixeira, e do Corinthians, Andrés Sanchez, entre vários outros convidados. Também estavam lá a mulher de Marinho, Nilza, que é secretária municipal de Orçamento, e o vice-prefeito, o cantor Frank Aguiar – que deve lançar CD após o Carnaval.

Com Sanchez, Lula liberou o torcedor corneteiro e disse esperar que, na próxima quarta-feira, o time “não repita o fiasco” diante do Tolima, da Colômbia, pela Libertadores. Na última quarta-feira (26), o Corinthians só empatou no Pacaembu (0 a 0), pondo em risco a classificação. Já Marinho, que é santista, perguntou o resultado do jogo (2 a 0 contra o São Paulo) e, satisfeito, informou ao senador Suplicy, que torce para o mesmo time.

Antes de a bola rolar – cogitou-se que Lula daria o pontapé inicial, o que não aconteceu –, o ex-presidente recebeu uma placa do prefeito, por ser “referência na luta pela liberdade e pela democracia” e também o cartão de sócio-torcedor número 1 do São Bernardo. As lembranças, inevitavelmente, eram das assembleias que reuniram dezenas de milhares de trabalhadores. “Foi diferente entrar aqui”, disse Lula. “O palanque era ali, perto da trave. A primeira assembleia foi em cima de uma mesinha, sem microfone. O pessoal ia repetindo de ouvido em ouvido”, lembrou o também ex-presidente do então Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo e Diadema.

Não faltaram testemunhas daquelas manifestações. Entre elas, estava o ex-metalúrgico Juno Rodrigues Silva, conhecido como Gijo, hoje dono de restaurante e famoso por ser o fornecedor oficial de chuletas na residência de Lula. “Nunca mais vim aqui”, comentou Gijo, que retornava ao estádio após mais de 30 anos. Também estava lá o economista Luiz Carlos Berbel, na época estudante da USP. “A gente vinha apoiar a greve e fazia arrecadação”, recordou. Ele ressaltou a diferença entre o Brasil de hoje e o daquele tempo. “O país hoje tem uma democracia consolidada. É bom voltar aqui e se divertir. São Bernardo gosta de futebol, não só de política.”

E o jogo? Danilo, do Corinthians, empatou ainda no primeiro tempo, para alegria de Lula, que foi à janela do camarote para aplaudir. Aos 28 do segundo tempo, Cauê aproveitou o rebote do goleiro e chutou forte para fazer 2 a 1 para o São Bernardo. O prefeito Luiz Marinho vibrou e puxou o braço de Lula, que sorria. O serviço de som do estádio, que comunicava uma subsituição no Tigrão, mudou o roteiro rapidamente: “A Secretaria Municipal de Esportes informa: gol do São Bernardo!”.

Sete minutos depois, o estreante Ramírez, peruano, fez o gol mais bonito da partida e empatou novamente. Marinho brincava fingindo tapar a boca da ex-primeira-dama, que comemorava o gol de empate – exatamente como queria Lula.

Como o camarote ficava pouco acima das sociais, o público cansou de tirar fotos e chamar o ex-presidente, que enfrentou uma mini-entrevista.

“Não deu pra trazer a Dilma?”, perguntava um. “Na outra ela vem”, respondia Lula.

“Vai para a Colômbia quarta-feira (para ver o jogo)?”, perguntou outro. E Lula respondeu acenando negativamente com a cabeça.

“Precisa vestir a camisa do Palmeiras”, provocou uma torcedora. O ex-presidente cobriu o rosto com as mãos e riu.

Lula deixou o estádio rapidamente, sem dar entrevistas. Antes do jogo, deu a entender que voltará a ser um fiel torcedor. “Fiquei muito tempo sem ir a um estádio, mas hoje me sinto livre para fazer o que quiser. Posso fazer o que eu quiser da minha vida.”