Descaso

MPF e Defensoria pedem condenação da União por desmonte da Funai

Ação inclui indenização à Funai para a retomada das políticas públicas voltadas às populações indígenas e ribeirinhas do Vale do Javari, por omissão do governo Bolsonaro

PF / Amazônia Real / Fotos Públicas
PF / Amazônia Real / Fotos Públicas
Órgãos pedem à Justiça Federal uma indenização de R$ 58 milhões por danos morais coletivos

São Paulo – Em reação das instituições ao desmonte das estruturas governamentais de proteção ao meio-ambiente e aos indígenas pelo governo Bolsonaro, Ministério Público Federal (MPF) e Defensoria Pública da União (DPU) protocolaram ontem (3) petição contra a União pelo desmonte da Fundação Nacional do Índio (Funai). Também é citada na denúncia a omissão da proteção aos povos do Vale do Javari, no Amazonas. A ausência do Estado na defesa das populações indígenas e ribeirinhas da região culminaram no assassinato do indigenista Bruno Pereira e do jornalista britânico Dom Phillips.

Os órgãos pedem à Justiça Federal indenização de R$ 58 milhões por danos morais coletivos, a serem revertidos para a retomada das políticas públicas voltadas àquelas populações – com destaque aos povos indígenas isolados e de recente contato –, por meio de repasse direto à Funai. A ação pede ainda que a própria Funai elabore um plano de ações e um cronograma para a aplicação dos recursos, a fim de garantir o destino correto e no tempo certo. A peça foi assinada pelos defensores públicos federais Renan Vinicius Sotto Mayor e Francisco de Assis Nascimento Nóbrega e também pelo procurador da República Fernando Merloto Soave.

Eles citam o caso dos assassinatos recentes de ativistas ambientais e afirmam que o governo tinha ciência da ausência de políticas públicas de enfrentamento ao crime na região. “Todos os problemas estavam narrados e documentados na inicial e nos elementos que a acompanhavam. Todos os riscos oriundos do enfraquecimento das bases já eram de conhecimento da União e da Funai. Infelizmente, nada foi feito”, afirmam os autores na peça.

Além da morte de Bruno Pereira e Dom Phillips em missão de trabalho em defesa da floresta, as entidades incluem o homicídio de Maxciel Pereira dos Santos, servidor da Funai, em 2019.

Omissão

De acordo com os autores, desde que a denúncia foi ajuizada, governo e Funai nada fizeram sobre o caso. Sequer apresentaram argumentos condizentes para contrapor os fatos apresentados. “Foi a falência desse modelo, desenhado pela própria política indigenista do Estado, que resultou na falta de proteção territorial e na insegurança dos povos indígenas que habitam tais locais”, afirmam.

“No Vale do Javari, resultou na morte daqueles que, na omissão dos réus, agiram; que, na omissão dos réus, colocaram seus atos, sua segurança e sua vida em prol da proteção territorial daquela terra indígena; que, na omissão dos réus, sucumbiram. Na ausência do Estado brasileiro, eles estavam lá. Bruno Pereira e Dom Phillips, presentes (…) O indigenista e o jornalista referidos são a face mais recente e trágica do cenário esmiuçado na inicial da presente demanda. Eles deram a vida para registrar e enfrentar as ameaças que os territórios indígenas e seus povos sofriam. Lutaram por essa causa e por ela morreram”, completam os defensores e o promotor.

Petição e manifestação

A petição argumenta que a União e a Funai não informaram sobre cumprimento de decisão judicial proferida no dia 14 de junho, que versava sobre a proteção dos servidores e comunidades indígenas do Vale do Javari. Diante da omissão, a DPU também protocolou, nesta segunda (4), uma manifestação endereçada à Justiça Federal para que a Funai seja intimada e se manifeste, sob pena de “multa pessoal ao presidente da autarquia”.

“Observa-se que mesmo após a tragédia do assassinato de Bruno Pereira e Dom Phillips, quando todo o mundo verificou a situação de omissão estrutural do Estado brasileiro na região, mesmo após uma decisão judicial determinando que a Funai tomasse medidas para garantir a integridade física dos seus servidores e dos povos indígenas do Vale do Javari, ao que parece, não houve qualquer medida nesse sentido”.