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Investimento, manutenção e possíveis demissões estão na pauta da CPI da Sabesp

Presidente da empresa, Jerson Kelman, e o diretor metropolitano Paulo Massato serão convidados a depor na comissão instalada na Câmara Municipal de São Paulo

Luiz França/CMSP

Primeira reunião da CPI da Sabesp na Câmara retomou debate sobre o direcionamento dos investimentos

São Paulo – A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que analisa a prestação de serviços da Companhia de Saneamento Básico de São Paulo (Sabesp) para a população da capital paulista decidiu hoje (11) convidar o presidente da companhia, Jerson Kelman, e o diretor metropolitano Paulo Massato para prestar esclarecimentos sobre a falta de manutenção das redes de água na cidade. Segundo o presidente do Sindicato dos Trabalhadores em Água, Esgoto e Meio Ambiente (Sintaema), Renê Vicente dos Santos, a Sabesp tem direcionado os recursos para ligações de água e deixado de lado a preservação dos mananciais e a manutenção das tubulações.

Segundo o presidente da comissão, vereador Laércio Benko (PHS), Kelman e Massato serão consultados antes de ser definida a data. Porém, se houver negativa ao convite ou não comparecimento, eles serão convocados. Nesse caso, o funcionamento é semelhante ao de uma intimação, obrigando os diretores a participar da oitiva. “Até agora não tivemos problemas com convites ou pedidos de informação. Esperamos que eles nos atendam o mais breve possível”, disse Benko.

Paulo Massato esteve na Câmara Municipal de São Paulo em 28 de maio de 2014, durante uma audiência pública. À época, disse que não sabia em que condições o Sistema Cantareira, que abastece 6,6 milhões de pessoas na região metropolitana de São Paulo e hoje está com 6,4% da capacidade, estaria dali a cinco meses. Ele também afirmou que a companhia iria distribuir água de canequinha se o Cantareira secasse. O diretor chegou a sugerir que os paulistanos se mudassem para o interior ou para a Baixada Santista.

“A Sabesp está atuando na lógica da Bolsa de Valores, ofertando lucros cada vez maiores aos acionistas. Eles dizem que 84% dos lucros foram reinvestidos. Mas de forma que isso está sendo feito?”, questionou o presidente do Sintaema. Segundo Santos, a companhia investe mais recursos na ampliação da rede de água para atender à população, na colocação de hidrômetros e no afastamento de esgoto. O que está diretamente relacionado aos ganhos da empresa, já que a companhia vai aplicar as contas desses serviços.

“Mas não investe em preservação dos mananciais, contenção de vazamentos, fiscalização, em novas fontes de água. A Sabesp tem condições de se planejar, é uma gigante do saneamento, não podia ser pega de surpresa por uma crise assim”, completou o presidente.

Os problemas de vazamento na rede foram confirmados pelo fiscal de concessionárias da subprefeitura de Santana, Bernard Anton Fuldauer, que apresentou dados da região. “Na Rua Voluntários da Pátria – Santana, zona norte – temos, em média, dez vazamentos por mês. Ficou pior depois da redução de pressão, porque a rede ali tem cerca de 40 anos”, afirmou.

Segundo Fuldauer, os prejuízos com perda de água seriam da ordem de R$ 12 bilhões por ano. Porém, o custo para trocar a rede de água da rua Doutor Zuquim, que tem cerca de dois quilômetros, seria de R$ 4 milhões. “Então, eles preferem manter a indústria do conserto. Mas se ganharia maior disponibilidade de água em menor tempo combatendo os piores vazamentos, do que com as obras que estão sendo propostas”, defendeu.

Outro problema de a Sabesp investir somente em fornecimento de água e afastamento do esgoto, dois itens cobrados regularmente da população, é que o esgoto afastado acaba, em grande parte das vezes, em córregos, riachos, e outros cursos de água que alimentam as represas da região. Levando à contradição da companhia de saneamento ajudar a poluir as represas de onde retira água para tratar e fornecer à população.

“Temos relatos constantes de descarte de esgoto pela Sabesp nos córregos, que vão para as represas. A Sabesp faz a coleta nos bairros, mas não tem um tronco para levar isso até uma estação de tratamento. É preciso identificar esses locais e ver as providências que devem ser tomadas”, afirmou o diretor da Divisão Técnica de Unidades de Conservação da Secretaria Municipal do Verde e Meio Ambiente, Leandro de Oliveira Caetano.

O artigo 208 da Constituição Estadual de São Paulo trata do lançamento de esgoto em córregos ou rios: “Fica vedado o lançamento de efluentes e esgotos urbanos e industriais, sem o devido tratamento, em qualquer corpo de água”, diz o documento. Já o artigo 33 da Lei Federal 9.605, que dispõe sobre ações lesivas ao meio ambiente, considera crime “provocar, pela emissão de efluentes ou carreamento de materiais, o perecimento de espécimes da fauna aquática existentes em rios, lagos, açudes, lagoas, baías ou águas jurisdicionais brasileiras”.

O presidente da CPI disse que todas essas informações vão constar do relatório final da comissão que será encaminhado aos órgãos competentes, entre eles o Ministério Público. Segundo Benko, a CPI ainda vai ouvir a população em audiências públicas, nas 32 subprefeituras, buscando contribuições para o relatório final da comissão, que será encerra dia 28 de maio.

Demissões

Segundo o presidente do Sintaema, já corre informação entre os funcionários que a Sabesp pode demitir até mil funcionários ainda neste semestre. “Já tem várias homologações agendadas. A empresa não oferece dados oficiais, mas há fortes rumores sobre essas demissões, inclusive com levantamentos dos trabalhadores aposentados que seguem trabalhando, os que atuam em manobras, manutenção, operadores de estações de tratamento”, disse Santos.

Na semana passada, o secretário estadual de Saneamento e Recursos Hídricos, Benedito Braga, disse que a Sabesp enfrenta dificuldades financeiras, por conta de ter concedido descontos na conta de água para quem economizasse (bônus), ao mesmo tempo em que reduziu o fornecimento em 22%. “Nós não tínhamos expectativa de um período tão longo de estiagem, e esse bônus foi complicando sobremaneira a questão financeira. Então nós vamos ter de fazer uma revisão disso”, disse Braga, em seminário promovido pela Federação do Comércio de São Paulo, no dia 6.

“Quem está segurando essa crise são só trabalhadores, nas manobras. O governo vem dizendo que está fazendo a redução de pressão, como se fosse algo automático. Quem está agindo são os trabalhadores, fechando registros à noite e abrindo pela manhã. Isso tem de ser feito, não tem outro jeito, tem de economizar água”, ressaltou Santos. A Sabesp tem 14.700 funcionários, para atender a cerca de 26 milhões de pessoas em 360 municípios no estado paulista.

Outro problema pode estar afetando a saúde financeira da empresa. Com ações no mercado desde 2003, a companhia passa pela primeira desvalorização de sua história. Os papéis cotados na Bolsa de Valores de Nova York apresentam acentuada queda de valor, no último ano. Em fevereiro de 2014, as ações chegaram a US$ 10,99, mas hoje (11) estão cotadas a US$ 5, menos da metade do valor anterior.

Já na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa), as ações registram uma queda maior, embora o valor nominal seja mais alto do que o registrado em Nova York. Em 18 de junho do ano passado, as ações da Sabesp chegaram a R$ 24,35. Em janeiro chegaram a R$ 13,25 e hoje estão cotadas a R$ 14,25, apresentando leve melhora.

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