crise d'água

Para ex-funcionário da Sabesp, empresa não investiu em medidas para evitar crise

Além de criar um sistema para captação de água dos rios que compõem o Vale do Ribeira, químico avalia que a estatal paulista poderia ter investido na despoluição dos rios Pinheiros e Tietê

Luis Moura/Folhapress

Desde 2004 relatório indicava que a Sabesp não deveria depender tanto do Cantareira

São Paulo – Para Eduardo de Campos Siqueira, químico e ex-funcionário da Sabesp, não houve investimentos da empresa nas principais medidas que poderiam evitar a pior crise de água que vive o estado de São Paulo. “Tudo indicava que a bacia do Vale do Ribeira seria a única disponível para repor e abastecer a Grande São Paulo, mas esses estudos não foram desenvolvidos”, afirma, hoje (6), em entrevista à Rádio Brasil Atual.

O químico trabalhou na Sabesp até 2008 e lembra que, já em 2004, a portaria que renovou a outorga da concessão administrativa do Cantareira indicava que a companhia não deveria depender tanto do fornecimento da água do sistema. “Se essas medidas tivessem sido sistematicamente encaminhadas, nós hoje teríamos uma situação, do ponto de vista do abastecimento, equilibrada”, considera.

Siqueira avalia que a bacia do Vale do Ribeira banha uma região menos desenvolvida do estado, onde há um grande volume de água, ou seja, a retirada não causaria um impacto socioeconômico tão grande quanto causa a importação da água do Cantareira. No entanto, o especialista afirma, que nesse período, em vez de investir em obras na bacia, a empresa criou sistemas para “tapar os buracos da falta d’água”, como é o caso do São Lourenço, em Ibiúna.

Atualmente a região metropolitana de São Paulo utiliza entre 65 e 15 mil litros por segundo. O São Lourenço está no início da sua construção e terá uma capacidade de vazão de água de apenas 4 mil litros por segundo. Além de criar um sistema para captação de água dos rios que compõem o Vale do Ribeira, Siqueira indica que a Sabesp poderia ter investido na despoluição da bacia do Tietê Billings.

“Paralelamente à importação de água, deveria ter acontecido uma aceleração do processo de despoluição dos rios Pinheiros e Tietê, da bacia do Alto Tietê, onde existe um grande volume que não pode ser aproveitado devido à poluição”, diz o ex-funcionário da Sabesp. A empresa alega que a medida é inviável a curto e médio prazo e não realiza investimentos nesse sentido.

Na avaliação de Siqueira, o que impediu a Sabesp de desenvolver as medidas foi transformar a questão do saneamento em um negócio em que se obtém primordialmente o lucro. “Tem ações na bolsa de Nova York e se orgulha disso, ao invés de fazer os investimentos necessários esses anos todos, ela tem ou pago o dividendo aos acionistas, ou encaminhado dinheiro para o tesouro estadual”, critica.

Agricultores

A produção de agricultores na região do Alto Tietê está sendo prejudicada pela crise da água. A região, conhecida como cinturão verde, é responsável por 13,17% da produção agrícola do estado de São Paulo e é a maior produtora de folhas e verduras do país. Dos cerca de 5.000 produtores, 75% são enquadrados como pequenos produtores.

De acordo com Renato Abdo, engenheiro agrônomo do Sindicato Rural de Mogi das Cruzes, muitos produtores já estão fazendo a redução da área de cultivo para manter a capacidade de irrigação. “Se chove eu não preciso irrigar, eu não capto água, quando não chove eu preciso irrigar aquela cultura com água do manancial”, explica em entrevista à Rádio Brasil Atual.

O sindicalista aponta que quando é necessário irrigar há uma perda na qualidade de produção do alimento e uma redução da área de plantio, o que resulta em um risco de faturamento da produção das famílias agricultoras.

O agricultor Brás Gama da Silva Filho vive em Mogi das Cruzes e relata que no último mês produziu apenas 40% da capacidade de plantio de sua terra. “Falta água e a agente leva prejuízo na plantação, compra semente cara que é perdida. Eu planto coentro, alface, cebolinha, couve, beterraba, acelga, de tudo eu planto. Agora estou plantando só couve”, diz.

Ouça a entrevista realizada pela Rádio Brasil Atual:

Ouça a reportagem realizada pela Rádio Brasil Atual: