Crise hídrica

Volume de água das represas da região metropolitana de São Paulo é inferior aos níveis de 2013

No período de pior seca, em junho de 2013, reservatórios acumulavam 64,8%. Hoje, volume armazenado é de 53,8%. Geógrafo da USP se diz “assustado” com a falta de ações do governo Doria

Arquivo EBC
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Professor diz ainda que contratos de demanda firme "são absolutamente inadequados para a situação de crise hídrica sistêmica de água em São Paulo"

São Paulo – O volume total de água armazenada nas represas que abastecem a região metropolitana de São Paulo está pior do que os níveis registrados em junho de 2013, período que antecedeu a maior crise hídrica do estado entre 2014 e 2015. De acordo com dados dos mananciais da Sabesp, na então pior seca, o volume acumulado alcançava 64,8%. E hoje corresponde a apenas 53,8%, o equivalente a 1.046,60 hectômetros cúbicos. 

O sistema em nível mais preocupante é o Cantareira, o maior e que atende 8,1 milhões de pessoas nas zonas norte, central e cidades ao norte da capital paulista. O reservatório concentra 46,2% do volume de água, 20% a menos do que o armazenado há oito anos. 

Oscilações na temperatura dos oceanos, a formação de sistemas que acabam impedindo a formação de nuvens e a distribuição de chuvas, o aumento do desmatamento, sobretudo na região da Amazônia, que quebra o ciclo de levar as chuvas intensas criadas na região ao Sul e Sudeste, são alguns dos fatores que explicam essa situação alarmante de desabastecimento das represas de São Paulo, de acordo com o professor do Departamento de Geografia e do Programa de Pós-Gradução em Ciência Ambiental da Universidade de São Paulo (USP) Wagner Ribeiro. 

Empresas consomem mais

Em alguns represas da Grande São Paulo tem chovido 10% a menos do que era esperado para este mês. O que é muito preocupante, conforme adverte o geógrafo em sua coluna na Rádio Brasil Atual nesta quarta-feira (16). Ribeiro lembra que, desde a então maior seca, São Paulo passou a contar com mais um reservatório, o Sistema São Lourenço. Mesmo assim, a escassez é iminente. A avaliação é que a região sofre de uma crise sistêmica. A cada 10 anos o período de seca aguda é previsto. Porém, por conta das ações de avanço sobre a natureza, é provável que esse ciclo tenha sido encurtado, afirma.  

Além disso, o professor da USP também contesta que até hoje a Sabesp não tenha revisto os chamados contratos de demanda firme. Estabelecidos com empresas, esse tipo de expediente concede aos “grandes usuários” descontos vantajosos. Diferentemente do que ocorre com consumidores residenciais, para as companhias, principalmente de setores industriais e produtivos, quanto maior o uso de água, menos é cobrado pelo metro cúbico (mil litros). Isso significa que as empresas não são estimuladas a baixar o consumo de água. 

“É preciso rever esse tipo de política. Esses contratos são absolutamente inadequados para a situação de crise hídrica sistêmica de água em São Paulo. Nosso volume disponível, na maior parte do tempo, é inferior à nossa demanda. Precisamos também remanejar algumas atividades produtivas para outras áreas”, aponta Ribeiro. 

Indiferença do Estado?

O geógrafo se diz, contudo, “assustado” pela falta de um debate público como como enfrentar essa situação adversa. Segundo ele, “estamos mais uma vez a mercê da chuva, da precipitação”, que precisa ocorrer entre janeiro e fevereiro do próximo ano para que a crise hídrica não se confirme. Mas na verdade, explica, “era necessário que tivéssemos ações do governo estadual, especialmente para que possamos informar a população do cenário que estamos enfrentando e, a partir daí, começarmos a pensar em ações que deem mais qualidade para o uso da água”, analisa. 

Pela lei, em caso de escassez hídrica, o consumo humano e o uso animal devem ser priorizados, inclusive em detrimento da atividade produtiva. Isso explica a omissão do governo João Doria (PSDB) em lidar com a crise que avança. “Tem uma questão política, sabemos que ações que levem a um controle, ao racionamento de água, são sempre impopulares, mas são necessárias. E o segundo aspecto é que fundamentalmente o grande consumo de água não está nas residências, entre os indivíduos e suas habitações, ele está nos chamados grandes usuários de água. É preciso enfrentar esses segmentos”, conclui. 

Confira a coluna 

Redação: Clara Assunção – Edição: Helder Lima